Teorias da conspiração
Não deve haver clube em Portugal - e talvez até no mundo - tão fértil em teorias da conspiração como o Sporting.
O que quer que possa ser dito ou decidido, em Alvalade, obedece sempre a uma lógica oculta e maquiavélica. É assim que muitos pensam.
Ontem, ao escrever aqui no blogue a minha posição favorável à atribuição do nome de Cristiano Ronaldo à Academia leonina, neste assunto em divergência com um texto anterior do Filipe Moura, logo fui brindado por amáveis leitores com a suspeita de que estaríamos perante uma decisão anunciada agora - antes do início do nosso primeiro jogo oficial da época e a duas semanas do fecho do mercado de transferências - «para distrair» os adeptos dessa magna questão que é a votação, em assembleia geral ordinária, do relatório de gestão e contas do exercício financeiro anterior e do orçamento para o próximo exercício.
Salvo o devido respeito, como agora é norma dizer-se em todos os programas de debate futebolístico, imaginar que os sócios do Sporting possam confundir as contas do clube com uma homenagem onomástica a Cristiano Ronaldo equivale a tomar-nos por imbecis. Uma coisa nada tem a ver com outra.
Mas é inútil contrariar a tendência hoje em voga: as redes não tardaram a fervilhar de indignação. E lá veio o argumento habitual: Cristiano Ronaldo «é para distrair». Como se esta homenagem não valesse por si própria.
Voltaremos a ouvir esta narrativa quando o melhor jogador do mundo vier assistir à inauguração simbólica da Academia Cristiano Ronaldo, sabendo-se que faz questão em estar presente mas só poderá viajar de Itália a Alcochete quando o calendário das suas provas desportivas permitir.
Este é um tema que, por analogia, me suscita uma catadupa de interrogações.
A estátua do Leão inaugurada junto ao estádio em Junho de 2017 também terá sido «para distrair»?
A rotunda Visconde de Alvalade e a rua Mário Moniz Pereira, descerradas no mesmo dia com estes nomes ilustres, também terão sido assim denominadas, naquele preciso momento, «para distrair»?
A solene atribuição do cartão "em tons dourados" de sócio n.º 100.000 do Sporting Clube de Portugal a Cristiano Ronaldo, em Novembro de 2016, terá sido «para distrair»?
O baptismo da baliza poente do estádio José Alvalade com o nome do inesquecível Vítor Damas, em Julho de 2009, foi «para distrair»?
A justa homenagem a Aurélio Pereira, como passou a ser conhecido o principal relvado da Academia de Alcochete desde Setembro de 2012, também terá sido «para distrair»?
A decisão de atribuir ao antigo presidente João Rocha o nome do pavilhão destinado às modalidades, assumida em Julho de 2012, foi igualmente «para distrair»?
Se as respostas a estas perguntas forem positivas, deixa de haver dúvidas: tudo no Sporting está envolvido em teorias da conspiração.
Sendo antes de uma assembleia geral, é «para distrair» do que estará em debate.
Sendo depois de uma assembleia geral, é «para distrair» de algum voto negativo que ali ocorra.
Sendo a meio da época, é «para distrair» de maus resultados desportivos.
Sendo no final de um mandato, é «para distrair» da campanha eleitoral que vai seguir-se.
Quando até Cristiano Ronaldo separa, nada pode unir. Esta é a principal nuvem negra que paira sobre o Sporting.
Eis o que deixo à consideração dos "verdadeiros adeptos". Sobretudo aos que vivem num mundo de permanentes conspirações. Um mundo onde se dispara primeiro e só se pensa depois.