Contratar um treinador sérvio desempregado - sem um título de campeão no currículo, fluente apenas em italiano e servo-croata, desconhecedor em absoluto do futebol português - a cinco dias de uma assembleia geral do clube convocada para a sua própria destituição (que não tardaria a consumar-se), foi um dos actos mais danosos que tenho guardados na minha longa memória de sportinguista. "Como se o Edifício Visconde Alvalade fosse o cofre-forte do Tio Patinhas", escrevi aqui nesse mesmo dia.
Com esta tresloucada decisão, a última do seu mandato, Bruno de Carvalho lesou os cofres leoninos, transferindo para quem lhe sucedia o ónus de ficar com um técnico que não escolhera, pagando-lhe quatro milhões de euros por temporada, ou denunciar um generosíssimo contrato com validade de três anos, até 2021, sujeitando-se a desembolsar uma choruda indemnização por quebra unilateral do vínculo laboral entretanto assumido.
Sousa Cintra, sucessor de Carvalho, optou pela segunda via. Frederico Varandas, sucessor do sucessor de Carvalho, viu-se agora forçado a pagar - num momento em que o clube deixou de ter receitas devido aos brutais efeitos da pandemia que nos fustiga há dois meses. Cerca de três milhões de euros acabam de sair de Alvalade para a conta bancária do senhor Mihajlovic, que já nem deve lembrar-se da localização do nosso estádio.
Espero que o novíssimo milionário ofereça ao presidente destituído um opíparo jantar regado a champanhe: nada é tão bonito como um gesto de gratidão.
Sobre a questão da disputa judicial com Sinisa Mihajlovic há que dizer o seguinte:
1 – Em primeiro lugar o Sporting deve acatar a decisão e cumprir com o pagamento de 3 milhões de euros a que foi condenado. Há que ver as coisas pelo lado positivo, o treinador sérvio reclamava 11 milhões, não tendo conseguido sequer metade da pretensão.
2 – Bruno de Carvalho é parcialmente responsável, por ter contratado um treinador a uma semana da AG de destituição. Uma vez mais, letal ao Sporting.
3 – Sousa Cintra é o principal responsável ao ter ignorado o parecer jurídico do clube. Bastaria ter esperado 4 dias e tomado a mesma decisão. Não posso ignorar as circunstâncias em que a CG exerceu o curto mandato, mas ainda assim, algumas dossiers ficaram muito aquém do exigível. Neste caso esbanjámos 3 milhões, com Demiral seguramente muitos mais.
Para concluir, enquanto sportinguista fico satisfeito que o treinador sérvio nunca tenho dirigido a nossa equipa de futebol e desejo que os seus admiradores jamais voltem a ter qualquer palavra a dizer sobre o destino do Sporting, porque em rigor, não são as qualidades técnicas ou tácticas do treinador do Bolonha que apreciam, querem mesmo é regressar a um passado de má memória do qual nos libertámos a 23 de Junho de 2018. Para os letais, quanto pior, melhor, buscam cavalgar a natural insatisfação dos sócios e adeptos perante a actual situação do clube. Mas não se iludam, acreditamos ser possível mudar, encontrando alternativas no clube, que por ser uma grande instituição tem muitas soluções. Mas para ser absolutamente claro e inequívoco, por mais críticas que faça e não tenho poupado, à actual direcção, se fosse obrigado a escolher entre o presente e o passado, sem dúvida ou hesitação, escolheria o presente.
A multa ao Sporting foi decretada pelo Tribunal Arbitral do Desporto e não é passível de recurso. O Clube sofreria consequências graves se não indemnizasse o sérvio, por causa das regras do fair play financeiro.
Segundo noticia o Record, tudo isto poderia ter sido evitado caso a Comissão de Gestão, presidida por Sousa Cintra, tivesse esperado quatro dias para despedir Mihajlovic. A decisão foi anunciada a 27 de Junho de 2018 quando, para evitar indemnizações, deveria ter ocorrido a 1 de Julho, data em que começava o contrato e respectivo período experimental. Mihajlovic estava a treinar apenas oficiosamente ao serviço do Sporting quando Cintra tomou aquela decisão.
Bruno de Carvalho precisava desesperadamente de um treinador. Para tentar fazer um brilharete na assembleia geral do dia 23 - a mesma sobre a qual foi dizendo, primeiro, que jamais se realizaria e, depois, que não teria validade.
Após as recusas de Sá Pinto, Scolari, Mano Menezes, Paulo Sousa e Miguel Cardoso, procurou um técnico que estivesse no desemprego e sem perfil de campeão.
A coisa tornava-se mais fácil.
Conseguiu um desempregado que nunca foi campeão.
Mas ofereceu-lhe um contrato milionário, de três anos, implicando para a SAD um esforço financeiro de 12 milhões de euros. Isto enquanto enfrentava um processo de destituição cujo desfecho, mais que provável, foi aquele que acabou por acontecer. Sem a prudência que deve acompanhar os actos de qualquer gestor na celebração de contratos plurianuais.
Não aprendeu nada com a fracassada contratação de Jorge Jesus. E Jesus, ao menos, tinha três campeonatos no currículo quando chegou a Alvalade. Ao contrário de Mihajlovic, que aos 49 anos nunca conseguiu melhor do que um sétimo lugar. Nada inspirador, como carta de recomendação.
Com a SAD leonina a atravessar sérias dificuldades financeiras que já nem o maior propagandista do carvalhismo consegue ocultar, e sabendo que está a dias de ser destituído pelos sócios do Sporting a quem tem feito tudo para silenciar a voz, traz para Alvalade um treinador que não regista um só título de campeão no seu currículo. Ao contrário do que tinha feito com Marco Silva e Jorge Jesus, desta vez não lhe exige que vença o campeonato, o que não deixa de ser sintomático sobre a falta de ambição deste homem que, numa das suas habituais bravatas de miúdo num pátio escolar, jurava em tempos demitir-se se não vencesse pelo menos duas vezes o campeonato nacional nos quatro ano seguintes.
Não contente com isto, proporciona ao servo-croata um contrato de longa duração - nada menos que três anos, sabendo muito bem que onerará os depauperados cofres leoninos caso ocorra uma rescisão unilateral, de resto mais que previsível atendendo ao percurso profissional do treinador em causa. E vincula a SAD a um insuportável ónus financeiro ao pagar-lhe quatro milhões de euros por época, o que faz deste técnico sem títulos o mais bem remunerado do futebol português.
Como se o Edifício Visconde Alvalade fosse o cofre-forte do Tio Patinhas.
Encurralado como nunca, ensaia novas e mais danosas fugas para a frente. Já em desespero, por pressentir que o chão está a fugir-lhe debaixo dos pés.
Não invejo a tarefa do sucessor: quando chegar o momento de verificar as contas, uma a uma, saberemos todos qual a extensão global dos danos.
1. Surpreende-me que Bruno de Carvalho não vá à Assembleia-Geral, afirmando que está suspenso de sócio, e que continue a actuar como presidente do Sporting, neste caso esquecendo que está suspenso do cargo. É possível que tenha sido suspenso de sócio, ou disso informado - o que, a ter acontecido, será mais uma das incongruências saídas da gaguez dos órgãos dirigentes do clube. Mas dá-me a sensação que há aqui um caso típico de malandrice, aquilo dos dois pesos e duas medidas: "À assembleia não vou, estou suspenso de sócio; sou presidente, posso contratar um tipo para os próximos três anos". Enfim, mais uma brunice ...
2. Mihajlovic chega e assina por três anos. Francamente, acho um pouco desajustado, imprudente até. Ok, vamos pensar como um defensor de Bruno de Carvalho: ele é o presidente, democraticamente eleito, tem direito e dever de trabalhar e preparar a próxima época. Mas é verdade que no próximo sábado (4 dias) há uma assembleia-geral que o pode destituir. A assembleia é uma "golpada"? Poderá ser, mas foi o tribunal que mandou. Não seria mais prudente assinar o contrato no domingo? A bem do Sporting (e de hipotéticas indemnizações que possam vir a ser pedidas)? Ok. O Bruno é o maior, os verdadeiros sportinguistas não discutem as suas decisões?
3. Mihajlovic chega e assina. Não cria, até pelo contexto, grande ânimo. Mas logo é chamado de fascista, racista e machista. Até por associação com as atitudes autocráticas do actual presidente. Vamos lá a ver, as críticas só são produtivas se forem ponderadas. Proponho que se leiam estes dois artigos sobre o homem: Artigo de 2003. E outro artigo, de 2013. Ele não é uma flor de estufa, certo. Mas tem contexto: nascido jugoslavo, filho de sérvio e de croata (um casal "misto", como tantos na Jugoslávia). Até por razões da sua situação profissional aquando da explosão da terrível guerra assumiu-se sérvio. A família, a tal "mista", estava encerrada num local croata, cercada pelos terríveis combates. Um chefe de guerra, sérvio, amigo de amigo e seu admirador, foi-lhe evacuar os parentes da zona. Ele ficou amigo e grato. Eu nem estou a tecer loas ao novo treinador, mas conviria ter algum contenção quando se acusam as pessoas. Principalmente quando nada ou pouco se sabe sobre o que elas passaram - já agora, digo eu que por lá andei a trabalhar naqueles tempos, as pessoas por cá têm uma ideia muito serbiófoba e muito croatófila do que se passou na guerra na ex-Jugoslávia. Sendo certo que ambas as partes faziam coisas horríveis. Por efeito da (inconsciente) adesão aos católicos e germanófilos croatas contra os ortodoxos e eslavófilos sérvios. Guardem lá o argumento do "fascista" até ele fizer alguma que o provoque.
Outra é que é racista. Insultou Patrick Vieira. Bem, "bocas" dentro de campo são muitas, e naquele tempo ainda seriam mais. E, já agora, não só adeptos como jogadores o chamam "cigano". Não será então também de o chamar "vítima de racismo". E a outra é que é machista, disse que as mulheres não percebem de futebol. Crime? Disse-o quando a mulher de um seu ex-jogador o veio criticar. Respondeu assim, pondo-a no sítio devido. Vamos lá com calma nas críticas.
Estou a gostar dele? Não. Nada. O sacana chega a Lisboa, no meio desta confusão no clube. Dramática para os adeptos, extremamente ansiosos. No aeroporto os jornalistas acercam-se dele e o homem responde "venho às compras"? A gozar connosco? A mandar bocas aos sportinguistas, através dos jornalistas, a menosprezar o nosso interesse, a nossa urgência de novidades? Isso sim, a falta de respeito pelo "Universo Sporting" é que é, e muito, criticável. Começou muito mal - com o "pé esquerdo" diria, não fosse ele canhoto.
4. Vai haver uma assembleia. Entre os que leio e com quem falo há a sensação de que a direcção cairá por voto dos associados. Não estou tão seguro. Recordo que o ano passado BdC foi eleito nas maiores eleições de sempre com 86%. E que ganhou uma concorridíssima assembleia-geral em Janeiro passado com cerca de 90% de votos. Nestas coisas há muito a tendência de avaliarmos o real pelo naco do real que temos debaixo do nariz. Os meus amigos sportinguistas estão avessos ao BdC, os meus co-bloguistas também. E grande parte dos leitores e comentadores deste blog também parecem ir nesta linha: o número de leitores do blog não para de aumentar. Mas os comentários dos apoiantes de BdC reduziram-se muito. Mas isso pode significar que foram pregar para outra freguesia (secção). E decerto que os amigos de outros gostam do BdC. E a assembleia não será apenas preenchida com os meus amigos sportinguistas e os meus co-bloguistas. Diz-se até, rumores, que haverá já excursões de apoiantes de BdC e que se vestirão de branco, para firmar a sua organicidade. Porventura serão boatos, mas sinaliza o impacto desta assembleia.
Há um ponto que julgo importante. Sei que escrevê-lo vai levar a que muitos passantes me digam "elitista" ou croquette. Avanço já que não sou: cresci nos Olivais, bairro muito peculiar em Lisboa, vivi 20 anos em África, em Maputo os arrumadores de carro, furiosos porque eu não lhes pagava, chamavam-me "maguerre" ("branco do mato", "tuga do mato", a velha figura do cantineiro, o que cá poderá ser dito por "rústico", "parolo"), a minha própria (infelizmente ex-)mulher me dizia que eu cada vez estava mais rude. E praguejo como o caraças, também no meu blog e sou acusado de "violência verbal" no meu mural de FB (por razões políticas, não da bola). Portanto fica já avisado quem venha aqui comentar chamando-me "croquette" que o mandarei, em puro e explícito vernáculo, não ter nascido. Não me importando que o blog seja colectivo. Gosto muito mais de croquetes do que de coiratos, mas isso não faz de mim um "queque", nem nunca fez.
Qual é o ponto? Tenho visitado a página-FB do Bruno e outros sítios onde abundam os seus apoiantes. Ainda há imensa gente a apoiá-lo. É até surpreendente, com tantos dislates que vem cometendo nos últimos meses. Passados 35 anos o grande presidente João Rocha ainda é criticado pelo erro histórico de ter perdido Paulo Futre. Este BdC desbarata a equipa sénior do clube e ainda é apoiado ...! A questão é simples e ele potencia-a muito bem, no seu "contra tudo e contra todos", acossado - como na recente entrevista à SIC. Que alguns não gostaram mas que me pareceu excelente. Para ele, claro, na sua teatralização de personagem vítima de uma conspiração generalizada.
Há, neste momento do clube, um conflito de classes. Lendo os seus inúmeros apoiantes (alguns podem ser perfis falsos mas nem todos o serão), o que é imensamente notório é o paupérrimo domínio do português escrito. É avassalador. Eu não digo que quem faz erros ortográficos (ou de sintaxe) tem menos direitos do que quem os não faz. (Até porque também os faço). O que digo é que quem faz imensos erros ortográficos lê muito pouco, tem menos informação (as palavras aprendem-se lendo-se) e reflecte menos sobre a informação que colhe (ouve-se a correr na TV e na rádio e ... pimba, já se sabe). O exemplo que meto no título do postal é típico, li-o num comentário hoje aqui, um furioso defensor do Bruno falando de um qualquer "chenófabo" - é a ditadura da fonética coligada com o radical exílio da leitura. É, desculpar-me-ão a franqueza, a ditadura da ileitura. Dos discursos de gente com escassíssimo "capital cultural".
Quem faz erros pensa pior? Não obrigatoriamente. Mas tem menos artefactos para pensar o real. O que este paupérrimo português escrito praticado por tantos dos apoiantes do BdC - cada período, cada borregada - mostra, ou aparenta mostrar, uma clivagem sociológica dentro do clube. Há neles a ideia de que com o "Bruno" o clube "é nosso" (é deles). Não dos ricos, dos doutores, dos "croquettes". Mas deles. E esse é o "sucesso" suficiente. Já não é particularmente relevante se vai ganhar taças ou troféus. A grande Taça, a grande Liga, o grande troféu é o clube ele mesmo. E como tal toda a estratégia brunista, de se afirmar e mostrar acossado por "tudo e todos", por todos os malvados poderes que dão cabo da vida das pessoas (a EPAL, a EDP, a EMEL, as finanças, o Costa, os não-Costa, o BES bom e o mau, o poder angolano e os empresários globalizados, a AutoEuropa e isso) e pela imprensa que apoia e depende desses poderes (a CNN, a Fox, a Cofina, a Al-Jazeera), é muito produtiva. Reforça o sentimento de osmose entre a base social que se sente fodida pelo mundo todo e o presidente que julgam que todo o mundo quer foder.
Distraiam-se, e vão ver quem ganha. Na assembleia-geral. E depois da assembleia-geral.
(Para quem se incomodar com os "palavrões" recordo que nunca estive num recinto desportivo, fechado ou aberto, onde não se dissessem, e com imensa profusão, estes e outros. Até nos campeonatos de xadrez.)
Quando soube disto, pensei logo: “Se algo pode dar errado, dará”. Sinisa Mihajlovic assinou por três anos, com um contrato que lhe foi estendido por um presidente que já não o é e que daqui a umas semanas pode mesmo pertencer ao passado do SCP. Assim esperamos.
É preciso pôr cobro rapidamente a esta deriva populista. Imaginam o nosso clube com Bruno de Carvalho (na presidência do clube e da SAD), Sinisa Mihajlovic (como treinador) e Mário Machado (na Juve Leo)? Eu não. É preciso explicar porquê?
Sempre gostei da escola e dos treinadores da ex-Jugoslávia, quer pelo futebol que colocam nas suas equipas, quer pela sua disciplina. Mirko Jozic foi um treinador que passou pelo Sporting em 1998/1999. Foi um ano em que, talvez mais do que nunca, o Sporting foi completamente roubado pelas arbitragens…arbitragens incríveis que se sucediam jogo após jogo e que levaram ao luto pela verdade desportiva (é bom recordar estas coisas, para todos aqueles que se esquecem rapidamente destas vergonhas). Apesar disso, o Sporting, com uma equipa bastante jovem, foi preparado para o título da época seguinte por este homem, que conseguiu pôr a equipa a jogar o melhor futebol que já o vi jogar desde que me lembro, muito à frente da propalada era Peseiro, sendo traído pelas arbitragens e excessiva juventude e inexperiência da equipa.
Só espero que Mihajlovic (e aqui concordo com esta escolha de Bruno de Carvalho...) ponha o Sporting a jogar como Mirko Jozic conseguiu. Se o conseguir, vamos ter equipa, acreditem.