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Este está a ser o campeonato do mundo dos guarda-redes. Ochoa, do México. Bravo, do Chile. Navas, da Costa Rica (virá mesmo para o Porto?). Buffon, de Itália. M'Bolhi, da Argélia. Neuer, da Alemanha. Até Júlio César, do Brasil (quando um guarda-redes brasileiro é considerado o melhor do jogo numa fase final de um Campeonato do Mundo isso não é nada lisonjeiro para o escrete canarinho).
Mas nenhum tão bom como Tim Howard, um herói de carne e osso no desafio que esta noite opôs a Bélgica aos Estados Unidos. Uma exibição histórica em que foi batido o recorde de defesas por parte de um guarda-redes em meio século de mundiais: aos 90 minutos regulamentares já tinham sido doze. Com as redes norte-americanas mantidas intactas.
No final, foram registadas dezasseis.
A Bélgica pressionou muito - no primeiro tempo sobretudo pelos pés da sua estrela, o extremo-esquerdo Hazard - mas esbarrou por sistema na barreira defensiva dos EUA, de que o guardião titular do Everton foi expoente máximo. Como se os 35 anos não pesassem já nas pernas de Howard. E pelos vistos não pesam mesmo.
Um exemplo de tenacidade e resistência que deve ser mencionado a todos quantos se apressaram a ridicularizar o empate conseguido pela selecção portuguesa perante esta equipa adversária, como se fosse o obstáculo mais fácil de superar. Não era, como bem confirmámos hoje frente à Bélgica, tantas vezes apontada como uma das favoritas à conquista do Campeonato do Mundo. Foram precisos noventa e tantos minutos para os belgas marcarem o primeiro golo, graças ao inegável cansaço físico dos norte-americanos.
Ao golo seguiu-se logo outro, mas os EUA ainda reduziram - tudo no prolongamento, um dos mais emocionantes de que há memória em torneios deste género, confirmando a excelência deste Mundial do Brasil.
Os belgas suaram imenso para levar os americanos de vencida. Foi justa, a recompensa da selecção mais jovem do Campeonato do Mundo que agora terá de bater-se nos quartos-de-final com a Argentina, também hoje com motivos para sorrir após uma vitória arrancada a ferros à Suíça, perto do fim do jogo, graças a um golo marcado por Di María. Messi desta vez ficou em branco. Com Cristiano Ronaldo já ausente, talvez tenha perdido alguma motivação para jogar.
Bélgica, 2 - EUA, 1
Argentina, 1 - Suíça, 0
Tim Howard, uma exibição para a história deste Mundial
1. Ontem à noite, contra uma defesa permeável e maleável como a dos EUA (facto que ficou bem patente aos 5', no golo de abertura de Portugal), Cristiano Ronaldo poderia e deveria ter funcionado como ponta-de-lança, desde que bem servido por dois alas muito móveis e combativos como Nani e Varela são. Como escreve hoje n' A Bola o treinador Vítor Manuel, "Éder, único ponta de lança no banco, é ainda um corpo estranho na selecção e Varela era fundamental para dar equilibrio ao corredor esquerdo, melhorar o jogo interior, com Ronaldo na frente, mas Paulo Bento não quis mudar o esquema táctico". Em suma: precisávamos de marcar e de ganhar. Assim Ronaldo nem sequer rondou o golo, quanto mais concretizá-lo.
2. Postiga à frente, na calamitosa situação física em que se encontra, seria sempre a pior das soluções. Como foi. Éder não revelou envergadura sequer para figurar entre os 23. Tem potencialidades, mas não acredita nele próprio: isso percebeu-se claramente na fase da preparação, nos jogos "a feijões". E como apostar num goleador que ainda não marcou na selecção quando os golos se tornam absolutamente necessários?
3. Paulo Bento, que contra a Alemanha já tinha assistido com inacreditável passividade à expulsão de Pepe sem mexer de imediato na equipa (limitou-se a fazer recuar Meireles para central durante dez minutos e só mandou entrar Ricardo Costa após o intervalo), voltou a pecar por passividade ontem à noite, frente aos Estados Unidos. André Almeida jogou quase meia hora em inferioridade física: aquele corredor direito norte-americano tornou-se uma auto-estrada com via verde. Com o seleccionador a assistir, impotente.
4. Só na segunda parte o seleccionador desviou Veloso para a ala esquerda (onde fez melhor que André Almeida, o que não era difícil, embora fosse várias vezes batido em velocidade) e mandou entrar William Carvalho para fechar o espaço enorme existente entre os centrais e o nosso meio-campo. A equipa melhorou logo de rendimento. A qualidade de passe de William impôs-se naquela faixa do terreno, além de ter sido ele o primeiro construtor dos lances ofensivos - muitas vezes através de recuperações de bola.
5. Mas nem assim funcionámos como era necessário. Porquê? O meio-campo fetiche do seleccionador - Veloso, Meireles e Moutinho - pura e simplesmente não funcionou. Veloso está sem ritmo, Meireles está sem arcaboiço físico (excesso de tatuagens?) e Moutinho está uma sombra de si próprio. Isso era mais que evidente há meses. O que leva a questionar novamente a não-convocação de Adrien, por exemplo. A selecção é para os melhores do momento ou só para aqueles que conseguiram lugar cativo em bons momentos do passado com Paulo Bento ao leme da selecção?
6. Não há necessidade de procurar outros factores - clima, árbitro, etc - para perceber as causas do mau rendimento da equipa nacional. O mau rendimento deve-se à falta de condição física - com reflexos na parte anímica - de demasiados jogadores convocados para o Brasil. Julgo que batemos o recorde mundial de lesionados sem bola nesta fase final: Coentrão, Hugo Almeida, Patrício, Bruno Alves, Postiga, André Almeida. Demasiados casos para não dar que pensar. Enquanto outros, em excelente condição física, ficaram em Portugal.
Sem ovos não se fazem omeletes, já dizia o saudoso Otto Glória. Cheio de razão.
O escândalo podia ter sido pior: a derrota contra os Estados Unidos esteve iminente até ao último lance do encontro, disputado em Manaus. Varela, a passe de Cristiano Ronaldo, empatou o jogo quando já quase nenhum português acreditava nisso. Foi pena: a nossa melhor jogada surgiu no fim.
A selecção jogou melhor do que na partida inaugural, contra a Alemanha. Mas esteve a um abismo de distância das excelentes exibições do Euro-2012, em que chegámos às meias-finais. Com quase um terço da equipa lesionada e opções questionáveis de Paulo Bento, que teima em não ver o óbvio: é insuficiente mudar jogadores quando o mais importante é alterar o sistema táctico. Hoje voltou a existir um enorme fosso entre os centrais e o meio-campo, grave lacuna apenas solucionada no segundo tempo, com a entrada de William Carvalho, que fez estreitar as linhas. E Cristiano Ronaldo acabou o jogo como ponta-de-lança, o que permite questionar se não deveria ter actuado nessa posição desde o início, servido por dois extremos eficazes como são Varela e Nani.
Os equívocos começaram novamente com a constituição do onze titular. O seleccionador, surdo aos bons conselhos que lhe foram chegando desde a derrocada contra a Alemanha, fez entrar em campo André Almeida, que abriu um corredor para as cavalgadas norte-americanas durante toda a primeira parte, e Postiga, que nem deveria ter feito parte dos 23 seleccionados para o Campeonato do Mundo. Na anterior partida, Hugo Almeida durou 27 minutos em campo. Postiga bateu o recorde ao ficar incapacitado quando estavam decorridos apenas 13 minutos. Outra lesão muscular a afectar um jogador português: e vão cinco. Ou melhor: vão seis porque André Almeida já jogou em esforço nos últimos 20 minutos do primeiro tempo, sendo substituído ao intervalo também por incapacidade física.
Tivemos uma vantagem: aos cinco minutos já estávamos a vencer, com um golo de Nani aproveitando uma cratera aberta à sua frente, no lado esquerdo da defesa norte-americana. Mas não soubemos aproveitá-la: depois do golo, a equipa recuou, inexplicavelmente atemorizada, e chegou a ter momentos de pânico que poderiam ter sido mais bem explorados pelos norte-americanos. O nosso corredor esquerdo era uma auto-estrada para os EUA, forçando Moutinho e Meireles a deslocar-se para essa ala como prontos-socorros do baralhado André Almeida. Nunca Fábio Coentrão (outro membro da legião dos lesionados) fez tanta falta à selecção.
Paulo Bento mexeu finalmente na equipa ao intervalo, fazendo entrar William Carvalho para médio defensivo, com evidentes melhorias no nosso meio-campo, e transferindo Miguel Veloso para a lateral esquerda, como recurso de emergência e resultados incertos. Ficou provado que a "polivalência" - tão elogiada por alguns inefáveis comentadores da bola - tem limites mais que óbvios.
À frente, Cristiano Ronaldo era apanhado sucessivas vezes nas malhas do fora-de-jogo. E Éder, avançado que nunca marcou um golo pela selecção, pecava por evidente imaturidade, sendo presa fácil para a defesa americana. Faltava outra mexida, que só pecou por tardia: a entrada de Varela, que veio dinamizar muito a nossa frente de ataque. É indispensável que actue como titular no jogo contra o Gana, em que precisamos de marcar muitos golos.
Rezando para que não ocorram mais lesões. À espera de um milagre que nos qualifique in extremis para os oitavos-de-final. E sem termos desta vez a Senhora de Caravaggio a puxar por nós.
Portugal, 2 - Estados Unidos, 2
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Os jogadores portugueses, um a um:
Beto - Rendeu Rui Patrício, outro dos lesionados. Esteve seguro, atento. Pareceu sempre mais confiante do que o guarda-redes do Sporting frente à Alemanha. Pena ter confiado no golpe de vista, que o traiu, no primeiro golo norte-americano.
João Pereira - Irregular. Esperava-se mais dele neste Mundial depois de ter feito uma excelente exibição no Euro-2012. Subiu mais na sua ala durante o segundo tempo, com proveito para Portugal, mas foi apanhado várias vezes em contrapé, incluindo no lance que originou o segundo golo dos EUA.
Bruno Alves - Não treinou durante a semana e esteve em dúvida até quase ao início do jogo. Mas não pareceu afectado pela lesão muscular. Foi um dos mais inconformados. No quarto de hora final jogou quase a ponta de lança, tentando o golo. De qualquer modo, está longe da sua melhor forma.
Ricardo Costa - Incomparavelmente melhor que Pepe. Se o central do Real Madrid havia sido o pior dos portugueses contra a Alemanha, o seu substituto foi um dos melhores neste duro embate com os EUA. Salvou as nossas redes aos 55', desviando a bola com Beto ausente da baliza.
André Almeida - Participou no início da jogada que originou o nosso primeiro golo. Depois desapareceu da partida, por inferioridade física, proporcionando via aberta às investidas alemãs. Paulo Bento tardou a substituí-lo: devia ter saído ainda na primeira parte.
Miguel Veloso - Demasiado lento, acusou o calor e a humidade de Manaus. E acusou sobretudo o longo período de inactividade a que foi sujeito pela paragem do campeonato ucraniano. Andou a tapar buracos na ala esquerda até Paulo Bento se convencer que o melhor era mesmo transferi-lo para esse espaço, o que só sucedeu no segundo tempo. A equipa melhorou nesse sector mas Veloso deixou-se bater várias vezes em velocidade.
Raul Meireles - Continua muito longe da melhor forma física. Recuperou menos bolas e falhou mais passes do que é costume. No primeiro tempo foi alvo de uma agressão de Jones, que devia ter sido sancionado pelo menos com um cartão amarelo. Saiu aos 68', visivelmente esgotado.
João Moutinho - Melhor do que no desafio com os alemães, mas muito distante daquele jogador que chegou a deslumbrar nos relvados portugueses. Está triste e desmoralizado desde que se transferiu para o Mónaco, tendo sido considerado um dos flops do campeonato francês. A sua má forma foi um dos factores do mau rendimento global da selecção.
Nani - Marcou aos 5'. Podia ter marcado novamente, aos 44', quando rematou ao poste. Aos 80' saiu dos pés dele outro forte remate, que passou um pouco acima da barra norte-americana. Foi sempre um dos mais inconformados. Parece em boa condição física, pormenor que merece ser sublinhado no actual contexto.
Cristiano Ronaldo - Arrisca-se a passar ao lado do Mundial - ao contrário de Messi, que já marcou dois golos e foi elemento fundamental para as vitórias da Argentina. Por vezes parece querer fazer tudo sozinho. Foi apanhado inúmeras vezes em situações de fora de jogo e nem nas bolas paradas as coisas lhe saíram bem. Redimiu-se no último lance, ao fazer um cruzamento perfeito para o golo de Varela que empatou o desafio.
Helder Postiga - Impõe-se a pergunta: o que foi fazer ao Brasil? Como agora se confirma, não reunia condições físicas mínimas para alinhar pela selecção. Paulo Bento mandou-o equipar, como titular. Durou 13 minutos em campo - e saiu. Ninguém da equipa técnica se tinha apercebido do seu estado?
Éder - Substituiu Postiga e voltou a ficar em branco. Um avançado que não marca é um duvidoso cartão de visita. Falta-lhe confiança nas suas próprias capacidades. Ficou a sensação de que ainda não merecia estar ao nível a que Paulo Bento prematuramente o colocou.
William Carvalho - Foi o caso mais gritante de teimosia do seleccionador, que o manteve no banco durante todo o jogo contra a Alemanha e insistiu em não o pôr como titular neste desafio. Só a lesão de André Almeida o fez entrar em campo, jogando como médio defensivo - posição que lhe valeu elogios unânimes ao serviço do Sporting. Tem qualidade de passe, revela boa condição física e nunca perde a posição. Ajudou a tapar as linhas de passe norte-americanas, dando boa cobertura a um sector que estava desguarnecido. Merece a titularidade. Vai tê-la contra o Gana, já demasiado tarde.
Varela - Outro jogador que entrou demasiado tarde, substituindo Meireles. Costuma funcionar como talismã da selecção e voltou a cumprir a tradição. Fez alargar a nossa frente de ataque, introduzindo agressividade e dinamismo na linha ofensiva. Exibição recompensada com um excelente golo, à ponta-de-lança.
Este foi o melhor resultado para a selecção nacional.
A Alemanha jogará pressionada contra os EUA, sentindo-se obrigada a ganhar. Quanto ao Gana, será connosco.
Agora sim, apenas dependemos de nós. A palavra derrotar é politicamente incorrecta, mas não há outra: temos de derrotar os EUA e o Gana. Já sabemos quais são as debilidades de uns e de outros. E não adianta queixarmo-nos do clima e dos árbitros.
Uma coisa é certa: com blablablá não se ganham jogos.
Se vencermos será por mérito próprio. Se perdermos será por demérito próprio.
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