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És a nossa Fé!

À bolina

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Jogar à bolina é uma verdadeira arte. Não será para todas as equipas, pois o célebre "triângulo latino" é uma  táctica  - uma espécie de 5x3x2 muito plástico - que exige uma grande disponibilidade física. E, sempre, um bom timoneiro, um 10 quase "box-to-box" arguto e eficaz, daqueles "à antiga". Mas em havendo isso pode-se jogar olhos nos olhos, e em qualquer campo, contra ventos e até marés. Dias, grande jogador que injustamente nunca ganhou a "Bola de Ouro", foi nisso perito, e como poucos. O  que o levou a ter sido o primeiro a apurar-se para o Cabo. Razão pela qual depois, já veterano, fez a campanha de apuramento na selecção de 98, com Gama. E ainda foi fundamental no campeonato seguinte,  com Cabral, durante o qual se lesionou gravemente, tendo ali terminado a carreira sem jogar a final. Para os mais novos, que não o viram jogar, Dias foi uma espécie do que será Ruben Neves (se o Grande Engenheiro abrir os olhos e se deixe de Adamastores ...) nas armadas de João Félix e Diogo Jota, almirantadas pelo Cristão Ronaldo.

Lembro agora esse grande capitão de equipa, figura até lendária do nosso clube, por causa do que aconteceu nas meias-finais de 88, o célebre jogo de Port Elizabeth (no estádio que hoje leva o belo nome "Nelson Mandela", então chamado "Lagoa"). Como se sabe a campanha estava a ser um sucesso mas o plantel, já exausto devido ao terrível calendário, pois a selecção caíra num verdadeiro "grupo da morte", exigiu mudanças. E Dias, um grande líder, percebeu a situação, soube recuar, mudou a táctica e os objectivos mas mantendo os princípios de jogo, assim salvaguardando a equipa num necessário "que se lixe a taça". E uma década depois o clube foi campeão. E voltou a sê-lo pouco depois, numa senda de sucessos até Queirós e Santos. Sempre, repito, com esta filosofia de jogo, neste ideal da bolina.

É certo que este modelo de jogo, ziguezagueante, por vezes até soluçante, é menos popular. As "molduras humanas" preferem o raçudo "armada invencível" castelhano, o rendilhado da táctica flamenga do tiqui-taca, o coriáceo "quadrado oco" transalpino (dito catenaccio). Ou mesmo o "sem quartel", a imperial razia do pontapé-e-correria britânica. As hostes animam-se vendo os jogos dessas equipas, dizem-nos "jogatanas". E nem pensam nos custos milionários das esquadras que os praticam, impraticáveis na nossa mareação. Por isso assomam aos promontórios, às Superiores e Centrais, ancoram nos areais, quais o Alcochete que não o de Caminha, e imprecam o bolinar, aos plantéis votam escorbutos e sífilis. E até lhes acenam sudários brancos, augurando-lhes a morte. Por vezes acorrem aos cais para os apedrejar, se e quando aportados sem troféus de saques. E aos capitães anseiam chicoteá-los, e apenas isso porque agora proibidas as fogueiras, por sábia e pia determinação da Santa Federação.

Lembro este bolinar por dois acontecimentos destes dias. Idos agora a terras do Mafoma, a dois minutos do final da peleja os nossos marcaram o golo necessário à glória. Nessa mesma noite logo os louvámos, em concorrida procissão entre o Cais da Portela e a Sé do Lumiar, tantos dos mais populares flagelando-se em agradecimentos. A Silas, vero general, outorgámos o devido cognome, Senhor da Selva. E içámos-lhe triunfo, pela boa táctica com que conduziu o combate, sobrevivendo até a erros dos nossos mais novos. Pela argúcia de ter colocado o núbio Doumbia para trancar o castelo de popa, pela coragem de ter resguardado o caboclo Plata, lançando-o aquando os infiéis já exaustos e assim tornando-o tão decisivo. E pela confiança que vem transmitindo à nossa grei, visível nestes recentes triunfos, sucessivos e esclarecedores de que algo vai melhorando, fruto também das nossas preces. 

(Hum, o Diabo desviou a bola para a barra? É tudo tão diferente ... Silas é afinal só selvagem, nem cristão-novo, pagão mesmo. O resto é miserável, gente pecaminosa assim desprovida de favores divinos.)

E consta também que não há dinheiro. Que os banqueiros da Flandres, e os venezianos e genoveses, e, piores do que todos, os malditos judeus, querem que se lhes pague os empréstimos, todo esse ouro e prata com que se armaram as equipagens dos anos anteriores, tantas delas naufragadas, outras regressadas com contas bem esconsas daquelas andanças pelas índias. "Aqui d'El-Rei!", grita-se, urra-se, e até aqui neste rossio blogal. Que se acorra ao paço, que se defenestre Varanda fora, clamam. Pois que venha mais ouro, que se largue a prata. Que se gaste! Que se gaste! Que se ganhe! Que se ganhe!

E aquilo da bolina? Do à bolina? Como, se nem para as galés esta gente serviria?

As claques, os árbitros, os sonsos e o pesadelo

Quase tudo o que terá levado 36,84% dos sócios representantes de 43,46% dos votos a votar na atual direção do Sporting Clube de Portugal foi pelo esgoto, está confrangedoramente atrasado, é invisível ou não passa de rumor que tarda em concretizar-se.

O último bastião foi hoje derrubado: não criticar publicamente a arbitragem, em especial após uma derrota.

Infelizmente, a tática do bom aluno já havia sido testada e ridicularizada por quem "manda" no futebol e nos media vezes sucessivas, ajudando a queimar direções anteriores.

A tática do queixoso tonitruante foi igualmente ineficaz, note-se. Ainda assim teve o condão de oferecer um discurso populista e identitário que, enraizado em uma boa dose de justiça, uniu genuinamente uma larga maioria do universo leonino durante vários anos.

Ver a atual direção insurgir-se contra a arbitragem após a 13.ª (d é c i m a   t e r c e i r a) derrota da temporada (sete delas no campeonato) trouxe-me à memória o timing serôdio com que a atual direção resolveu hostilizar definitivamente e atuar contra as duas principais claques oficiais de clube.

Perdoem-me se estou a ser injusto mas já não consigo encarar estes golpes de asa como algo mais do que atos de desespero para encontrar um inimigo comum que fidelize um pouco as hostes após a confirmação de mais um passo rumo a uma das piores épocas desportivas da nossa história no futebol profissional sénior masculino.

Entretanto, restam 17 jogos (talvez 19 se eliminarmos os turcos) até ao final da época.

Alternativas vocais só as que ventilam a já estafada "venda da SAD", um bizarro milagre que supostamente nos colocaria no rumo certo! É caso para perguntar sarcasticamente: onde estariam os nossos rivais se não tivessem vendido a SAD?

Que surjam outras alternativas, mais bem venturosas e que ajudem a dar segurança a quem já percebeu este filme.

A verdade é que, infelizmente, por mais que se renove, todas as semanas, a esperança na vitória, o mais provável é que se repitam e abundem as duras provas de como a incompetência e impreparação refletida em péssimas decisões tomadas na preparação de época, se convertem em pesadelo centenário para mais de 3 milhões de adeptos.

O tempo é de crise profunda e quem quer fazer parte da solução que tenha cuidado com os calculismos. Tudo se pode precipitar e quem não estiver na arena pode ajudar, por omissão, a sindicar um futuro não necessariamente melhor do que este que vivemos em jeito de triste fado.

De positiva só esta certeza: os sócios estão mais exigentes e, ao contrário do que alguns condores advogam, isso é parte da nossa força e não da nossa fraqueza. Haja competência e saber fazer que as críticas ajudarão a construir o que merece crédito!

{ Blogue fundado em 2012. }

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