Na prática mantém-se, até ver, Sporting Clube de Lisboa em vez de Sporting Clube de Portugal. Mudança bloqueada por uma minoria absoluta - de lisboetas. Três mil e poucos a introduzir um papel na urna bastam para porem e disporem. Querem o clube só para eles. Imunes à tecnologia só aqui, quando usam a tecnologia em quase tudo - da gestão da conta bancária às compras mais diversas.
Fui contra isto, mantenho-me contra isto. Estarei sempre do outro lado. Quero um Sporting verdadeiramente representativo do país inteiro - e não de uns quantos bairros da periferia alfacinha. Quero um Sporting do século XXI. Não quero um clube refém dum mundo analógico que já deixou de existir.
ADENDA: Convém ter a noção das proporções: o bloqueio ao voto electrónico à distância foi corporizado nas urnas por 630 sócios.
Está mais do que inventado software que permita atribuir a um sócio identificado e qualificado para votar a capacidade de o fazer com segurança independentemente da sua localização.
Onde a coisa pode fiar mais fino, sobretudo num país com uma arreigada tradição de desconfiança nos mandantes - e abundam razões históricas para isso... - é na credibilidade dos resultados. Um ligeiro "toque" num dado algoritmo, realidade intangível para quem a ela não acede, ou seja a larga maioria dos humanos, e a votação fica viciada. Mas também é verdade que não faltam boas práticas e processos consolidados para validar a idoneidade de uma eleição. É só ir buscá-las e aplicá-las.
O presidente Frederico Varandas anunciou na passada sexta-feira que iria apresentar à Mesa da Assembleia-Geral (MAG) uma proposta para alterar estatutos e permitir voto universal para os sócios com esta argumentação: "Enquanto existir um sócio a quem não permitimos votar, estaremos a afastar-nos do ADN que em 1906 nos criou um clube de Portugal com a ambição de ser um cidadão do mundo... Não somos um clube de Lisboa. Temos sócios espalhados por Portugal e pelo mundo inteiro que não conseguem participar. Outros com dificuldades de mobilidade. Alguns que trabalham ou têm algum impedimento nos dias de Assembleia Geral. Somos muitos, todos apaixonados pelo clube. Todos querem participar e gozar dos seus direitos na totalidade. Eles nunca se esquecem de nós, não podemos esquecer-nos deles."
Não há dúvida de que se trata duma proposta arrojada que inevitavelmente irá gerar controvérsia mas que pode ser um instrumento importante para fazer evoluir um dos grandes clubes nacionais e libertá-lo de práticas obsoletas e de situações vergonhosas. Como aquelas que se registaram no primeiro mandato de Frederico Varandas, quando um grupo organizado e liderado por gente próxima do ex-presidente criou um clima de insulto e de intimidação nas assembleias gerais do clube que impediu o debate aberto e o esclarecimento de questões.
Convém esclarecer que existem dois tipos de assembleias gerais: a eleitoral, onde o objectivo é o voto e são proibidas as campanhas no local de voto, e as restantes, onde se coloca à discussão as questões e onde também se vota.
Ainda com Bruno de Carvalho e depois com Frederico Varandas, o voto desenrola-se num horário pré-fixado e antes de encerrada a discussão, o que permite a participação de muitos sócios com disponibilidade limitada e que impede que um grupo organizado prolongue até querer a discussão e faça desmobilizar a maioria dos sócios. Estes têm todo o direito de ser esclarecidos para votar, mas o grau desse esclarecimento é definido por cada um e não imposto por nenhuma minoria que exija que a oiçam.
Por outro lado, a descentralização controlada do local da assembleia geral, por exemplo utilizando os núcleos, levanta logo, além dos problemas organizativos, uma questão de igualdade. Que núcleos seriam contemplados e quais ficariam de fora? Aqueles que contam com presidentes "amigos"?
Quando se fala em voto universal, fala-se em i-voting, votar através da internet através dum pc ou dum telemóvel de qualquer ponto do mundo, usando credenciais tecnológicas distribuidas previamente. E descentralizar o debate também pode ser assegurado por plataformas tecnógicas de video-conferência e "room chat" moderado. Aliás é isso mesmo que tem feito a oposição, promovendo podcasts e permitindo o diálogo com apoiantes de todo o lado do mundo.
A grande questão é a confiança, que uns têm e outros não, nos actuais órgãos sociais para implementarem o voto universal. Todos se recordarão das teorias de conspiração associadas ao código de barras dos boletins de voto, e se alguns desconfiam de coisas tão simples e óbvias nunca irão aceitar um sistema baseado em plataformas tecnológicas algures.
Fica aqui aberta a discussão sobre o tema, reservada apenas para quem tiver opinião formada sobre o assunto.
Aspecto da assembleia geral de sábado, quando fui votar ao Pavilhão João Rocha
Se há coisa em que os encarniçados opositores de Frederico Varandas não primam é pela inteligência. Radicalizam tanto o discurso que ficam sozinhos a clamar no deserto. Divorciados da esmagadora maioria da massa adepta.
Isto ficou bem evidente na mobilização dos sócios leoninos, que compareceram em força no Pavilhão João Rocha, neste sábado, para viabilizarem por larguíssima maioria as contas do clube referentes a 2019 e 2020. Nunca tantos tínhamos acorrido de forma tão expressiva a uma votação semelhante: fomos mais de sete mil.
Esta demonstração de vitalidade associativa confirmou que os alucinados radicais nada riscam hoje no Sporting. Gravitam num universo paralelo, enchem as redes sociais de perfis falsos e acabam por confundir essa ficção com a realidade.
Acabam de receber um duche de água gelada. Esta votação indica que em três anos encolheram para metade: em Junho de 2018, eram 29% dos sócios; agora não representam mais de 15%. Foram-se isolando em fases sucessivas, cada vez mais alheios à evidência dos factos.
Com Varandas ao leme, o Sporting pôs fim ao nosso mais longo jejum de sempre no título máximo do futebol português, conquistando o campeonato nacional - além de uma Taça de Portugal, duas Taças da Liga e uma Supertaça. Somos também campeões de futsal, basquetebol e hóquei em patins, detentores da Taça de Portugal de voleibol e básquete. E campeões europeus de futsal e hóquei.
É obra: uma das melhores épocas alguma vez registadas no prestigiado historial leonino. Mesmo com o Sporting gerido por duodécimos por ter sido irresponsavelmente chumbado o orçamento já com o País devastado pela pandemia. Quem assim procedeu, movido pelo ódio vesgo a Varandas, marimbou-se por completo para os nossos atletas, os nossos técnicos, a nossa reputação desportiva e financeira.
O tiro saiu-lhes agora pela culatra. Graças à maioria silenciosa de sportinguistas que não andam aos gritos nas redes sociais, insultando tudo e todos.
Entre os que votaram sim às contas no sábado, incluem-se figuras que estiveram com Bruno de Carvalho.
Os letais, cada vez em menor número, foram derrotados em toda a linha. Pela arma mais poderosa em qualquer democracia: o boletim de voto. O que confirma a força indestrutível do Sporting Clube de Portugal.
Peritos em urnas. Nisto nos tornámos. Salvíficas. Incontornáveis. Inadiáveis. A última oportunidade para resgatar o clube dos seus mais temíveis e terríveis algozes antes da próxima última oportunidade.
Nisto se tem transformado o nosso voto, depositado, na verdade, na urna caixão, tumba de jogadores, treinadores. Presidentes.
A par da condição de maior potência desportiva nacional, alcançámos o estatuto de elite das funerárias da bola. Do mata-mata. Do baralha e mata de novo. Especialistas na gestão de cemitério.
Nisto se tornou o futebol leonino. Nisto se tornaram as eleições no Sporting. E se antecipadas assim serão, de novo.
Também já quis ver Varandas fora da presidência. E continuo a querer.
Confesso. No meu reservado e parcialíssimo tribunal Cheguei mesmo a sentenciar: "O som do estádio está aos gritos. Porra...demita-se o gajo!"
Um danado impulso para o radicalismo quase descontrolado, alimentado pela constatação de que as compras foram praticamente só de entulho. Somada à perda de jogadores nucleares que só revelou a incapacidade de preencher os vazios deixados pelos maus negócios. Mais o intolerável silêncio de presidente e director desportivo que nunca deram a cara pela miserável preparação da época que agora ingloriamente finda.
Um rol crítico, transformado em rolo compressor, impiedosamente empurrado pelas derrotas, empates e péssimas exibições da equipa orientada pelos muitos treinadores que depois enterrámos.
O cenário é negro. Deprimente, mesmo! Mas como sair dele? Por outras palavras: que alternativas há a esta incompetente gestão?
A pergunta é retórica, claro que é. Sei que no papel existem alternativas e boas, por isso reformulo a interrogação: Há alternativas viáveis para uma disputa eleitoral a tempo do seu vencedor preparar bem a próxima época?
Sou da opinião que não, não há.
É conhecida a máxima de que o futebol é a coisa mais importante das coisas menos importantes. Pois, discordo. O futebol é tão importante como as coisas mais importantes.
Todos concordarão que o Sporting é uma nação. Que move milhões. De sonhos e de euros. Que tem um papel fulcral na defesa dos valores que constituem as sociedades cobiçadas pelos povos desvalidos que há pelo mundo fora. Que forma homens e mulheres. Que é um embaixador da excepcionalidade dos portugueses na arte da bola.
Todos sabemos que muitas vezes o Sporting, um jogo de futebol do Sporting, é a coisa mais importante à face da terra.
Teve ou não contornos de fim do mundo aquela canalha combinação de resultados de ontem na Luz e na pedreira? E o impante Salvador e a sua soberba incontida alavancada pela insuportável ascensão ao pódio de onde nos desalojou?
Para mim, evitar que o acima descrito se repita é tão importante e consumir-me-á tanto quanto ter a certeza que o SNS está cheio de saúde.
O futebol não é um caso sério, é seriíssimo! Como tal, quem gere e preside aos destinos do nosso clube tem de ser criticado, supervisionado, interrogado, implacavelmente cobrado. A cultura deve ser a da exigência através de uma insistente e consistente crítica com alternativa apresentada, como fazem as boas oposições partidárias aos Governos nas verdadeiras e sólidas democracias liberais. A chamada marcação cerrada. Com pressão alta e equipa balanceada para o ataque construtivo, só assim ganhadora.
A apresentação e consequente consolidação de uma alternativa só acontecerá através de um trabalho a tempo inteiro, feito durante o mandato presidencial.
Aqui chegado, pergunto. Que alternativas são verdadeiramente conhecidas do grande universo leonino? Que escolhas poderemos fazer que nos dêem as garantias de sucesso, para além do fraco consolo de nos fazermos ouvir, na forma de voto, sobre uma coisa que no fim redundará mais numa fezada do que numa certeza?
Temos o impulso (e eu também a ele soçobrei ao longo da época) de logo convocar eleições, destituir, correr com quem dirige o clube, porque não nos dá as vitórias que queremos. Não nos faz campeões de futebol.
Mas como coisa séria que é o futebol permito-me o exercício de perguntar se era aceitável adoptar a prática de deitar abaixo por sistemas os Governos que não executassem as políticas certas para todos termos aumentos salariais de 20% a cada ano da governação (sei que é subjectivo mas é nesta ordem de grandeza proporcional que estimo o valor da conquista do campeonato).
Ir para eleições sem alternativas conhecidas e reconhecidas, não será mais que uma reacção em vez de uma acção. Um impulso para satisfazer a ausência de vitórias dentro das quatro linhas e que teria uma só virtude: emoção, o sentimento que cimenta o futebol.
Ora, valha-nos isso, a tendência sufragista, a paixão pelos candidatos e facções em disputa, mais a incerteza do resultado seriam a garantia de que a maioria de nós ganharia. Pelo menos nas urnas. Mas seria enganador. Ninguém ganharia verdadeiramente.
Faço por isso votos para que as eleições não sejam "agora!", "já!", e sim quando houver projectos e equipas definidos e de todos conhecidos.
Antes disso, para mim, tudo não passará de uma ida às urnas sinónimo de caixão. De pôr os votos numa futura tumba, cujo destino será o cemitério cada vez maior de sonhos que vamos enterrando.
Alguns alardeiam o princípio "um sócio, um voto" como expressão máxima da democracia dentro dos clubes. Respeito, mas discordo desta tese. Desde logo porque uma agremiação desportiva não é um partido político, devendo premiar a longevidade e a dedicação de quem paga quotas durante décadas, além de acautelar-se contra a possível inscrição em massa de gente vinda sabe-se lá de onde, sem qualquer relação anterior com o clube, apenas com o objectivo de condicionar um resultado eleitoral.
Veja-se o que sucede com o FCP, que embora tenha esse princípio inscrito nos seus estatutos está muito longe de poder ser apontado como modelo democrático. Não apenas por ter como presidente alguém que já ultrapassou Salazar em longevidade no poder, tendo concorrido sem rivais em 12 das 15 eleições entretanto decorridas, mas também porque PdC recusa debater com quem se atreve a apresentar-se contra ele.
Acaba de suceder isso: confrontado pela primeira vez com duas listas adversárias para a Direcção, o decano do futebol português colocou-se num patamar acima dos concorrentes, não os reconhecendo como interlocutores. Os sócios foram votar sem ter havido confronto directo de ideias por recusa categórica do velho dirigente. «Não tive tempo», limitou-se a justificar quando lhe perguntaram por que motivo vetou qualquer debate.
Foi pena. Teria sido uma excelente oportunidade de ser confrontado com a catastrófica situação financeira da SAD portista, que acumulou prejuízos na ordem dos 52 milhões de euros no primeiro semestre desta época desportiva e viu o passivo ascender a quase 450 milhões, o que a coloca em falência técnica e no limiar da insolvência.
ADENDA - Como o Ricardo Roque já aqui assinalou, a "eleição mais participada de sempre" no FCP teve uma afluência muito inferior à última do Sporting. PdC acaba de ser reeleito com 5.377 votos, entre 8.480 votantes. Muito abaixo dos 8.717 votos recolhidos por Frederico Varandas em Setembro de 2018, numa eleição que mobilizou 22.510 sócios.
Esta questão não é 100% inocente, por isso vou contextualizar: Vemos algumas pessoas a culpar os "71%", que destituiram Bruno de Carvalho, pelo actual estado do Clube. São também muitas dessas pessoas que pedem a destituição de Varandas. Assim sendo, e não podendo votar em Bruno de Carvalho, em quem votarão? E, ao votarem nessa pessoa, não estarão, de alguma forma, a tornar-se parte dos 71%?
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