Treinador de bancada - Modelo de jogo
Todos concordarão que mais importante do que o sistema táctico, a forma como onze jogadores se dispõem em campo, é a forma com actuam nos diferentes momentos do jogo, o tal modelo de jogo.
O objectivo primeiro do modelo de jogo é fazer da equipa bem mais que a soma das individualidades que a constituem, é operacionalizado no processo de treino e convém que esteja de acordo com as características dos jogadores disponíveis. Quando isso não acontece e os resultados não aparecem, ou muda o modelo ou seja o treinador, ou existe uma revolução no plantel.
Nestes quase dois anos de Rúben Amorim no Sporting vimos um modelo de jogo muito bem definido e suportado por um 3-4-3 inegociável, bem diferente daqueles a que o clube tinha sido habituado pelos treinadores que por cá foram passando. Os jogadores tiveram de sair da sua zona de conforto, alguns conseguiram outros não, outros vieram com as características adequadas, e as conquistas foram-se sucedendo. Hoje o modelo de jogo já está na fase da optimização, diz Amorim que os conceitos novos vão sendo introduzidos um de cada vez para não confundir nem estragar o que de bom já existe. Está à vista de todos que o Sporting, mesmo sem Nuno Mendes e João Mário, joga bem mais do que em igual momento da época passada.
Visto vá de cima, da bancada, em que princípios assenta esse modelo de jogo que torna o Sporting tão conhecido e tão difícil de anular?
1. Alargar o campo a atacar, encolhê-lo a defender
Quando comecei a ir ao futebol, Vítor Damas repunha invariavelmente a bola em pontapé longo para os avançados, muitos jogadores concentravam-se onde a bola ia cair, e 2/3 do campo ficava vazio. E naquele título do Inácio, era assim mesmo que o Sporting jogava: bola no Schmeichel, pontapé longo para o Acosta. E logo se via depois o que aquilo dava.
Agora Adán passa a bola para um dos defensores posicionados quase na linha de fundo, convidando o adversário à pressão. Simultaneamente os dois alas avançam no terreno, o falso “9” recua, fixando o trinco contrário, e os dois interiores fixam os defesas contrários posicionando-se próximos da linha de fora de jogo na perspectiva dum lançamento em profundidade.
Nesse momento a equipa do Sporting alcança quase todo o campo, e os jogadores adversários têm obrigatoriamente que se espalhar pelo mesmo.
Depois o espaço para jogar pode surgir em diferentes locais, por exemplo entre os defensores e o guarda-redes adversário no tal lançamento em profundidade como no centro do terreno, ou nalgum dos médios para logo lançar a cavalgada atacante por uma das bandas. E quando a outra equipa tenta fechar esse lado, logo a equipa prefere atrasar e rodar para o flanco oposto onde passou a existir outro espaço para prosseguir o lance.
Essa procura constante de espaço, acelerando o jogo quando a bola chega a espaços vazios, evita que a equipa coloque muita gente à frente da linha da bola, e tenha sempre alguém nas costas do portador da mesma para acudir à sua perda e recuperá-la imediatamente.
Quando isso não acontece e a bola é perdida, o Sporting encolhe-se num 5-4-1 em triângulo, ao jeito da disposição das bolas vermelhas no início da partida de “snooker”, que fecha os espaços centrais e explora muito bem a linha de fora de jogo. Aqui surge Coates a comandar toda a manobra defensiva da equipa.
2. Surpreender o adversário no detalhe
Por muito que os treinadores adversários estudem a forma de jogar do Sporting, e montem as suas equipas de forma a anular os seus pontos fortes e explorar os fracos, Amorim parece andar sempre um passo à frente, numa mudança contínua de pequenas coisas, muitas vezes com jogadores em posições diferentes das habituais e que fazem coisas que os adversários não conseguem controlar.
No final dos jogos, e a precisar de virar o resultado, essa exploração da surpresa transforma-se num caos controlado, com Coates a fazer de ponta de lança e alas a fazer de defesas para acelerar jogo desde trás. Já todos vimos o que temos vindo a conseguir assim, mesmo em Dortmund esteve muito perto de dar resultado.
3. Ser competente nas bolas paradas
O Sporting evoluiu tremendamente neste aspecto. Marca muito mais do que sofre, fruto não apenas de muito trabalho específico nos treinos mas também da envergadura física de meia equipa, faltará apenas que os livres directos tenham maior concretização. E aqui também a surpresa vem dos pormenores: os jogadores rodam pelos diferentes papéis de assistência/finalização.
4. Saber “sentar-se” em cima do resultado
Se no futebol o que mais custa é marcar golos, então a equipa que está em vantagem no marcador tem de saber sofrer com confiança a pressão do adversário para recuperar, nunca se desorientando e estando sempre à espreita da oportunidade para aumentar a vantagem. E a melhor forma de aguentar essa pressão é mesmo pela posse da bola.
O Sporting tem conseguido fazer isso muito bem, resistindo à vertigem do ataque para aumentar a vantagem, avançando e recuando no terreno, passando a bola. Muitas vezes os minutos passam sem os adversários terem qualquer oportunidade de golo.
5. Ser fiel ao lema “OndeVaiUmVãoTodos”
Se calhar é este o ponto essencial do modelo de jogo de Rúben Amorim. Quando o Sporting está a jogar, os que estão no terreno do jogo e os que estão no banco preparados para entrar ou acabados de ser substituídos, os consagrados estrangeiros e os mais jovens da formação, constituem todos um corpo único, superiormente liderado pela estrutura de capitães. Quem é chamado para entrar vai com tudo para dentro do campo, quem é chamado para sair fica a puxar pelo que entrou. Isto faz toda a diferença.
Ficam aqui os cinco princípios que julgo essenciais para entender o modelo de jogo de Amorim.
Este modelo de jogo, apesar de tudo o que de bom tem acontecido, não faz as delícias de toda a gente no Sporting. Alguns fartam-se de protestar pelo futebol para trás e para os lados, queriam futebol ofensivo sem reservas. Digo eu que preferiam jogar como nunca e perder como sempre.
Mas para mim este sistema... vale mesmo ouro. E continuo francamente a não entender porque é que a equipa B não joga da mesma forma, até porque na equipa feminina parece que temos lá uma discípula de Amorim. Mas isso será tema doutro post.
#OndeVaiUmVãoTodos
SL