Há dias para tudo. São tantos os dias dedicados a tanta coisa, que não chegam já os dias do ano para tanta "dedicação". Para a igreja católica é o dia de São João de Deus, um alentejano de Montemor padroeiro dos doentes, enfermeiros e hospitais. Eu, que tive uma educação católica (quem não teve, se nasceu antes dos anos setenta?), mas que me converti ao agnosticismo, prefiro dedicar o meu dia de hoje (como o de ontem e como o de amanhã) a homenagear as mulheres. Todas aquelas que ao longo dos tempos se notabilizaram na defesa dos outros elevando-se a si próprias enquanto género/grupo e hoje as mulheres esposas, as mulheres mães, as mulheres filhas, as mulheres avós, todas as mulheres que vivem o horror das guerras e das suas privações. Em todas as guerras, as genocidas e as outras; que se há dor maior que perder o companheiro, o filho, o pai, o neto em consequência da estupidez e ganância de alguns homens, eu não consigo imaginar. Há problemas cá onde a gente vive em paz? Há e eles até aparecem nas notícias alguns e há que resolvê-los, que os seres humanos são todos iguais, de facto e aos olhos da Constituição. Mas hoje, pelo menos hoje, nas festas, nos saraus, nos almoços e jantares comemorativos, ao mesmo tempo que não se esquece e reforça a necessidade de valorizar o papel das mulheres na sociedade e de continuar a justa luta por igualdade de salários e direitos e de valorizar cada vez mais a maternidade, não nos esqueçamos todos da terrível situação que passam algumas mulheres um pouco por todo o Mundo, a quem são negados todos os direitos. Até o mais nobre e simples deles, o direito à existência. Um feliz 8 de Março para todos, para as mulheres e para quem as acompanha na sua luta.
Nota: O poster reproduzido vai em alemão, como podem reparar é de 1914 e proclama o direito ao voto feminino. É dedicado ao membro mais recente da família, que é uma mulher e alemã.
Há tempos li que a FIFA ou a UEFA, não sei precisar quem, teriam solicitado aos operadores de câmara e consequentemente aos realizadores das transmissões televisivas de futebol, que evitassem fazer destaques em directo a algumas “carinhas larocas” presentes dos estádios.
Não imagino se alguém seguiu esse preceito nos milhares de jogos transmitidos, até porque só vejo futebol de 11 em Alvalade.
Todavia o futsal é diferente e face ao que escrevi tenho de dar os parabéns pela transmissão do Canal 11 da Federação Portuguesa de Futebol, ontem do Pavilhão da Luz.
Por aquilo que consegui ver e rever o operador de câmara cuidou em só mostrar caras femininas feias e sem gracinha nenhuma. Já para não falar do melão que apresentavam…
O curioso foi a realização procurar muitas vezes as mesmas faces. Coitaditas… elas não são culpadas da sua sofrível beleza, mas pelo menos tiveram os seus segundos de fama. E o mais estranho é que numa breve passagem pelo público vi uma cara engraçada... vestida de verde! Claro!
Termino então com a célebre máxima que escutei da boca do antigo Presidente do Sporting, Sousa Cintra: podemos não ter mais adeptas que os outros, mas as nossas são de certeza absoluta as adeptas mais bonitas!
Dantes dizia-se: "o futebol é para homens de barba rija".
Estava errado, claro. Então e os meninos, as meninas e as senhoras, todos jogam futebol e não têm barba, não é?
Embora o futebol não seja uma ciência exacta, parecem ser os homens de barba a resolverem os desafios e a vencerem os jogos, foi assim com Coates no ano do título, foi assim com Paulinho nos dois jogos com o Portimonense, enfim parece existir uma relação entre a barba na cara e os jogadores que decidem jogos através de golos de bola corrida.
Falei, propositadamente, em "bola corrida"; de um modo geral, as "bolas paradas" são marcadas por jogadores imberbes.
Espero que amanhã seja dia de darmos água pela barba aos ingleses e que o nosso barbudo faça o que lhe compete: contribuir para os nossos golos.
Não podia terminar sem uma saudação às mulheres, especialmente, às sportinguistas, dessas destaco as nossas camaradas/colegas que são autoras do "És a Nossa Fé", um beijinho, para todas.
Para todos os feministas que frequentam este blogue, os de anteontem e os de sempre, preocupados com a igualdade de género no Sporting, pois ficam a saber que o Sporting ganhou mais uma vez ao Porto em voleibol feminino.
Com um grande treinador, Rui Costa, e verdadeiras leoas em campo, como a Daniela e a Bruzza, temos equipa para disputar o titulo.
Stephanie Frappart, Yamashita Yoshimi e Salima Mukansanga fazem história neste Mundial
Havendo agora mulheres de apito na boca, neste Mundial de Futebol, não custa vaticinar que aparecerão cada vez mais nos relvados, incluindo em jogos dos campeonatos nacionais. Portugal não será excepção.
Nada tenho a objectar: são sinais dos tempos. Só me questiono como falarão e escreverão, a partir de agora, alguns que passam o tempo a injuriar os árbitros. Farão o mesmo com as árbitras?
Exige-se do Benfica a condenação explícita do sucedido, acompanhada de um pedido de desculpa formal. E aguardo também que as associações feministas e de vigilância contra a violência de género se pronunciem em termos inequívocos sobre esta inadmissível agressão machista. O facto de ter ocorrido em contexto desportivo não constitui atenuante: é agravante.
Disclaimer: este é um post que não tem a pretensão de ser isento.
Há temas sobre os quais não tenho hesitações, nem estados de alma. Entre eles contam-se a defesa acérrima dos direitos da mulher e do valor educativo e formador de carácter do desporto.
Desde a mais tenra infância que pratico desporto - ginástica, atletismo, natação, paraquedismo - que vou a estádios e competições desportivas. Tal como a música o desporto pode ser uma linguagem universal e ser inclusivo. E é de inclusão e de mulheres que quero falar.
Apesar das mulheres participarem em competições desportivas desde o século XVIII foi preciso esperar até 2012 para que estivessem representadas em todas as modalidades do programa olímpico. Apesar de serem cada vez nos estádios a imagem das adeptas ainda é a biblot ou de "hot girl" servindo um imaginário estereotipado e que perpetua a discriminação.
Mas a mudança está à distância de um querer, de uma vontade de mobilizar. Ser é fazer.
Aceitei integrar a equipa de Frederico Varandas e pensar a inclusão da mulher no desporto. Dia 17 de Julho, pelas 18.30, na sede de campanha, apresento o #we too, porque nós sportinguistas queremos ver mais treinadoras, mais atletas do sexo feminino, mais modalidades abertas a mulheres, queremos um sério combate ao assédio sexual no desporto, destaco ainda, entre outras medidas, a prevenção da violênciaem colaboração com escolas, associações de mulheres e associações de vítimas, e a abertura cursos de defesa pessoal para todas as mulheres independentemente de serem sócias ou adeptas.
Apareçam porque a causa é transversal e importa a todos.
Ali mais abaixo, em resposta a um comentário, afirmei que o meu presidente será o que for eleito e coloquei a questão na vertente masculina e feminina.
Este é o desafio que deixo às mulheres sportinguistas, que as há com capacidade de liderança como os homens: Que tal uma lista encabeçada por uma mulher? Deverá ser caso muito pouco comum a nível global, nos clubes de média e grande dimensão, que é o caso do nosso, pelo menos pelo "exército" de associados que apresenta e seria mais uma situação em que seríamos pioneiros.
Fica feito o repto, sem menosprezo por qualquer outra candidatura encabeçada por um homem, obviamente.
«(...) Em 1927 o Sporting teve, de facto, a primeira campeã: Estela de Carvalho. (...) Nascera em Lisboa em 17 de Junho de 1906. Seu pai era português, sua mãe era espanhola. Começou a particar sport aos 15 anos, iniciando-se na ginastica sueca, no Ginásio Club Português. “Aos 16 anos, ainda não conhecia os mais rudimentares preceitos da natação, entrei numa prova da milha interstícios do Ginásio. Levei no percurso cerca de uma hora e os dirigentes não ficaram satisfeitos com o resultado e resolveram não aceitar a minha inscrição para a Travessia do Tejo, no mesmo ano. Desgostosa com essa atitude, que vinha ferir em cheio a minha apurada sensibilidade, resolvi ingressar no Sport Algés e Dafunfo. Nesse clube me mantive três anos. Devido a pequenos incidentes que surgiram a propósito do Portugal-Espanha (...) resolvi abandonar o clube. (...) E assim, (...) surgiu, em 1925 no Sporting, passando a treinar-se na Doca de Alcântara, como os demais. E a ganhar todas as competições de rio que se disputavam, então, um pouco por toda a aparte, em Portugal.
E assim, (...) surgiu, em 1925, no Sporting, passando a treinar-se na Doca de Alcântara, como os demais. E a ganhar todas as competições de rio que se disputavam, então, um pouco por toda a parte, em Portugal.
As faca e as críticas...
De uma vez, em 1926, esteve à beira de uma proeza épica: ganhar a todos os homens, numa travessia do Douro, no Porto. “Seguia à frente, com o Cortez, ambos em luta pelo primeiro lugar. A certa altura, olho em redor de mim e não vejo o Cortez. Calculei que estivesse fora de combate e se tivesse deixado atrasar. E ia já de antemão contando com o primeiro lugar quando, ao chegar à meta, encaro com ele. Fiquei desolada. Fora o caso que ele se afastara de mim em busca de melhores águas e conseguindo encontrá-las fácil lhe foi vencer-me. Os barqueiros e outros marítimos que acompanhavam a prova queriam a todos o transe que eu ganhasse. Para isso não cessavam de me entusiasmar com toda a animação. Chegou a tal ponto o entusiasmo entre eles - que chegaram a puxar de facas uns para os outros, para aqueles que não estavam a meu favor...”
No ano anterior, naquelas mesmas águas do Douro, a maior tristeza da vida de Estrela, que para além de natação foi praticante de muito bom nível de esgrima, ténis e remo: “À frente marchavam António Soares e Alves Miguel [como ela do Sporting]. Foram os primeiros a ser desclassificados, por não cortarem a meta no sítio determinado. A mim, que vinha em quito lugar, entre tantos homens, sucedeu-me o mesmo. Depois do esforço titânico que realizara para dobrar aquela distância de oito quilómetros, não era justo que me desclassificassem por tão pouco. E então chorei, chorei, chorei... Chorei tanto e a tal ponto que um homem se chegou a lançar à água não fosse eu morrer afogada nas lágrimas que me corriam pelos olhos. Como compensação deram-me uma estatueta e uma medalha...”
Desgosto também por não ter tido a possibilidade de fazer a Travessia da Mancha. Em 1927, Estela acreditava que podia sonhar...
Em Portugal foi nadando rios, mais alguns anos, ganhando. Sempre com o maillot do Sporting, mas sendo mulher a Mancha talvez fosse ousadia demasiada. “Vou começando a ter receio de que me critiquem por com esta idade [21 anos!], nadar ainda. Também, criticam-me por tudo, não me admira que tal suceda...».
Um outro sinal dos tempos. Na edição de “Eco dos Sports” de 20 de Novembro de 1927, em que fizera tais confidências, na página que lhe fora reservada, havia ao fundo seis palavras que , malfadadamente, o tempo tornaria famosas e estúpidas: “Este número foi visado pela censura”»
In: Glória e vida de três grandes. A Bola, 1995, p. 50-51
«Aspirou a ser toureira, mas viria a consagrar-se no atletismo do Sporting Club de Portugal porque o Benfica lhe trocara o sexo, inscrevendo-a como Lídio...»
«Nasceu a 15 de Agosto de 1942, numa bucólica terreola das cercanias de Torres Vedras, chamada Dois Pontos. Aos dois anos ficou órfã de pai. Aos sete tinha fama de menina esgrouviada, sonhando ser... toureira. Manuel dos Santos era o seu ídolo e nas suas brincadeiras imaginava-se a matar touros. Menina e moça veio para Lisboa, para viver em casa da tia Belmira. Entrou para uma escola de música, para aprender a tocar acordeão. Passava as aulas que adorava a correr e saltar. O professor decidiu inscreve-la no Benfica(…). Até que um dia lhe surgiu pelo correio um cartão solicitando que se deslocasse ao Campo Grande para testes de atletismo. Eufórica, foi. Chegou e sentiu que causara espanto, sem sequer se perceber que fora convocada como... Lídio Faria. Disseram-lhe que, assim, não podia ser, que o Benfica não tinha atletismo feminino. Acabou por experimentar o Sporting. Tinha 17 anos. Entre 1959 e 1970, ano da sua despedida (com uma festa à futebolista, façanha de que nenhuma outra atleta se poderá ufanar), ganhou 30 títulos de campeã nacional em oito especialidades (100 metros, 200 metros, 400 metros, 80 metros barreiras, lançamentos do peso, lançamento do disco, 4x100 metros e pentatlo), sendo recordista nacional e ibérica em todas essas provas. Em 1964, durante um Portugal-Espanha, numa só tarde venceu cinco dessas provas e estabeleceu outros tantos «records» ibéricos. Um ano depois ganharia a prova do lançamento do peso nos Jogos Mundiais da Primavera, disputados no Rio de Janeiro.
(...) Receberia o Prémio Stromp para melhor atleta sportinguista de todos os tempos.»
In: Glória e vida de três grandes. A Bola, 1995, p. 198
A intérprete do Hino do Sporting festeja hoje mais um aniversário. Associamo-mos com alegria a esta data, deixando aqui uma grata e respeitosa vénia à grande Maria José Valério.
Enezenaide do Rosário da Vera Cruz Gomes, conhecida no mundo do desporto como Naide Gomes – ao que se conta, devido, por um lado, às dificuldades de pronunciar o nome e, por outro, ao facto de ele não caber nos marcadores electrónicos - é, sem margem para dúvidas, uma das maiores figuras da hIstória do Sporting Clube de Portugal. Qualquer vista de olhos, por mais distraída que seja, ao seu longo e riquíssimo currículo o confirmará, se é que alguém exige que tal juízo seja corroborado. Quantos atletas, mulheres ou homens, praticantes de atletismo ou de seja que actividade desportiva for, podem apresentar, nos anais do clube, um rol tão extenso de títulos, vitórias em diversas disciplinas, recordes nacionais, medalhas, internacionalizações, participações em competições internacionais, em jogos olímpicos e o mais que me estiver a escapar? Muito poucos, certamente.
A figura de Naide Gomes, no espaço do desporto português, resplandece de tal maneira que me considero dispensado de fazer uma apresentação desenvolvida do seu palmarés. Mesmo uma enumeração sumariada dos seus triunfos, medalhas e recordes seria demasiado longa para um texto deste tipo, pelo que, como tem sido hábito, remeto os mais interessados para sites especializados na matéria, como este, por exemplo.
Naide Gomes nasceu em S.Tomé, em representação de cuja selecção esteve presente, entre outras competições, nos Jogos Olímpicos de Sidney, nos Jogos Pan-Africanos, em Joanesburgo, e nos Campeonatos da África Central, nos Camarões, em que ganhou cinco medalhas. Tinha onze anos quando saiu de S.Tomé e já estava perto de fazer dezoito, ainda júnior, portanto, quando veio para o Sporting, onde começou a ser treinada por Abreu Matos. Só relativamente tarde optou definitivamente pelo salto em comprimento, prova que viria a celebrizá-la e na qual obteve os mais importantes triunfos da carreira, não tendo, no entanto, deixado os seus créditos por mãos alheias nalgumas outras disciplinas. Assim, foi, também, campeã nacional de salto em altura e dos 100m barreiras, tanto ao ar livre como em pista coberta. Começou pelas provas combinadas, onde obteve, igualmente, grandes êxitos, em Portugal e no estrangeiro, tendo sido campeã nacional de hepatlo. Em todas estas provas, Naide Gomes foi recordista nacional, ultrapassando marcas que, nalguns casos, já duravam há largos anos, tendo ainda, na companhia de Eva Vital, Sónia Tavares e Carla Tavares, as duas últimas também atletas do Sporting, batido, em 2009, o record nacional dos 4X100m. Mas, foi, de facto, principalmente no salto em comprimento que Naide adquiriu o direito a um lugar de eleição na história do Sporting Clube de Portugal. A partir de 2002, ganhou dezassete títulos nacionais desta disciplina, nove delas em pista coberta. Esta nossa grande atleta levou o máximo nacional até aos 7,12m, tendo-o batido, imagine-se, vinte e oito vezes ( 28, não é engano), catorze delas em pista coberta.
Em grandes provas internacionais, Naide Gomes, para abreviar e evitar um post gigantesco, obteve, ao ar livre, dois segundos lugares em campeonatos da Europa, em Gotemburgo, em 2006, e em Barcelona, em 2010, ambos no salto em comprimento, tendo sido quarta classificada no Mundial de Osaca, em 2007, e no de Berlim, em 2009, também no salto em comprimento. Em pista coberta as coisas correram melhor, Naide não foi perseguida pelo azar que a atormentou ao ar livre – nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, por exemplo, falhou a qualificação para a final do salto em comprimento, num ano em que atingira os 7,12m e em que fora, em Valência, campeã mundial de pista coberta – tendo conseguido dois títulos mundiais, em Budapeste 2004, no pentatlo, e, como já disse, em Valência 2008, e dois europeus, em Madrid 2005 e Birmingham 2007,os últimos três no salto em comprimento. Igualmente nesta disciplina, Naide Gomes foi vice-campeã mundial, em pista coberta, em Moscovo 2006 e em Doha 2010, e segunda classificada no Europeu de Paris, em 2011. Refira-se, ainda, que no pentatlo, em pista coberta, Naide foi também vice-campeã europeia no campeonato de 2002, em Viena.
Mais longe poderíamos ir se quiséssemos descrever exaustivamente a carreira de Naide, nem mencionei, por exemplo, o facto de ela ter sido vice-campeã mundial universitária em Izmir 2005. Mas, para o efeito, parece-me que basta. Os dados que apresento são mais do que suficientes para a elevar, como me propus, a um lugar de honra na história do Sporting Clube de Portugal. Estou, como é óbvio, a partilhar um sentimento comum a muitos e muitos sportinguistas, como pode concluir-se do facto de ter merecido já 10 Prémios Stromp, um número quase inacreditável.
Termino hoje esta série de posts sobre algumas grandes mulheres da vida do nosso clube, algumas mulheres que, permitam que repita o que disse no primeiro texto, dedicado a Lídia Faria, parece, às vezes, estarem a ser esquecidas e que, contudo, desempenharam um papel talvez decisivo na consolidação e propagação do sportinguismo e contribuíram de forma extraordinária para que muitos e muitos portugueses transmitissem aos seus filhos estes sentimentos e esta cultura desportiva, esta vaidade de ter participado na construção e crescimento de um clube com milhões de adeptos a partir, já lá vão mais de cem anos, da iniciativa de um pequeno núcleo de fundadores.
Referi um pequeno número de figuras, tendo eu, certamente, cometido injustiças com a exclusão de algumas outras. Haverá muitos nomes que poderia ter incluído na série, mas, como avisei no início, não pretendi mais do que mencionar os que me parecessem especialmente relevantes, aqueles que eu considerasse imprescindíveis em qualquer lista deste género. Atendendo à riqueza da história do Sporting, é certo que outros que se dediquem a esta tarefa terão escolhas diferentes, talvez muito diferentes, todas com tão boas razões como as que apresentei. O atletismo foi esmagadoramente representado nesta minha selecção, mas salientei, também, a ginástica e o ténis de mesa, desportos que, muito graças às desportistas cujas carreiras no Sporting me esforcei por pôr em evidência, contribuiram, de forma decisiva, para o ecletismo de que tanto nos orgulhamos. Aqui neste blogue ou em qualquer outro sítio, espero que apareçam outros nomes. Venham eles, que ideias e memórias de grandes cometimentos não hão-de faltar.
Embora, para o grande público, de forma quase sempre mais ou menos despercebida, a ginástica desempenhou ao longo da história do Sporting um importantíssimo papel na vida do clube. Esta modalidade, além, naturalmente, do seu peso como disciplina de base na preparação de muitas outras actividades desportivas, pôde constituir-se como um pólo fundamental da relação entre o clube e os sócios. De facto, secundada, especialmente, pela natação, a ginástica sempre proporcionou aos sportinguistas a possibilidade de uma efectiva prática do desporto, permitindo assim que o Sporting apresentasse e beneficiasse de uma intensa vida associativa, salutarmente alheia às preocupações com os êxitos ou os fracassos da sua equipa de futebol.
Dois nomes foram decisivos para a definitiva importância que a ginástica atingiu e mantém no Sporting: João Rocha, cujo impulso, principalmente no início do período que se seguiu ao 25 de Abril, fez com que os praticantes deste desporto atingissem um número da ordem dos milhares, cerca de 7 500 no início dos anos 80, e o Prof. Henrique Reis Pinto, uma figura extraordinária do clube e, muitas vezes, tão lamentavelmente esquecida pela generalidade dos sportinguistas.
Henrique Reis Pinto chegou ao Sporting em 1948 e por cá permaneceu durante 56 anos, até 2004, ano da sua morte. Apaixonado adepto do Sporting, homem com um currículo no clube que o torna numa figura de certo modo semelhante à de Mário Moniz Pereira, Reis Pinto, além da maneira empenhada e competente como tratou das coisas da ginástica e as trouxe para um patamar elevadíssimo de adesão popular, dedicou-se, também, ao basquetebol, voleibol, futebol e remo e foi preparador físico das equipas de futebol do Sporting que conquistaram o campeonato nacional, a Taça de Portugal e a Taça dos Vencedores da Taças, respectivamente, em 1962, 1963 e 1964. Henrique Reis Pinto foi ainda o grande responsável pela realização em Portugal, em 2003, da Gymnaestrada, um acontecimento desportivo, destituído de carácter competitivo, de relevância mundial. Foi ainda, por duas vezes, vogal da direcção do clube e desempenhou, ao serviço do Estado, funções como Coordenador Nacional do Desporto, Subdirector Geral dos Desportos e Director Geral dos Desportos e, exerceu, na Federação Portuguesa de Ginástica, os cargos de Director Técnico de Ginástica Geral, Membro do Comité Técnico de Ginástica Geral e Presidente da Direcção. O Prof. Reis Pinto foi, igualmente, representante do Ministério da Educação no Comité Intergovernamental da UNESCO, em Paris, e representou o Ministério dos Negócios Estrangeiros no Conselho da Europa, em Estrasburgo.
Uma carreira desta dimensão não podia deixar de ser abrilhantada com significativas honrarias, como foram, entre outros, os prémios e condecorações Leão de Ouro, atribuído pela Assembleia Geral do Sporting Clube de Portugal, em 1978, a Medalha de Mérito Desportivo, em 1982, a de Comendador da Ordem do Infante, atribuída pela Presidência da República, em 1982, o de Sócio de Mérito da Federação Portuguesa de Ginástica, em 1982, a Medalha Reconhecimento, pela União Europeia de Ginástica, em 1993, e o Colar Valor, Mérito e Bons Serviços, pela Federação Portuguesa de Ginástica, em 1995. Foi-lhe, igualmente, atribuído um Prémio Stromp, em 1966.
As palavras são como as cerejas e, onde eu pretendia estabelecer uma base para a modesta consagração, nesta série, de mais uma figura feminina da história do Sporting, vinda de fora do atletismo, quase acabei por dedicar o texto, exclusivamente, a mais um nome masculino dessa mesma história. Não que isso fizesse mal. Se não existisse uma conexão, alterava o título do post, centrava-o no Prof. Reis Pinto e escrevia outro sobre Avelina Alvarez. Mas não me parece que isso seja necessário. Esta grande atleta do Sporting foi uma excelente ginasta e numa época em que a modalidade, graças, em grande parte, a Reis Pinto, se afirmava como um pilar do clube, conseguiu ser, por três vezes consecutivas, campeã nacional individual, em 1979, 1980 e 1981, tendo estado presente, em representação de Portugal, nos Jogos Olímpicos de Moscovo. Em 1981, a sua importância como atleta do clube foi reconhecida com a atribuição de um Prémio Stromp, devendo salientar-se, ainda, que Avelina Alvarez constou do conjunto de 100 personalidades que fizeram parte da Comissão de Honra do Primeiro Centenário. Como se vê, Avelina Alvarez resiste com bravura à proximidade de Henrique Reis Pinto, erguendo-se como um nome valiosíssimo na história do Sporting Clube de Portugal.
Após uma breve incursão no ténis de mesa, na companhia de Madalena Gentil, regressemos ao atletismo e a um dos mais altissonantes nomes dos anais do Sporting Clube de Portugal e deste fabuloso desporto no nosso país:Teresa Machado. Não fora o esmagamento a que o futebol sujeita qualquer outra actividade desportiva em Portugal e escrever um texto sobre esta fantástica atleta seria bem mais exigente, já que obrigaria a um esforço suplementar de pesquisa e a um especial vigor da imaginação. Seria como escrever sobre Luís Figo, Cristiano Ronaldo, Mário Coluna ou Eusébio, saber-se -ia quase tudo sobre ela e eu seria forçado a procurar estes e aqueles detalhes mais incógnitos ou obscuros.
Assim, com a vida facilitada pelo desconhecimento geral de um nome que não está ligado ao futebol - não quero com isto dizer que o mal esteja radicado nos leitores com paciência para a leitura dos textos que tenho escrito para esta série, ele está, antes, no clima criado, acima de tudo, pela imprensa desportiva, cujos critérios mercantilistas, muito mais do que quaisquer outros, se é que estes existem, trucidam implacavelmente tudo o que escape ao dia a dia em redor do sacrossanto e adorado esférico - basta-me fazer uma resenha dos triunfos e resultados obtidos por esta nossa inacreditável atleta para que qualquer interessado fique, como eu, imediatamente convencido da elementar justiça de a colocar entre as grandes figuras da história do Sporting Clube de Portugal.
Teresa Machado veio para o Sporting aos 17 anos de idade, em 1986, ano em que, representando o Galitos - centenário clube e relevantíssima instituição aveirense, em que vale a pena pôr os olhos - foi pela primeira vez campeã nacional de lançamento do disco. Até ao final da sua carreira, foi campeã nacional de peso e disco por cinquenta e três vezes (53!), dezasseis vezes no lançamento do disco, dezoito no do peso e dezanove no do peso em pista coberta. No decurso dos dezassete anos em que representou o Sporting, entre 1986 e 2003 - a excepção foi 1994, ano em que os muitos problemas financeiros que afectaram o clube a levaram a praticar o atletismo ao serviço da Junta de Freguesia de São Jacinto - Teresa Machado conquistou quarenta e quatro títulos nacionais. A lista das suas vitórias, recordes nacionais e participações em competições internacionais não pode ser minimamente exaustiva num texto deste género. Aconselho, por isso, os mais interessados a recorrerem à WikiSporting, cuja involuntária ajuda muito agradeço, para se porem a par de um historial de tirar a respiração.
Sem, portanto, querer submeter-me e aos leitores a tarefa tão extenuante, recordo, apenas, que Teresa Machado, além da conquista dos campeonatos nacionais acima referidos, participou nos Jogos Olímpicos de Barcelona, Atlanta, Sidney e Atenas, em sete Campeonatos do Mundo, em três Campeonatos da Europa, em cinco Campeonatos Ibero-Americanos, em cinco Challenges e Taças da Europa de Lançamentos, em dezoito Taças da Europa (em Peso e Disco), num Campeonato do Mundo de Juniores e num Campeonato da Europa de Juniores. Tudo isto,é claro, sem falar de uma grande série de importantes eventos desportivos internacionais que, no currículo de qualquer atleta, serão mencionados com justificadíssimo alarde.
Se nos campeonatos Ibero-Americanos Teresa Machado nos brindou com excelentes vitórias, tendo ganho a medalha de ouro do lançamento de disco em 1990, em Manaus, a medalha de ouro, também do lançamento do disco, em 1994, em Mar del Plata, a medalha de ouro, ainda do lançamento do disco, em 1998, em Lisboa, e a medalha de bronze do lançamento do peso, igualmente em 1998, em Lisboa, já nos Jogos Olímpicos e nos Campeonatos do Mundo pareceu, quase sempre, atingida por síndrome idêntica à que travou a, mesmo assim, extraordinária carreira internacional de outro dos maiores nomes da história do Sporting, o do inesquecível Fernando Mamede. Apesar desta limitação, Teresa Machado conseguiu um 10º lugar nos Jogos Olímpicos de Atlanta e um 11º nos de Sidney, um 6º no Mundial de Atenas e um 10º no de Paris e, ainda, um 7º e um 9º lugares nos Europeus de Munique e Budapeste, respectivamente. Repare-se que estamos a falar dos lançamentos do disco e peso, provas de enorme dificuldade técnica que, muito mais do que hoje, levantavam grandes problemas aos atletas nacionais.
Se nos propusermos falar de recordes nacionais, salientemos, não nos preocupando com os tantos e tantos que Teresa Machado bateu ao longo da sua carreira e já passaram à história, os que ainda estão em vigor: peso, 17,18 m, em 1996; peso em pista coberta, 17,26 m, em 1998; disco, 65,40, em 1998; peso, sub 23, 16,46, em 1991; peso, juniores, 15,54, em 1988; peso em pista coberta, sub 23, 16,41, em 1990 e peso em pista coberta, juniores, 15,69, em 1988. Repito, trata-se de recordes que ainda perduram, como os mais desconfiados ou incrédulos podem verificar no site da Federação Portuguesa de Atletismo. Sublinho, já que estou a falar em recordes nacionais, que Teresa Machado também chegou a ter o do lançamento do martelo. Quase me esquecia de o mencionar, por aqui se vendo a importância que mais um ou outro máximo vem a ter na avaliação final da carreira da atleta.
A vida de Teresa Machado dava um filme. Os interessados podem vê-lo no site Atletismo Estatística, em que Manuel Arons de Carvalho desenha com brevidade a história desportiva da nossa grande atleta. Como conta este jornalista, em toda a sua carreira, aqui se incluindo os dezassete anos no Sporting, Teresa Machado manteve-se sempre em Aveiro, onde, inicialmente trabalhava numa fábrica de confecções, sem nunca deixar de ser orientada pelo seu primeiro e único treinador, Júlio Cirino. Chegou a treinar-se num jardim público, a tomar cuidado com os seus utentes, treinou-se num parque de estacionamento, com Júlio Cirino a dar-lhe orientações pela janela do seu escritório, e conseguiu, finalmente, que lhe cedessem um areal vedado, ao pé da lota do peixe da Gafanha da Nazaré.
Por motivos que desconheço, Teresa Machado, ao fim de dezassete anos no Sporting, acabou por ir parar aos Açores, onde, durante quatro anos, representou o Clube Operário Desportivo. No final da carreira, ainda esteve um ano no F.C. Porto, ao serviço do qual, já com quarenta anos, ainda foi a terceira melhor portuguesa no lançamento do disco.
Não tenho quaisquer dúvidas sobre o que está reservado, na história do Sporting Clube de Portugal, para esta excepcional desportista, que foi distinguida, entre outras honrarias, com dois Prémios Stromp, em 1988 e 1997. Um lugar dos mais altos, como é óbvio.
Conceição Alves, mais um nome gigante na história do Sporting e do atletismo português. Tal como as atletas a que foram dedicados os números anteriores desta série, Conceição Alves foi uma desportista que representou o Sporting a um nível elevadíssimo, muito difícil de atingir por qualquer atleta de qualquer modalidade, como facilmente concluiremos se prestarmos uma pequena atenção aos extraordinários resultados que obteve no decurso da sua carreira, tanto a nível individual como integrada em equipas do clube.
Conceição Alves, com a sua irmã gémea Manuela, também nossa grande atleta, para quem está reservado um próximo número destas evocações, veio para Portugal, oriunda de Moçambique, onde se distinguia com as cores do Desportivo de Lourenço Marques, e ingressou no Sporting em 1974, ano em que logo começou a dar nas vistas no salto em altura, disciplina em que viria a fazer-se notar, para a época e tendo em conta as limitações do atletismo português, num plano quase estratosférico. Naquele tempo, em que a especialização começava, no atletismo, a dar, entre nós, os primeiros passos, Conceição Alves conseguiu, ao longo de muitos anos de carreira, resultados excepcionais numa notável variedade de disciplinas. Muito sinteticamente, deixando, como tenho feito, a quem quiser uma relação mais pormenorizada, a indicação deste sítio, a que agradeço os elementos a seguir referidos, podemos destacar:
- foi campeã de Portugal dos 100 metros barreiras em quatro ocasiões, batendo várias vezes o respectivo record nacional;
- foi três vezes campeã de Portugal de salto em altura;
- bateu 12 vezes o record nacional da disciplina, fazendo progredir a respectiva marca de 1,61 m até 1,77 m, tendo esta última permanecido inultrapassada durante 9 anos;
- foi campeã de Portugal de salto em comprimento em duas temporadas, tendo também obtido três vezes o respectivo máximo nacional;
- foi, uma vez, campeã nacional do lançamento do peso;
- tendo-se dedicado, atendendo ao seu ecletismo, às provas combinadas, Conceição Alves foi, ainda, campeã nacional e recordista nacional do pentatlo e, depois, do heptatlo
e
- em pista coberta, obteve muitos títulos e máximos nacionais nos 60 metros barreiras, salto em altura e salto em comprimento.
Isto é apenas o essencial, o mínimo que podemos salientar na sua carreira, nem sequer refiro os contributos que teve para os muitos títulos colectivos do Sporting. Acrescentando uma especialidade às que acima menciono, poderíamos, por exemplo, dar o merecido relevo à sua participação em duas equipas do clube que venceram campeonatos de Portugal da estafeta de 4x100 metros. E poderíamos, também, destacar as muitas competições em que participou em representação do país.
Estes resultados e uma carreira devotada ao clube parecem-me mais do que suficientes para que incluamos Conceição Alves entre as grandes figuras da história do Sporting. Podemos ter a esperança de que este nome enorme não seja facilmente esquecido, tanto mais quanto tivermos em conta que lhe foram atribuídos um Prémio Stromp, em 1979, e, mais recentemente, em 2012, um prémio Rugidos de Leão. Mas é bom que, de vez em quando, relembremos a figura inesquecível de Conceição Alves entre as de grandes atletas do clube, praticantes de muitas modalidades, a que devemos a grandeza do Sporting Clube de Portugal.
Pelo seu contributo para a história de um Sporting com a dimensão que os seus fundadores sonharam e com a grandeza que nós, sportinguistas, queremos que se mantenha, uma calorosa saudação, de sincero reconhecimento, a Conceição Alves.
Outra grande atleta do Sporting, que competiu em companhia de Lídia Faria, Eulália Mendes e Francelina Anacleto, a que me referi nos números anteriores, foi Céu Lopes. Excelente praticante da velocidade prolongada, Céu Lopes foi, entre as mais notáveis atletas portuguesas, uma das primeiras ou mesmo a primeira a não enveredar por uma abordagem generalista do atletismo, dedicando-se, praticamente em exclusivo, a uma especialidade.
O currículo de Céu Lopes é suficientemente eloquente, dispensando bem mais apresentações ou elogios. Resumidamente: vencedora, em 1968, fazendo parte da equipa do Sporting, do campeonato nacional da estafeta de 4x100 metros; cinco vezes consecutivas campeã nacional de 800 metros, entre 1968 e 1972; três vezes consecutivas campeã nacional de 400 metros, entre 1968 e 1970; duas vezes campeã nacional de 1500 metros, em 1971 e 1972, e vencedora, integrando sempre equipas do Sporting, por quatro vezes consecutivas, entre 1969 e 1972, do título nacional da estafeta de 4x400 metros. Foi recordista nacional, tendo superado muitas vezes as respectivas marcas, de 400 metros, 800 metros, 1500 metros e 4x 400 metros, sendo que, no ano de 1972, chegou a deter simultaneamente todos estes máximos. Também em 1972, foi a primeira atleta do Sporting a ganhar o Campeonato Nacional de Corta-Mato Feminino.
Lembro-me bem de, jovem, acompanhar o atletismo do Sporting e de ficar rendido às proezas e elegância de Céu Lopes, que, tanto quanto consigo lembrar-me, somava à qualidade dos seus resultados uma dimensão estética da técnica de corrida que, ainda mais, a valorizava. Não sei bem porquê, esta nossa grande atleta, pelo que posso julgar a partir das minhas conversas com outros devotos do clube e do atletismo e de algumas leituras, nomeadamente noutros blogues, não terá ficado tão ligada às memórias de muitos sportinguistas como aquelas a quem dediquei os três primeiros textos desta série. Pura injustiça, claro, se é que isto é mesmo verdade. O breve resumo acima exposto fala por si e não deixa margem para dúvidas sobre o nosso dever de prestar uma condigna homenagem a Maria do Céu Lopes, destacando o seu nome, com o devido relevo, ou seja a letras de ouro, como ela bem merece, na história do Sporting Clube de Portugal.
Francelina Anacleto, com Lídia Faria e Eulália Mendes, sobre quem escrevi nos dois números anteriores desta série, formou um notável trio, em larga medida responsável pelo êxito e hegemonia do atletismo feminino do Sporting nos anos sessenta e setenta do século passado. Francelina Anacleto, que competiu entre 1960 e 1967, destacou-se, fundamentalmente, nas provas de velocidade e do salto em comprimento. Embora favorecida, em comparação com os dias de hoje, pelas circunstâncias próprias de uma época na qual a especialização estava ainda longe de se tornar numa realidade, Francelina obteve, também, excelentes marcas nos 400m, cujo recorde nacional bateu por duas vezes em 1961, após oito anos em que perdurou a marca feita por Georgette Duarte, extraordinária atleta do Belenenses e um dos maiores símbolos do grande clube azul, e no pentlato, de que foi campeã em 1965.
No plano individual, a que haverá que juntar os títulos colectivos que alcançou como representante do Sporting, assinale-se, a par de muitos outros também relevantes, o facto de ter sido campeã de Portugal por quatro vezes nas disciplinas dos 100 metros e do salto em comprimento e por duas vezes na dos 200 metros. Francelina Anacleto fez, igualmente, parte da selecção nacional de 4x100 m, inteiramente preenchida por atletas do Sporting, que, pela primeira vez, em 1964, baixou dos 50 segundos nesta prova de estafetas, fixando um recorde que se manteve por um período de seis anos. Também o seu último recorde do salto em comprimento, que conseguiu por oito vezes entre 1961 e 1965, teve cinco anos de vida, sendo já velho de quase vinte e um anos o máximo nacional dos 100 metros que a atleta bateu em 1961. Muito mais vitórias e marcas de grande valor poderia sublinhar, como os interessados confirmarão, entre outras fontes, na WikiSporting, a cuja preciosa ajuda, mais uma vez, recorro. Só no que ao número de recordes nacionais individuais respeita, Francelina registou por sete vezes o de 100 metros, cinco vezes o de 200 metros, oito vezes o do salto em comprimento e duas vezes o dos 400 metros. A estes haverá ainda que somar os das estafetas e os que foram obtidos em pista coberta. E bem mais longe poderia certamente ter ido esta nossa grande desportista, se não se tivesse retirado, em consequência de grave lesão, com a idade de 22 anos. Em tão pouco tempo, até, repito, aos 22 anos, Francelina Anacleto marcou brilhantemente, como muito abreviadamente descrevi, o atletismo português e a história do Sporting.
Outras coisas acabaram por ficar em casa. Francelina Anacleto, a quem presto a minha homenagem e a quem devemos agradecer todo o muito que fez pelo engrandecimento do Sporting, casou com outro nome mítico do atletismo nacional e um dos maiores atletas de sempre do clube, Tadeu de Freitas, grande declatonista e saltador de triplo salto e de salto em comprimento, assim confirmando, com exuberância verde e branca, que les beaux esprits se rencontrent. Os dois, na via empresarial que seguiram após o termo das suas carreiras no atletismo, criaram uma marca de equipamentos desportivos, Tadeu e Francelina, mais tarde Saillev, que, a certa altura, chegou a fornecer equipas do Sporting.
Em 1964, foi atribuída a esta nossa grande atleta a Medalha de Mérito Desportivo do Sporting Clube de Portugal.
P.S. Já depois de publicados os dois textos anteriores, dedicados a Lídia Faria e Eulália Mendes, foi-me chamada a atenção para a ambiguidade do pronome nossa, utilizado no título genérico desta série. Reconhecendo o risco dessa duplicidade e embora nunca me tenha passado pela cabeça, como me parece óbvio, a intenção de ironizar sobre o assunto, decidi, para dissipar possíveis equívocos, alterar esse título, que passará a ser Elas na história do Sporting. Para o efeito, corrigi já os dois primeiros números.
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