Ontem foi dia de entrada em cena, neste Europeu, de três jogadores que estão ou já estiveram ligados ao Sporting.
Como se comportaram?
MORTEN. Foi titular pela Dinamarca na posição a que nos tem habituado no Sporting, como médio-centro, embora com maior propensão ofensiva - fruto do trabalho desenvolvido em Alvalade, onde é campeão. Esteve sempre muito em jogo contra a Eslovénia, acusando aqui e ali algum excesso de rispidez, o que lhe valeu o amarelo aos 49' (os árbitros têm poupado cartões neste Europeu). Teve um momento de manifesto azar quando a bola disparada pelo lateral esquerdo Janza tabelou nele e foi anichar-se nas redes: golão aos 77', antecedido de um petardo de Sesko (21 anos, Leipzig) que fez tremer os ferros da baliza. Substituído aos 89'. O jogo terminou 1-1: o tento dinamarquês foi marcado aos 17' pelo veterano Eriksen (32 anos, Manchester United) que emocionou o mundo ao cair em campo, no Euro-21, devido a uma paragem cardíaca. Recuperou, felizmente, e está em forma - como se viu pelo seu golo de requintada execução técnica, 1100 dias depois daquele susto que nos pregou.
SPORAR. Agora com 30 anos, titular no Panathinaikos, o antigo ponta-de-lança do Sporting foi o avançado mais posicional do onze esloveno neste embate com a Dinamarca em Estugarda, evidenciando as características que lhe conhecemos: anda perto do golo, mas concretiza pouco. Teve três ocasiões sem aproveitar nenhuma: aos 9' pecou por má recepção; aos 74' falhou emenda; aos 81', isolado, rematou à malha lateral. Nada de novo, portanto. Corresponde àquilo que recordamos dele quando passou no Sporting, onde quase não chegou a trabalhar com Rúben Amorim. Esteve época e meia, só marcou 11 golos em 38 jogos.
GUDELJ. Titular na equipa da Sérvia que ontem à noite enfrentou a Inglaterra em Gelsenkirchen. Médio de contenção durinho, daqueles que podem deixar passar a bola mas não deixam passar o homem, foi amarelado aos 39' e já não regressou após o intervalo. Fazendo lembrar a pouca saudosa época de 2018/2019, em que alinhou por empréstimo no Sporting antes de transitar para o Sevilha, onde permanece, aos 31 anos. Mais em força do que em jeito, deu luta aos ingleses, que só marcaram uma vez, pelo astro-rei Bellingham, aos 13'. Sem imaginação ou arte para mais. Kane ainda cabeceou com força, mas a bola embateu na barra (77', com desvio in extremis do guardião Rajkovic). A vitória por 1-0 soube-lhes certamente a pouco.
Futebol do melhor no Campeonato da Europa: aconteceu hoje, protagonizado pela selecção da Dinamarca, com uma segunda parte de sonho em que cilindrou a Rússia, goleando-a sem apelo nem agravo em Copenhaga.
De quase afastada, após duas derrotas (frente à Finlândia e à Bélgica), ascende assim ao segundo posto no Grupo B, transitando para os oitavos com todo o mérito.
Confesso que fiz questão em ver este desafio tão decisivo para os dinamarqueses torcendo por eles desde o primeiro minuto. Desde logo como homenagem ao malogrado Eriksen, o craque da equipa, vítima de uma síncope no jogo inaugural. E por sentir que a Dinamarca foi alvo de uma clara injustiça ao ter de prosseguir aquela partida tão traumática com todo o onze destroçado animicamente: aquela derrota contra a Finlândia, nesse dia específico, foi uma das maiores injustiças a que já assisti no futebol.
Mas os deuses da bola às vezes escrevem direito por linhas tortas, como esta tarde se confirmou. A Dinamarca venceu e convenceu: marcou quatro e sofreu apenas um, de grande penalidade. Dois dos seus golos foram extraordinários - do melhor neste Euro-2021. O primeiro, aos 38', apontado por Damsgaard, jovem extremo da Sampdoria, foi um tiro indefensável que fez levantar o estádio, cheio com 38 mil espectadores. E o terceiro, aos 79', parecia um míssil - disparado pelo defesa Christensen, outra das figuras da partida. Os restantes foram marcados por Poulsen (59'), aproveitando um monumental brinde da defesa russa, e Maehle (82'), coroando um rápido-contra ataque. Selava-se assim um jogo épico da Dinamarca: tenho a certeza de que nunca será esquecido.
Aproveitei para acompanhar mais de perto o desempenho de Daniel Wass, ala direito de 32 anos que actua no Valência e estará sob a mira do Sporting. Na partida anterior, em que recebeu um amarelo, nada fez que me despertasse a atenção. Desta vez merece nota positiva sobretudo por dois momentos: o centro milimétrico que fez aos 29' para um disparo de Hojbjerg, e um lance bem construído na extrema direita, aos 54'. Mas confesso que nada vi de extraordinário: Porro e Esgaio, pelo menos estes, são superiores.
Aos 61', Wass foi substituído: já não estava em campo no melhor período da sua equipa.
Enquanto esta partida decorria, em Sampetersburgo disputava-se o Bélgica-Finlândia, outra partida do Grupo B. Já com os belgas qualificados mas sem facilitarem: dominaram por completo, remetendo os finlandeses ao seu reduto.
A terceira vitória consecutiva belga neste certame foi natural. Já escrevi e reitero: estamos perante um potencial vencedor do Europeu. Menos natural foi vermos um excelente golo anulado por intervenção do vídeo-árbitro, aos 65': assistência de De Bruyne desmarcando Lukaku e este a fuzilar as redes. Ninguém entendeu a alegada deslocação que as imagens não comprovam. Merece alerta máximo: o absurdo critério do fora de jogo milimétrico anda a matar o futebol de ataque.
Mas aqui os deuses da bola voltaram a intervir. Após um autogolo do guardião Hradecky (74') na sequência de um canto, a dupla imparável voltou a dar nas vistas quase numa réplica do golo anulado: De Bruyne assistiu, Lukaku marcou. Fixava-se o resultado aos 81'.
Na linha do que ontem escrevei aqui, contestando a inconcebível decisão da UEFA de retomar o Dinamarca-Finlândia mesmo depois de Eriksen ter sofrido uma síncope em campo, o nosso bem conhecido Peter Schmeichel - campeão pelo Sporting em 2000 - também não poupou palavras. Com a autoridade acrescida que lhe assiste, enquanto campeão europeu em 1992 como guarda-redes titular da selecção do seu país.
«Os jogadores quebraram, vários estavam emocionalmente destroçados, foi uma experiência traumática», confessou entretanto o seleccionador dinamarquês, Kasper Hjulmand. Um cenário bem compreensível. Aquele jogo (que terminou com a vitória da Finlândia por 1-0) nunca devia ter sido concluído ontem, escassas duas horas após Eriksen ter sofrido a paragem cardíaca que esteve prestes a roubar-lhe a vida com o mundo inteiro a ver.
Houve drama no relvado, felizmente sem tragédia. Mas todos nós, os milhões que acompanhávamos as imagens pela televisão, chegámos a recear o pior. Decorria o minuto 43 do Dinamarca-Finlândia quando o astro da selecção anfitriã, Christian Eriksen caiu subitamente, perdendo os sentidos. Aparentemente fulminado por uma síncope.
Prontamente assistido pela equipa médica, que lhe terá salvo a vida, o craque do Inter - que recentemente se sagrara campeão em Itália - saiu em maca cerca de um quarto de hora depois, coberto por lençóis. Com os seus colegas destroçados - e muitos rivais também. Uns choravam, outros rezavam.
Nada deixava antever este momento tão dramático. Logo aos 18', Eriksen fez um excelente remate em arco à baliza finlandesa, forçando o guarda-redes a uma defesa muito difícil. Depois encarregou-se de marcar quatro pontapés de canto, todo bem executados.
Este jogo inaugural do Grupo B do Euro-2021 foi suspenso. E devia ter sido adiado: não fez sentido retomá-lo quase duas horas depois, apesar do gesto bonito da selecção finlandesa aplaudindo os dinamarqueses no momento em que regressaram ao relvado, obviamente cabisbaixos.
O resultado era o que menos interessava, perante o sucedido, mas a Finlândia acabou por ter sorte no meio de tanto azar: venceu tangencialmente o onze favorito nesta sua estreia absoluta na fase final de uma grande competição.
Merece parabéns. E a UEFA merece uma sonora vaia por ter posto a ganância do lucro à frente da sensibilidade e da compaixão.
Dinamarca, 0 - Finlândia, 1
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