O Mundial do Catar tem sido um fiasco em questão de audiências televisivas, na Alemanha. E, agora que a Mannschaft já deixou as arábias, até me pergunto se os canais estatais ARD e ZDF continuarão a transmitir os jogos.
Algo se passa na selecção alemã. Um tipo de futebol que deixou de funcionar? Falta de adaptação dos seleccionadores (sempre alemães) ao novo estilo de jogadores com origem migrante, como Serge Gnabri, Leroy Sané e Jamal Musiala? Enfim, nem sequer sou treinadora de bancada, não me compete dar respostas, muito menos, encontrar soluções. Mas a maneira como a Alemanha foi eliminada, desta vez, foi muito deprimente. O jogo de ontem teve momentos surreais.
A Alemanha tinha de ganhar. Mas estava, ao mesmo tempo, dependente de uma vitória da Espanha. Os primeiros golos foram marcados quase ao mesmo tempo: a Alemanha aos 10 minutos, a Espanha aos 11 minutos. Estava tudo a correr bem. Mas, aos 48, o Japão empatou e aos 51 pôs-se em vantagem. Logo a seguir, aos 58 minutos, a Costa Rica empatou. Aqui, o meu marido e eu passámos a torcer por uma vitória da Costa Rica. E note-se que o meu marido é alemão! Porquê? Se a Alemanha já não tinha praticamente hipóteses, que fosse a Espanha também eliminada. E não é que a Costa Rica marca o segundo golo aos 70 minutos?
Alegria efémera. Três minutos depois, Havertz empatou o jogo. Maldito Havertz! Ficámos numa situação muito ingrata, não me lembrava de já ter vivido semelhante, a assistir a um jogo de futebol. Deveríamos torcer pelo terceiro golo da Costa Rica? Mas: e se a Espanha ainda conseguisse virar o resultado?
O que veio a seguir foi surreal. A Alemanha começou a marcar golos e a Costa Rica desesperava. Tudo em vão. O marcador do Japão-Espanha congelara naquele fatal 2:1. Foi penoso ver a Alemanha a aumentar a sua vantagem, sabendo que tal vitória beneficiava apenas a Espanha.
Só nos resta esperar que “Marruecos” trate da saúde a “nuestros hermanos”.
A primeira grande surpresa do Mundial aconteceu há pouco: a Alemanha foi derrotada em Moscovo pelo México de Ochoa, Herrera, Vela, Chicharito e Layún. Uma partida emocionante em que os mexicanos souberam impor a sua organização colectiva frente à superioridade germânica. Em campo estavam seis titulares da final de 2014, em que a selecção alemã derrotou a Argentina: Neuer, Boateng, Hummels, Ozil, Kroos e Müller.
Foi um bom espectáculo de futebol, emotivo do princípio ao fim, com a turma germânica a dispor de mais posse de bola mas quase sempre de modo inconsequente. Os mexicanos nunca deixaram de explorar o contra-ataque, em ofensivas perigosas que poderiam ter-lhes valido um segundo golo.
A vitória foi construída aos 35', num desses lances de futebol rápido, desenrolado ao primeiro toque, com a defesa alemã demasiado subida, sem rins para acompanhar a velocidade de Chicharito, que assistiu, e Lozano, que fuzilou a baliza à guarda de Neuer.
Há 36 anos que a poderosa Alemanha não perdia uma partida inicial de um Campeonato do Mundo - a anterior fora em 1982, no inesquecível certame disputado em terras espanholas, ao ser derrotada 1-2 frente à Argélia. Nos últimos quatro mundiais, em jogos de estreia, os alemães golearam sempre. Essa hegemonia terminou hoje. E torna este Mundial mais emocionante.
O primeiro jogo do dia opôs a Costa Rica à Sérvia. Confesso: estava a torcer pela simpática selecção costarriquenha, que no Mundial do Brasil exibiu um futebol de grande qualidade e mantém quase intocável o seu onze-base. O maestro é o "nosso" Bryan Ruiz", que saiu entretanto de Alvalade envolto na máxima discrição, quase sem ninguém dar por isso.
Jogo pastoso, com maior acutilância sérvia mas superioridade técnica da Costa Rica, onde Bryan continua a ter bons pormenores - embora nem sempre com a intensidade necessária, como muito bem sabemos. Outro nosso velho conhecido, Joel Campbell, entrou a meio da segunda parte e também se mostrou igual a si próprio: muita finta no entretanto, mas quase sempre condenado a perder a bola na hora da decisão. Já vimos este filme.
A Holanda foi muito superior à Costa Rica no desafio dos quartos-de-final disputado em Salvador. Merecia passar à fase seguinte, o que aconteceu - embora só com recurso aos pontapés de grande penalidade pois o empate a zero persistiu após mais de 120 minutos de jogo.
A Costa Rica, que chegou a jogar em 5-4-1, estacionando um autocarro à frente da baliza brilhantemente defendida por Keylor Navas, também tem motivos para estar satisfeita: regressa a casa sabendo que chegou mais longe do que em qualquer outra fase final de um Campeonato do Mundo e revelou ao planeta futebol um punhado de jogadores de grande talento: Christian Bolaños, Bryan Ruiz, Gamboa, Celso Borges, Giancarlo González, Tejeda (que impediu um golo holandês desviando a bola na linha de baliza), Umaña (que ia marcando um golo já no prolongamento) e Júnior Díaz (que devia ter sido expulso por jogo violento), além do guardião Navas, que joga no modesto Levante e poderá ser um reforço do FCP.
O melhor deste desafio, que decorreu morno e entediante durante mais de uma hora, aconteceu quando se aproximava do fim: nessa altura os holandeses decidiram enfim aplicar a sua melhor arma, que é a velocidade. As corridas estonteantes de Robben pela ala direita iam partindo os rins à linha recuada costarriquenha (ou seja, à equipa quase inteira) e as bolas paradas que partiam dos pés de Sneijder levavam sempre o selo de perigo (duas delas foram travadas pelos postes).
Quando se percebeu que o apuramento só seria resolvido com a marcação de penáltis, o seleccionador holandês, Van Gaal, tomou uma decisão que fez os puristas da bola abrir a boca de espanto: mandou sair o guarda-redes titular, Cillessen, fazendo entrar o suplente Krul só para defender as penalidades. Uma aposta de alto risco que se revelou certeira: Krul defendeu os remates de Bryan Ruiz e Umaña, o que bastou para qualificar a Holanda.
Na meia-final de quarta-feira os holandeses terão de defrontar uma selecção argentina que se desgastou muito menos na eliminatória que lhe coube. Em futebol de alta competição, sobretudo quando é disputado sob a temperatura a que tem decorrido este Mundial do Brasil, estes pormenores contam muito. Messi e companheiros têm motivos para sorrir.
Costa Rica, 0 - Holanda, 0 (3-4 nas grandes penalidades)
Eu quero lá saber que a Costa Rica tenha passado a fase de grupos e Portugal não: a Costa Rica não conta, apurou-se neste Campeonato e volta a apurar-se daqui a cem anos, não faz parte da aristocracia do futebol, como faz Portugal, e por direito divino. É contra outros aristocratas que tais que nós nos batemos e foram eles que mais uma vez vencemos. A horrível Espanha, que ousou ganhar-nos há quatro anos, na África do Sul, e até andar para aí a dizer que era campeã da Europa, e do mundo, etc., caiu de borco, a madraça, a asna, a grotesca palhaça, logo ao fim do segundo jogo. A pérfida Inglaterra, que nos persegue desde o tempo do Jacky Charlton, e que em 66 se interpôs entre nós e as nossas aspirações naturais ao domínio do mundo (futebolístico; uma espécie de mapa-cor-de-rosa, se virmos bem), tombou ao fim de dois jogos e meio – isto é, ao fim do segundo ainda não estava eliminada, mas antes do terceiro já estava, graças à vitória da Costa Rica sobre a Itália no entrementes. Agora nós – e é isto que lhes dói – precisámos de três-jogos-três para irmos à nossa vida. Bem-hajam pois "Os Conquistadores" e viva a nossa Federação, a cerveja Sagres e os supermercados Continente! Bom, e agora que a nossa pequena competição particular contra o inimigo convencional e a mais velha aliada terminou, e logo da melhor maneira, vamos ver o Mundial a sério, que já é tempo. Venham os oitavos!
É oficial: a Inglaterra também está fora do Campeonato do Mundo. Foi afastada em definitivo, após duas derrotas, devido ao desfecho - para alguns inesperado - do Costa Rica-Itália. Segunda vitória consecutiva da equipa oriunda da América Central, segundo triunfo sobre ex-campeões mundiais - hoje os italianos, depois dos uruguaios.
Sob um calor intenso, num jogo iniciado às 13 horas locais, Itália e Costa Rica procuraram a vitória neste encontro disputado a maior velocidade do que as condições atmosféricas recomendariam. Os costarriquenhos foram quase sempre superiores, com forte organização em todos os sectores do terreno.
Tinham a lição bem estudada: a dinâmica dos italianos não era segredo para eles. Jogaram com força anímica, descomplexados.
O esforço recompensou: o golo do triunfo surgiu aos 44' numa rapidíssima jogada de ataque concluída por Bryan Ruíz, após assistência de Júnior Díaz. O regressado guardião Buffon - um dos sobreviventes da squadra azzurra que se sagrou campeã mundial em 2006, convocado para cinco campeonatos do mundo desde 1998 - nada pôde fazer. E maior seria a vantagem, em princípio, se dois minutos antes o árbitro tivesse marcado uma grande penalidade mais do que evidente cometida sobre Joel Campbell, que voltou a ser um dos melhores em campo juntamente com os colegas já mencionados e ainda o médio de origem brasileira Celso Borges e o ala esquerdo Christian Bolaños. Todos muito combativos, revelando solidez física e grande disciplina táctica.
Quem disse que o futebol latino-americano é superior em técnica do que em táctica? Este Mundial vem desmentindo isso, jogo após jogo.
Transita a Costa Rica para os oitavos-de-final no Grupo D - o chamado "grupo da morte". Falta saber que selecção lhe fará companhia. Tudo dependerá do Itália-Uruguai, que promete ser um dos desafios mais trepidantes num torneio onde a emoção não tem faltado. E os erros de arbitragem também não.
Costa Rica, 1 - Itália, 0
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