Tudo ao molho e FÉ em Deus - Um Cavani à solta
O futebol tem destas coisas. Durante a semana, todos os especialistas advertiam para o perigo das bolas paradas uruguaias, mas acabámos por ser nós a marcar, após um canto marcado à maneira curta. Os mesmos teóricos perspectivavam um duelo entre os dois poderosos avançados sul americanos e os nossos centrais Pepe e Fonte. Acontece que Cavani foi decisivo, mas apenas quando entrou alternadamente nos espaços ocupados por Raphael e Ricardo, dois laterais.
Na primeira parte, a Portugal, o que faltou em profundidade sobrou em lateralização. Assim, sem comprimento e só com largura, aos lusos faltou área, mais concretamente, grande área. Tal como uma equipa de rugby, os portugueses chegavam às imediações do último reduto uruguaio mas depois passavam a bola, uns aos outros, sempre para trás. Dispostos num 4-4-2 com os avançados muito abertos, os nossos só faziam cócegas à defesa adversária. Guedes foi igual a si próprio - uma nulidade neste Mundial -, João Mário mostrou a incapacidade habitual de queimar linhas e jogar para a frente e Bernardo, na primeira parte colocado na ala direita, continuava a sentir a falta dos movimentos específicos criados pelos seus colegas do Manchester City para o libertar.
Na segunda parte, finalmente Fernando Santos - três jogos e meio depois - colocou Bernardo a ver o jogo de frente para a baliza contrária. Com isso, a nossa equipa melhorou bastante, passando a ter um jogador capaz de perfurar pelo centro e de dar critério ao jogo ofensivo, com as costas protegidas por um William imponente e batalhador na sua zona de acção. O problema é que nos continuou a faltar espontaneidade na cercania da área uruguaia. Fernando Santos ainda tentou alterar este status-quo colocando em campo Quaresma, mas infelizmente retirou Adrien em vez de João Mário, este último transformado num insuportável burocrata do passe curto e rodriguinho inconsequente.
Servidos por Bernardo, Quaresma e Ricardo centravam com perigo mas Godin e Gimenez eram Adamastores apostados em nos retirar a (boa) esperança. Do outro lado, Raphael, Guedes e João Mário mastigavam o jogo, perdendo sucessivas oportunidades de cruzamento.
Fernando Santos substituiu Guedes por André Silva e, mais tarde, João Mário por Manuel Fernandes. Este, em apenas 10 minutos, fez mais remates e passes para a frente que o jogador do West Ham no jogo todo, mas já não foi a tempo de alterar o fado português.
Um dia marcante para o futebol mundial, assim a modos de um render da guarda de Bolas de Ouro, com Cristiano Ronaldo e Leonel Messi a estenderem a passadeira aos seus sucessores. O mundo esperava um duelo Messi-Ronaldo mas vai ter de se contentar com um despique Mbappé-Cavani. E Neymar está à espreita...
Há aquela velha anedota do homem que reiteradamente se queixava a Deus da falta de sorte, por nunca ganhar o Euromilhões. Um dia, o Senhor, cansado, respondeu-lhe, pedindo-lhe para jogar. É que sem jogar, não se pode ganhar. Mesmo jogando pouco, ainda assim Portugal ganhou o Euro(milhões). Hoje, mesmo com mais posse de bola, faltaram soluções de jogo interior, combinações e apoios frontais e Deus premiou um homem e o seu sofrimento: Oscar Tabarez. Fez-se justiça.
Tenor "Tudo ao molho...": Bernardo Silva