De há uns anos para cá, os teóricos do esférico desenvolveram o conceito de «posse de bola», que passou a figurar em todas as análises. Facilitando a vida àqueles comentadores que nada mais fazem senão debitar estatísticas - no Maravilhoso Reino da Internet, basta clicar e elas aparecem, preenchendo tempo de antena e espaço na coluna do jornal. Não é preciso ter opinião própria para quase nada.
Várias vezes tenho concluído, por vezes com um sorriso, que isto serve para coisa nenhuma. Por exemplo, quando o Sporting foi ao estádio da Luz vencer o Benfica por 3-1, a maior «posse de bola» foi dos encarnados (66%). Não chega a ser prémio de consolação, mas parece deixar alguns adeptos satisfeitos: devem preferir que os seus jogadores retenham a bola em vez de a fazerem circular.
No recentíssimo Itália-Macedónia do Norte, que afastou os italianos da fase final do Campeonato do Mundo, a selecção visitante venceu apenas com quatro remates (um dos quais resultou em golo), contra 32 da squadra azzurra, e só 36% de «posse de bola».
Confirmando, uma vez mais, que o conceito que tanto deslumbra os tais teóricos com pós-graduações em Futebologia vale o que vale. Pouco, quase nada.
Interessa é metê-la lá dentro. Tal como já acontecia nos tempos antigos, quando a Internet ainda nem tinha sido inventada.
Em noite de Halloween, Rui Patrício viu-se rodeado das habituais caras conhecidas na linha defensiva. Assim, para esse efeito, Ristovski surgiu mascarado de Piccini, André Pinto vestiu o disfarce de Mathieu e Jonathan...bem, Jonathan foi "Jonathan ao Cuadrado", tantas foram as vezes em que se teve de deparar com o extremo colombiano, o qual foi ala e, mais tarde, lateral direito na equipa da Juventus. Nada de anormal, pois à mesma hora, em Manchester, Svilar vestiu a carapaça de Mitroglou, marcando pelo segundo jogo consecutivo naquilo que foi a antecipação do Dia de Finados lá para as bandas da Luz. É caso para dizer que em noite de bruxas, nem (S)vilar das Perdizes os safou. E nem se pode referir, tendo tão boa imprensa, que Svilar tenha as costas largas...
Como curiosidade, o Sporting marcou o seu golo no quarto de hora em que tocou mais vezes na bola (15-30 minutos, 176 toques) e sofreu o tento da Juve nos últimos 15 minutos, período em que teve menos bola (apenas 78 toques). Globalmente, a equipa tocou 450 vezes na bola durante a primeira parte e 275 vezes, na segunda parte (61,1% do registo do primeiro tempo). Assim se conclui que, mesmo em noite de Halloween, não houve actividade paranormal, apenas consequências que decorreram das estatísticas.
Destaque global para Gelson Martins que esteve em todos os lances de perigo da equipa leonina. Aos 19 minutos, brincou com os apoios de Chiellini, torcendo-lhe a espinal medula de tal forma que já terá consulta marcada num quiroprático, no regresso a Turim. Do lance resultaria o golo do Sporting, após defesa incompleta (e para a frente) de Buffon, o qual perdeu o duelo de "Monstros" com o nosso São Patrício, o exorcista do "mal" transalpino. Na segunda parte, o ala arrancou por entre Alex Sandro e Barzagli e, mesmo carregado pelo brasileiro, percorreu 50 metros e conseguiu chegar à área para depois acabar a decidir pessimamente, não rematando à baliza do desamparado guarda-redes "bianconeri". Ainda participaria na jogada concluida com remate ao lado de Bruno César e naquela em que Bas Dost teria marcado se não tivesse cortado as unhas dos pés durante o fim-de-semana. Em suma, Gelson foi um constante pesadelo para a defesa italiana, tranformando o estádio de Alvalade numa casa assombrada para os "piemontesi".
Outro jogador em evidência foi Battaglia. Começou (primeiro quarto de hora) com uns modestos 6,4% de participação na posse de bola leonina, mas já terminaria a primeira parte com uns imponentes 12,4%, concluindo o encontro com uns notáveis - para um trinco, sendo que ainda foi box-to-box e lateral direito - 13,1%. Também acima da média estiveram Patrício, Ristovski (confirmação das boas indicações deixadas na Taça da Liga) e Acuña, o Muro de Alvalade. Bas Dost, em jogo de grande disponibilidade, conseguiu ganhar importantes bolas nos ares e Bruno César voltou a marcar um golo na Champions. Uma nota final para Bruno Fernandes: as coisas podem até não lhe sair bem, mas é indiscutível que tem um extra de qualidade face a qualquer outro jogador do plantel do Sporting, como se tornou bem evidente no lance que marcaria o último suspiro de ataque leonino.
Junto apresento quadro da posse de bola leonina e comparação com os números de Battaglia, a quem pela função específica em campo muitos destes toques correspondem a desarmes efectivos. Eis a tabela:
Ontem o falante, o único falante, da terceira língua oficial reconhecida pela república (temos o português, o mirandês e o machadês) no final do jogo, dizia-nos (sem se rir) que analisando os dois jogos, tinha faltado um "niquinho" [a não ser que a palavra em machadês tenha outro significado] para o Nacional estar na final.
Um "niquinho"?
Analisemos então os factos.
As imagens em cima são retiradas do orgão oficioso do clube que se situa no lado errado da segunda circular, de hoje e do dia 6 de Março de 2015 (Pedro Correia já escreveu neste "blog" sobre o "timing" dos jogos da Taça de Portugal).
Vejamos então, no primeiro jogo, o Nacional efectuou nove remates à baliza (excepto os interceptados) desses, quatro acertaram na baliza, dois foram golo, dois Patrício defendeu, quatro foram fora e um bateu no poste; já o Sporting efectuou uma dúzia de remates, sete foram ao alvo, cinco defesas de Gottardi e dois golos; cinco para fora; posse de bola 61% para o Sporting que jogou com, apenas, 10 jogadores mais de 30 minutos e 39% para a equipa de Manuel Machado... lá estou como dizia o poeta: "não há machado que corte a raiz ao pensamento".
Analisemos então, o jogo de ontem.
Como vimos, o Nacional precisava de vencer ou empatar marcando três golos ou mais.
Quantos remates acertou na baliza?
Quatro.
Pois, assim é difícil... um clube que precisa de vencer ou empatar por muitos e só consegue acertar por quatro vezes na baliza adversária, põe-se a jeito para perder e a seguir vir choramingar de telemóvel em riste que o golo que sofreu foi feio e que os outros meninos são maus.
No jogo de ontem o Sporting teve 67% de posse de bola, o Nacional 33% ou seja o Sporting foi superior em tudo excepto na "pantufada" aí o Nacional cometeu 22 faltas, e nós, apenas, 17.
[para que fique bem claro, não gosto de ver o Sporting a jogar como jogou ontem, e, embora perceba a opção do Hugo e dos assistentes ao validar o golo eu não o validaria, acho que William está na zona para onde a bola foi jogada. penso que a lei do "off-side" deveria ser melhorada da mesma forma que deveria ser clarificada a questão da bola na mão ou de mão na bola dentro da área. é, apenas, a minha opinião, obviamente]
Quanto à eliminatória, à soma dos dois jogos, foi muito Sporting para pouco Nacional, terminando como comecei, digamos que foi um danoninho madeirense contra um iogurtão de Portugal.
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