«Exceptuando os jogos do SCP e da selecção, nunca torci tanto por uma equipa como ontem [domingo] pela Croácia. Para mim a final seria Bélgica-Croácia, donas do melhor futebol praticado neste Mundial.»
A malfadada crise no Sporting e as constantes erupções noticiosas provocadas por Bruno de Carvalho fizeram-me prestar muito menos atenção a este Campeonato do Mundo do que eu desejaria. E a ter quase tempo nenhum para escrever sobre os desafios que pude ver.
Acontece que as "minhas" equipas foram ficando pelo caminho. Primeiro, a selecção nacional: tombou nos oitavos-de-final, muito aquém dos pergaminhos que tinha a obrigação de defender enquanto campeã europeia em título.
Depois, a selecção que fez tombar a nossa - o Uruguai de Cavani, Godín, Betancur e Luis Suárez. Infelizmente sucumbiu nos quartos-de-final, frente à matreira França.
Optei então pela Bélgica, cujo futebol tanto me seduziu no Mundial - sobretudo nas partidas contra o Japão (3-2) e o Brasil (2-1), duas das melhores deste certame, onde não faltaram jogos cheios de emoção. Courtois, Chadli, Fellaini, Lukaku, De Bruyne e o sagaz capitão Hazard, entre outros, deslumbraram-me com o seu talento em estado puro, não subjugado ao colete-de-forças dos "imperativos tácticos". Azar: também eles caíram aos pés da manhosa França, na fatídica meia-final em que perderam por 0-1. Valeu-lhes, como consolação, a subida ao pódio após vencerem a sobreavaliada selecção inglesa, no desafio para o apuramento do terceiro lugar (triunfo indiscutível por 2-0).
Hoje, ao cair do pano deste Mundial 2018, torci abertamente pela Croácia - que, a par da Bélgica, apresentou o mais belo futebol exibido nos relvados russos. Com merecidas vitórias sobre a selecção anfitriã (após desempate por grandes penalidades) e a Inglaterra (2-1)
Luka Modric: aos 32 anos, o melhor jogador do Mundial 2018
Na final, os croatas apresentaram-se perante os franceses com menos 24 horas de descanso e um desgaste suplementar causado pelo facto de terem disputado prolongamentos nas três partidas anteriores - o equivalente a 90 minutos extra de jogo.
Com a ajuda de um árbitro sem categoria, que ofereceu à França um livre mais que duvidoso do qual nasceu o primeiro golo, seguido de um penálti que suscita dúvidas, a segunda maior potência económica da eurozona, com 67 milhões de habitantes, venceu a selecção da Croácia, país cuja população pouco ultrapassa os 4 milhões.
Venceu por 4-2, mas não (me) convenceu. O forte desta França - que assim se redime da derrota com Portugal, há dois anos, na final do Europeu - é a organização colectiva. Mas sem nunca ter praticado um futebol digno de incondicional aplauso. É verdade que Griezmann esteve impecável nas bolas paradas, Umtiti e Varane foram sólidos no bloco defensivo, Kanté destacou-se como o melhor médio defensivo do torneio e Pavard foi uma revelação como lateral direito. Mas só Mbappé, a espaços, soube exibir a fantasia criativa de que é feita a verdadeira história dos melhores Mundiais.
A Croácia, pelo contrário, perdeu mas convenceu. Como a Holanda de 1974, finalista derrotada. Como o Brasil de 1982, que não passou dos quartos. Como a Holanda de há quatro anos, que se ficou pelo terceiro posto.
Capitão, médio criativo, incansável cérebro e pulmão da equipa, inequívoco maestro da combativa selecção croata, que atingiu o melhor resultado de sempre: só por ele, já teria valido a pena ver o Mundial.
Mbappé, melhor jogador sub-20: uma estrela em ascensão
Com as grandes estrelas prematuramente afastadas (Cristiano Ronaldo, Messi, Neymar, Lewandowski, Salah, Kroos, James Rodríguez, Iniesta), o croata do Real Madrid emergiu como a grande figura, apesar de ter marcado apenas dois golos (mais dois nas rondas dos desempates por penáltis, frente à Dinamarca e à Rússia).
Tão cedo não nos esqueceremos dele. Tal como de Ratikic, Vida, Perisic, Kovacic e Mandzukic, entre outros.
Quanto a Mbappé, eleito melhor jogador jovem do Mundial 2018, considero que se trata também de um justo galardão. Tem apenas 19 anos, é um futebolista ainda em formação. Merece este incentivo, na expectativa de que no Campeonato da Europa de 2020 possa confirmar os atributos que agora deixou antever. Por mim, aposto nele.
Já antes o disse, estou a torcer pela Bélgica. Razões de família, que a minha filha lá cresce e gosta. Razões minhas, que amiúde tenho visitado o país, aprazível (e com um toque, malgré tout, da querida África do Sul, coisa arquitectónica lá na área flamenga), e para o qual emigrarei antes das eleições sportinguistas. E também por agora torcer por uma final de inéditos, uma Bélgica-Croácia, que seria uma delícia.
Mas torço pela Bélgica fundamentalmente pela equipa, seus magníficos jogadores e pelo belo enquadramento táctico - Martinez, o treinador deste mundial, mostra que a era do ferrolho acabou. Outros postais poderão ser postos a propósito disto, até reflectindo sobre o futuro da nossa selecção, mas neste elogio à Bélgica em dia de meia-final, ainda por cima contra os arrogantes franceses, cuja derrota (excepto se contra a Alemanha) sempre desejo, não poderei botar melhor do que o Pedro Azevedo, nos comentários àquele meu postal pró-belga. Por isso aqui coloco o texto do seu belo comentário, forma de gritar "Allez Diables Rouges":
"Creio que a vitória da Bélgica seria a vitória do futebol no seu estado mais puro e, como tal, deverá ser evitada a todo o custo pelos treinadores da actualidade.
O futebol hoje é um exercício tremendamente burocrático. Toda a gente quer jogar à Guardiola, mesmo sem os jogadores que tem Guardiola. É a táctica da serpente: um passa-repassa insuportável que vai adormecendo e/ou hipnotizando o adversário até que este se desposiciona e abre um espaço. O futebol deixou de ser futebol. Hoje em dia é mais andebol - com basculação, lenta para que não desequilibre quem tem a posse (e assim nunca desequilibra, também, o adversário), para a esquerda e para a direita - ou xadrez, um jogo mental.
Os treinadores actuais têm uma visão do jogo que, primeiramente, consiste em tudo fazer para não perder. Tudo assenta numa defesa compacta. Quem pense o jogo a partir do ataque é logo visto por eminências como o Luís Freitas Lobo como um romântico, coitado. Como se o romantismo fosse algo mau, ingénuo, inaceitável. Como se o futebol não fosse, desde a sua génese, um jogo de emoções e não tivesse um só objectivo, o golo, "goal", a meta.
O espectáculo televisivo futebolístico hoje assemelha-se a um "reality show" com epicentro numa qualquer repartição pública. Ganha-se pouco e ninguém quer ousar, não vá perder o emprego. O adepto deve contentar-se apenas e só com a vitória final, da mesma forma realista e resultadista como se encara a vida nos dias de hoje. Os meios empregues interessam pouco, o resultado sim. Por tudo isto, equipas como a belga merecem ser valorizadas. Ela corre o risco de se desequilibrar ao tentar desequilibrar o adversário. Nela há espaço para "brasileiros" como Hazard (perigo em francês) e para defesas que atacam, como Vertonghen, Chadli ou Menier, para aceleradores como De Bruyne, artífices como Mertens, mas também para arrombadores de portas como Lukaku ou dominadores do espaço aéreo como Fellaini, todos superiormente treinados por Roberto Martinez, o qual mudou o jogo Bélgica-Japão a partir do banco. Um treinador sempre desvalorizado pelos nossos "experts" do comentário.
Assim, pese embora tenha avançado logo no início com a vaticínio no "dark horse" Inglaterra e veja a França como a equipa que joga o futebol mais equilibrado, gostaria que os Diabos Vermelhos vencessem. Seria bom porque obrigaria toda uma nova geração de treinadores saída das universidades a repensar o jogo."
Acontece-me, nisto do Mundial estou a torcer pelos vermelhos - e já imagino os mais abrasivos dos comentadores brunófilos aqui a resmungarem: "bem me parecia, é lampião!".
É que nem mais, não é só influência filial (pós-Uruguai, claro), não é só isto de estar de malas feitas para emigrar para lá. Nem a paixão pela pátria (enfim, aquilo não é bem uma pátria, mas vamos aceitar por ora) de Hergé, Claus e Brel (que tanto a resmungaram), Jacobs ou Merckx ... São mesmo estes "Diabos Vermelhos". Jogadores de classe extra não lhes faltam, e quantos: De Bruyne, Hazard, ambos magos, Kompany e Lukaku monstruosos, mais um punhado de peões espantosos, para além do claro que malvado Witsel. E Courtois, um génio da baliza. Para além de que táctica e fibra não lhes faltam, como o mostra(ra)m as lágrimas nipónicas.
Na minha meninice o Benelux perdeu os dois mundiais que mereceu, verdadeiras "derrotas imorais". Que os vizinhos vão lá buscar o caneco - e que bom seria para um país estuporadamente fracturado. Allez, Diables Rouges!
Quando escrevi este "post" há um ano e um dia, ai, ai, ai, que o Oliveira está doido.
Passado um ano há apenas duas selecções europeias eliminadas nos oitavos de final (no tempo regulamentar) as duas faziam parte do mesmo grupo.
A Suécia foi segunda num grupo que tinha a França, a Holanda e a Bulgária, eliminou a Suiça sem espinhas, tal como já tinha afastado a Itália do Mundial.
A fortuna nos grupos de qualificação, a sorte nos grupos do Mundial (o nosso foi, claramente, o grupo mais fraco) não dura sempre.
Enfim, como me diziam hoje: "tivemos muito azar"; retorqui: "o Uruguai venceu os jogos todos"; "é pá, ó Pedro e a sorte qu'os gajos têm tido".
É assim, a selecção portuguesa de Fernando Santos conquistou, justamente, um Europeu com um futebol maravilhoso e perdeu, injustamente, uma Taça das Confederações e um Mundial apesar do fantástico futebol que praticou, foi azar.
O Brasil deu ontem um passo decisivo para assumir sem rodeios a candidatura ao título de campeão mundial ao superar o México e atingir os quartos-de-final - o que sucede pela sétima vez na sua história. Num jogo em que durante a primeira parte cedeu a primazia da iniciativa à equipa adversária, que se foi desgastando em sucessivas iniciativas de futebol ofensivo travadas pela defesa canarinha, liderada pelos veteranos Thiago Silva e Miranda e guarnecida com dois laterais imprevistos: à esquerda, Filipe Luís (por impedimento de Marcelo); à direita, Fagner (terceira escolha após a lesão de Dani Alves que o impediu de viajar para a Rússia e a lesão muscular de Danilo).
O plano resultou. As energias físicas e anímicas do México - que nunca venceu o Brasil numa fase final de um Mundial - foram-se esgotando em lances de bonito futebol de ataque desenhados nas alas pelos dinâmicos Herrera e Guardado mas neutralizadas pelo "escrete". E na segunda parte operaram a reviravolta, assumindo o comando das operações. Com momentos que fizeram lembrar o melhor Brasil que guardamos na memória - desta vez protagonizados por Neymer. Foi ele a abrir o marcador, aos 51', coroando uma bela jogada colectiva e uma decisiva assistência de Willian. Foi ele também a acelerar e a cruzar, aos 88', para o golo da confirmação, a cargo de Firmino, entrado dois minutos antes com manifesta vontade de ser titular em vez do apático Gabriel Jesus. Volta a marcar pelo segundo jogo consecutivo, após ter feito o gosto ao pé contra a Costa Rica ao cair do pano.
Disputado na cidade russa de Samara, este foi um jogo digno de Mundial que castigou a equipa mais ousada e premiou a equipa mais astuta. Com Cristiano Ronaldo, Messi, Iniesta, Kroos, Salah e Lewandoski fora do torneio, Neymer começa a emergir como a grande figura deste Campeonato do Mundo. Já a espreitar a Bola de Ouro.
Fui ao "sítios" dos jornais desportivos e à minha ração ("feeds") no FB para sentir o pulsar popular sobre a participação no Mundial (Fernando Santos é um técnico timorato, e incapaz de preparar um plano de ataque; CR não é, já não é, o ídolo que dizem; Guedes não presta, nem se percebe o que ali está a fazer; André Silva ausente; William não presta, não tem intensidade; Pepe - e os centrais - já não são o que foram; este Ricardo não se compara ao Cancelo [nem ao Cedric] ou ao Semedo; Rafael Guerreiro está uma desgraça; o Bernardo passou ao lado do mundial; o João Mário não tem qualquer cabimento; está visto que o Euro 2016 foi só uma grande sorte; etc.).
O meu rescaldo? "Não se pode ganhar sempre". E isto é muito bonito de se (poder) dizer.
O Marca espanhol consagra o sucesso do Sporting no Mundial 2018. Pois o clube que mais formou jogadores entre os 736 participantes foi o Sporting: 14 (o jornal aponta apenas 13, corrigido pelo DN). O Barcelona tem 11, tal como um costa-riquenho, o Dínamo de Zagreb tem 9, e um ... Sporting uruguaio tem 7.
"Para trás mija a burra", diz o povo "na sua infinita sabedoria", como sói dizer-se. Não fiquemos presos na denúncia dos "sportinguistas" (?) que julgam adequado "dar um apertão" a quem trabalha neste local de excelência mundial. Expurgue-se o clube de tal gente.
O futebol tem destas coisas. Durante a semana, todos os especialistas advertiam para o perigo das bolas paradas uruguaias, mas acabámos por ser nós a marcar, após um canto marcado à maneira curta. Os mesmos teóricos perspectivavam um duelo entre os dois poderosos avançados sul americanos e os nossos centrais Pepe e Fonte. Acontece que Cavani foi decisivo, mas apenas quando entrou alternadamente nos espaços ocupados por Raphael e Ricardo, dois laterais.
Na primeira parte, a Portugal, o que faltou em profundidade sobrou em lateralização. Assim, sem comprimento e só com largura, aos lusos faltou área, mais concretamente, grande área. Tal como uma equipa de rugby, os portugueses chegavam às imediações do último reduto uruguaio mas depois passavam a bola, uns aos outros, sempre para trás. Dispostos num 4-4-2 com os avançados muito abertos, os nossos só faziam cócegas à defesa adversária. Guedes foi igual a si próprio - uma nulidade neste Mundial -, João Mário mostrou a incapacidade habitual de queimar linhas e jogar para a frente e Bernardo, na primeira parte colocado na ala direita, continuava a sentir a falta dos movimentos específicos criados pelos seus colegas do Manchester City para o libertar.
Na segunda parte, finalmente Fernando Santos - três jogos e meio depois - colocou Bernardo a ver o jogo de frente para a baliza contrária. Com isso, a nossa equipa melhorou bastante, passando a ter um jogador capaz de perfurar pelo centro e de dar critério ao jogo ofensivo, com as costas protegidas por um William imponente e batalhador na sua zona de acção. O problema é que nos continuou a faltar espontaneidade na cercania da área uruguaia. Fernando Santos ainda tentou alterar este status-quo colocando em campo Quaresma, mas infelizmente retirou Adrien em vez de João Mário, este último transformado num insuportável burocrata do passe curto e rodriguinho inconsequente.
Servidos por Bernardo, Quaresma e Ricardo centravam com perigo mas Godin e Gimenez eram Adamastores apostados em nos retirar a (boa) esperança. Do outro lado, Raphael, Guedes e João Mário mastigavam o jogo, perdendo sucessivas oportunidades de cruzamento.
Fernando Santos substituiu Guedes por André Silva e, mais tarde, João Mário por Manuel Fernandes. Este, em apenas 10 minutos, fez mais remates e passes para a frente que o jogador do West Ham no jogo todo, mas já não foi a tempo de alterar o fado português.
Um dia marcante para o futebol mundial, assim a modos de um render da guarda de Bolas de Ouro, com Cristiano Ronaldo e Leonel Messi a estenderem a passadeira aos seus sucessores. O mundo esperava um duelo Messi-Ronaldo mas vai ter de se contentar com um despique Mbappé-Cavani. E Neymar está à espreita...
Há aquela velha anedota do homem que reiteradamente se queixava a Deus da falta de sorte, por nunca ganhar o Euromilhões. Um dia, o Senhor, cansado, respondeu-lhe, pedindo-lhe para jogar. É que sem jogar, não se pode ganhar. Mesmo jogando pouco, ainda assim Portugal ganhou o Euro(milhões). Hoje, mesmo com mais posse de bola, faltaram soluções de jogo interior, combinações e apoios frontais e Deus premiou um homem e o seu sofrimento: Oscar Tabarez. Fez-se justiça.
Portugal imitou a Argentina, despedindo-se do Mundial da Rússia. Fomos derrotados em Sochi pelo Uruguai, sem o nosso Coates em campo: dois golos de Cavani, cada um em sua parte, decidiram a partida. A equipa das quinas teve muito mais posse de bola (61%), mas foi inconsequente. Demorávamos uma eternidade a chegar à baliza contrária e, uma vez aí, os jogadores faziam imensa cerimónia: nenhum deles parecia com vontade de marcar. Incluindo Cristiano Ronaldo, hoje irreconhecível, quase sempre encostado ao flanco esquerdo. Gonçalo Guedes, que o seleccionador Fernando Santos teimou em manter como titular, esteve 74' em campo sem fazer um só remate. André Silva, que o substituiu, idem aspas. Bernardo Silva falhou um golo de baliza aberta aos 70'.
O Uruguai limitou-se a subir três vezes ao nosso reduto defensivo: marcou em duas dessas ocasiões, com disparos indefensáveis do avançado do Paris Saint-Germain, de longe o melhor em campo. E poderia ter marcado na terceira: só uma grande defesa de Rui Patrício impediu que de um livre a cargo de Luis Suárez resultasse mais um golo.
Foi preciso, do nosso lado, um defesa encaminhar a bola para as redes uruguaias, estavam decorridos 55': Pepe, de cabeça, na sequência de um canto muito bem apontado por Raphael Guerreiro. Quaresma, que fora herói contra o Irão, permaneceu no banco até aos 65'. Quase no fim, aos 85', Manuel Fernandes pisou pela primeira vez um palco do Mundial. Gelson Martins, um dos raros jogadores com características ofensivas que poderiam acelerar o nosso jogo, nem calçou.
Regressam todos à pátria, mais cedo do que muitos pensávamos. Desta vez faltou-nos o Éder. Daqui a quatro anos haverá mais.
O melhor - Pepe. Cometeu erros defensivos, mas foi ele a ir à frente marcar o nosso golito solitário. Salvou-nos de ficarmos em branco.
O pior - Gonçalo Guedes. Outra oportunidade perdida. Permaneceu 74' em campo sem fazer um remate. Parecia que a bola lhe queimava os pés.
Chegámos ao verdadeiro Campeonato do Mundo - aquele em que cada jogo é de tudo ou nada. Aumenta a emoção, redobra o espectáculo, ressurge o genuíno futebol de acelerada rotação em busca da vitória.
Ingredientes bem notórios esta tarde, em Kazan, na partida que opôs a Argentina, finalista vencida do Mundial de 2014, à França, finalista vencida do Europeu de 2016. Talvez a melhor já disputada neste Mundial da Rússia. Com sete golos marcados e uma justa vitória dos franceses, com menos posse de bola mas melhor dispositivo táctico e muito melhor organização colectiva.
A selecção gaulesa adiantou-se no marcador logo aos 13', com um penálti convertido por Griezmann: a estrela do Atlético de Madrid não vacilou na linha dos 11 metros. Os argentinos, numa toada lenta e previsível, tardaram a reagir. Foi preciso um lance de inspiração individual para reacender a chama: iam decorridos 41' quando a turma alviceleste empatou, com um fortíssimo remate de Di María, fora da grande área.
Ao intervalo, 1-1: resultado lisonjeiro para os argentinos. Mais ainda contra a corrente do jogo foi o segundo golo da selecção treinada por Jorge Sampaoli, numa jogada de insistência de Messi com a bola a tabelar em Mercado: o lateral do Sevilha, sem saber bem como, viu-a encaminhar-se para o fundo das redes.
A Argentina parecia ter virado o jogo. Mas a partir daí desenrolou-se o espectáculo do futebol francês. Com três grandes golos em 11 minutos. O primeiro aos 57' pelo jovem lateral Pavard, em estreia absoluta na fase final de uma grande competição, com um petardo indefensável a mais de 20 metros de distância da baliza, apanhando a bola no ar, após cruzamento perfeito de Lucas. O segundo aos 64', por Mbappé, numa movimentação rapidíssima dentro da área, libertando-se das marcações e fuzilando Lloris. O terceiro aos 68', também por Mbappé, coroando um fabuloso lance colectivo que envolveu seis jogadores com a bola ao primeiro toque - destaque para uma diagonal desenhada por Matuidi e para a primorosa assistência de Giroud.
Os argentinos ainda reduziram, no terceiro minuto do tempo de compensação, por Agüero - que ficou no banco, tal como Higuaín, e só entrou aos 66'. Demasiado tarde para discutir o resultado num desafio em que os gauleses se impuseram desde logo pelo seu magnífico trio do meio-campo (Matuidi, Kanté e Pogba).
Messi regressa a casa com apenas um golo marcado na Rússia - frente à Nigéria. Hoje ajudou a construir o segundo e assistiu Agüero no terceiro. Fez ainda um grande passe para Pavón, aos 38', no corredor direito. Pouco mais se viu. No confronto com Cristiano Ronaldo, fica desde já a perder.
A França, ao vencer pela primeira vez a Argentina na fase final de um Mundial, transita para os quartos. Os argentinos caíram, imitando os alemães, vencedores do Mundial em 2014 e agora excluídos na fase de grupos pela primeira vez na sua história.
O futebol continua a ser uma caixinha de surpresas. Daí o seu irresistível e perdurável fascínio: ainda permanece sem rival.
Valeu-nos aquele monumental disparo de trivela do Ricardo Quaresma, em quem enfim o seleccionador apostou como titular, para carimbarmos o passaporte para os oitavos de final deste Mundial da Rússia. Sabendo desde já que disputaremos no sábado esse decisivo desafio com o destemido Uruguai de Luis Suárez, Cavani, Godin e Betancur, que ontem cilindrou a selecção anfitriã por 3-0.
Boa primeira parte da turma nacional, que soube trocar a bola num meio-campo onde Adrien se estreou também como titular - fazendo logo a diferença em intensidade, posse de bola e abertura de linhas de passe, combinando de olhos fechados com William Carvalho, autor do melhor passe longo do desafio, a isolar João Mário, que num toque de classe serviu Cristiano Ronaldo. Uma jogada logo aos 3' digna de ser vista e revista.
A pressão lusa foi intensa durante toda a primeira parte frente aos comandados por Carlos Queiroz, que em grande parte dos 45' iniciais se remeteram ao seu reduto defensivo, colocando-se quase todos atrás da linha da bola. Até que Quaresma fez em estilhaços essa estratégia ao marcar aquele grande golo, no último minuto regulamentar da primeira parte. Um golo em que tudo é perfeito, incluindo o passe inicial de Cédric e a fenomenal assistência de Adrien, com um precioso toque de calcanhar.
A história do segundo tempo foi bem diferente. E começou a ser escrita, na verdade, aos 53', quando Cristiano Ronaldo, derrubado em falta em zona proibida, decidiu imitar Messi e falhar - também ele - uma grande penalidade. Permitindo que o guarda-redes adivinhasse o lado para onde rematou.
Podia ser apenas um percalço. Mas redundou num descalabro exibicional da nossa selecção, que passou a jogar sobre brasas, cometendo faltas que nos podiam ter valido punições mais duras - numa delas Carlos Queiroz exigiu cartão vermelho a Ronaldo, que após visionamento do lance em vídeo-árbitro recebeu apenas o amarelo.
Os iranianos, dispostos a tudo neste duelo travado em Saransk, atreveram-se enfim: o perigo passou a rondar a nossa baliza, salva aos 58' por um espectacular corte de Pepe. As trocas renderam pouco ou nada, designadamente a saída de André Silva para a entrada do apagadíssimo Bernardo Silva e a mudança de João Mário por João Moutinho. Um sofrimento desmedido que culminou com um penálti favorável ao Irão castigando braço na bola de Cédric. Iam decorridos 93': Rui Patrício não conseguiu evitar. Os quatro minutos restantes do prolongamento decorreram com todos os jogadores de nervos em franja, até porque se disputava em simultâneo o Espanha-Marrocos, com sucessivas oscilações no marcador (resultado: 2-2), com reflexos na classificação final.
Foi um empate arrancado a ferros, que terminou com a equipa iraniana destroçada, fora deste Mundial. Espanha e Portugal seguem em frente. A estrelinha de Fernando Santos volta a luzir.
O melhor - Adrien. Estreia em grande no Mundial como titular repetindo a exibição de luxo do Euro-2016 e demonstrando que merece figurar no onze inicial. Pela forma como acelera o jogo português, como se articula com os colegas do meio-campo, como sabe abrir linhas de passe. Assistência primorosa para o golo de Quaresma.
O pior - Bernardo Silva. Passou ao lado do Europeu, por lesão. E parece estar a passar também ao lado do Mundial, tal como o seu ex-parceiro do Benfica Gonçalo Guedes, que desta vez ficou de fora e só entrou para queimar tempo. Actuou a partir dos 70' e nada fez que mereça elogio. Joga sem confiança, incapaz de um lance inspirador.
A partida disputava-se em Saransk, na Mordóvia, região russa que Gerard Depardieu escolheu para residir, trocando o imposto para ricos em França (75%) por uns meros 13%.
Fernando Santos é um homem justo, um meritocrata e, por isso, lançou Quaresma e André Silva de início, em detrimento de Bernardo e Guedes que têm passado ao lado deste Mundial. Portugal começou bem, a circular a bola com rapidez. Ronaldo lançou-se em velocidade entre três adversários e rematou com perigo. Pouco tempo depois, João Mário mostrou que a sua relação com o golo é semelhante à que um gato tem com a água.
Após esta entrada forte, o jogo tornou-se previsível. A equipa lusa voltou à lentidão de processos a meio campo que nos vem habituando. A excepção era Adrien, que ia ligando os sectores e criando alguma dinâmica. Numa dessas acções tabelou magistralmente, de calcanhar, com Quaresma e a defesa iraniana estendeu o tapete (persa) para a trivela do Mustang. Bola no ângulo superior esquerdo. Um golo magistral!
Na segunda parte, Portugal regressou a dominar as operações mas com pouca profundidade no seu jogo. Após uma penetração na área de Ronaldo, o VAR entrou em cena pela primeira vez. Penálti! Cristiano partiu para a bola e, para espanto de todos, mostrou que é humano. Aliás, o craque português não esteve feliz no jogo como se lhe faltasse uma concorrência do outro lado que o motivasse para ir mais longe.
Os iranianos nunca baixaram os braços, mas infelizmente Ronaldo e Cedric também não. Penso que o árbitro "trocou as voltas": à primeira, salvamo-nos de perder o nosso capitão e melhor jogador (segunda decisão do VAR); à segunda, penálti, forçado, contra (terceira decisão do VAR) e golo do Irão. Festa breve dos persas pois, quase em simultâneo, a Espanha empataria contra Marrocos, voltando a pôr os os pupilos de Queiroz fora do Mundial. Nos últimos minutos, os iranianos ainda podiam ter ganho mas o remate acertou na malha...lateral, apurando-se assim os portugueses para os oitavos-de-final, onde defrontarão o Uruguai, Sábado, em Sochi, no Mar Negro.
Em conferência de imprensa, Carlos Queiroz mostrou ainda haver sequelas do episódio "perguntem ao Queiroz", da África do Sul. Queixou-se de que só 3 jogadores portugueses o cumprimentaram e usou mil e uma vezes, numa longa narrativa, a expressão "elbow", referindo-se ao lance que envolveu Cristiano Ronaldo. A mim, soou-me a dor de cotovelo...
Adrien e Pepe foram os nossos melhores jogadores. Ricardo Quaresma foi o génio da lâmpada que soltou a magia esta noite na Mordóvia. Os restantes não deslumbraram, embora se registe a melhoria de Raphael Guerreiro. As entradas de Bernardo e de Moutinho foram mais para arrefecer o jogo. Guedes mal aqueceu, sequer.
E como tudo aquilo se tornou já passado há que pensar e sonhar o futuro. O imediato? Amanhã será o jogo da selecção nacional contra o Irão, no qual é preciso pelo menos empatar. E há isto de olhar para o Irão com simpatia, dado o destacamento português que o anima. Carlos Queiroz, figura fundamental no desenvolvimento do futebol no nosso país. Homem cuja importância não é suficientemente lembrada. Que nos deu grandes títulos, e numa era em que títulos colectivos eram miragens. Que depois tão maltratado em Portugal foi: sim, a gente pode continuar a resmungar contra aquela substituição do Paulo Torres (no 3-6, adianto para os mais novos). Mas foi indecente a forma como foi, bem depois, corrido da selecção, com intervenção do governo e tudo, e diante da mentalidadezinha de funcionário público autocrata daqueles "médicos" do serviço contra o doping. Há maneiras respeitosas de fiscalizar, há maneiras desrespeitosas de policiar. Queiroz (insisto, substituição do Paulo Torres à parte) tem uma carreira excepcional - quem ler a autobiografia de Ferguson fica até espantado com a dimensão e a densidade dos elogios que o grande treinador, verdadeiro ícone mundial, lhe faz. A relação dos portugueses com Queiroz é o caso típico de "santos da casa...".
E ainda por cima está por lá acompanhado pelo Grande Oceano, o sempre nosso capitão. A lembrar-nos, até, que os que fazem o Sporting são os atletas, de hoje e de antes. E convém lembrar isso.
Como estar assim contra o Irão?
O meu desejo, para o tal futuro imediato? Que a selecção empate o jogo. E que os nossos queridos vizinhos ganhem o seu jogo. Passaremos em primeiro lugar, seguindo para os jogos do "mata-mata" como dizia Scolari. E também os nossos Queiroz e Oceano. E que tenham o sucesso que lhes seja possível.
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