Rescaldo do jogo de ontem
Não gostei
Do empate do Sporting em Barcelos. Parece sina: derrapámos frente ao Gil Vicente, cumprindo um jogo em atraso, no mesmo estádio onde tínhamos naufragado, em Outubro, frente ao Varzim - do terceiro escalão do futebol português - para a Taça de Portugal. Desta vez, empate a zero. Sem hipótese de recurso a teorias da conspiração: só podemos queixar-nos de nós próprios.
Dos golos anulados. A bola entrou duas vezes na baliza gilista. Edwards, aos 54', e Pedro Gonçalves, aos 60', meteram-na lá dentro, mas sem valer. No primeiro caso, detectado pelo vídeo-árbitro Hugo Miguel, Chermiti iniciou o lance em fora-de-jogo. No segundo, a deslocação era tão evidente que nem necessitou de linhas virtuais - o próprio Pedro percebeu que estava adiantado face ao penúltimo defensor.
Da atitude. Num desafio de quase tudo-ou-nada, que podia ditar (ou não) o acesso do Sporting às receitas da liga milionária, foi inaceitável aquele ritmo pausado, aquela falta de fibra, aqueles passes atrasados, aquela incapacidade de ganhar segundas bolas - e até de conquistar cantos, pois o primeiro só aconteceu aos 63'. Perante um Gil Vicente que cumpriu o seu plano de jogo com eficácia mas também com fragilidades que fomos incapazes de aproveitar.
Da desconcentração. Como é possível os nossos jogadores serem oito vezes apanhados em posição irregular? Isto só se explica por lapsos de concentração competitiva, ainda mais imperdoáveis por se tratar de um desafio que nos poderia deixar apenas a três pontos do Braga - e em vantagem competitiva com a turma minhota. Nem pareciam estar em campo os mesmos que esta época já derrotaram o Tottenham na Liga dos Campeões e eliminaram o Arsenal da Liga Europa. Só sentirão verdadeira motivação quando enfrentam adversários de renome no futebol europeu? Nem quero acreditar.
Do treinador. Rúben Amorim pecou a dois tempos. Desde logo, ao escolher o onze titular: para quê promover o regresso de Esgaio e apostar em Matheus Reis como alas se Arthur e Nuno Santos tinham estado tão bem na partida anterior, frente ao Santa Clara? Esgaio, como sabemos, é incapaz de driblar, cruza de modo inofensivo e tem péssima relação com a baliza. Matheus, sempre de nervos à flor da pele, cumpriu no plano defensivo mas é claramente inferior no capítulo ofensivo. Rúben também demorou demasiado a mexer na equipa, exceptuando a troca de Gonçalo Inácio por Nuno Santos ao intervalo. Só aos 76' decidiu que era preciso alterar alguma coisa, quando era evidente para todos que o cenário de vitória ia ficando cada vez mais longe.
De Chermiti. Esteve quase a marcar um golo com "nota artística", de calcanhar, agora que andam na moda as candidaturas ao Prémio Puskás. Foi aos 10': se entrasse, toda a história deste Gil Vicente-Sporting seria bem diferente. Faria bem o jovem dianteiro em deixar-se de malabarismos e a dedicar-se a praticar um futebol objectivo e sempre de olhos nas redes adversárias, pensando menos nos memes das redes sociais e nas manchetes da imprensa do dia seguinte. E também a estar mais atento à linha do fora-de-jogo, como compete a qualquer avançado.
De Edwards. É um dos nossos melhores jogadores, mas por vezes desliga o interruptor e torna-se mero espectador. Ontem foi facilmente anulado pela defesa minhota, o que pareceu desmoralizá-lo. Ia tentando, de modo intermitente, mas faltava-lhe sempre o ângulo certo para o remate de pé esquerdo ou a floresta de pernas à sua frente inviabilizava a trajectória da bola rumo à baliza. Esteve em dia não.
De Trincão. Desperdiçou outra oportunidade. O facto de ter ficado fora do onze inicial já significa que vem perdendo a confiança do treinador. Ter entrado só no quarto-de-hora final foi outro indício. A verdade é que acabou por ser uma substituição inútil: pareceu ter entrado já cansado e não tardou a ser engolido pela muralha gilista. O melhor que fez foi um remate frouxo, à figura do guarda-redes Andrew.
De voltar a ver Coates como ponta-de-lança improvisado. Sinal de desespero evidente nos minutos finais: funcionou há duas épocas, quando a estrelinha brilhava e nos sagrámos campeões, mas o nosso capitão deixou de ser "arma secreta": todas as defesas adversárias conseguem anulá-lo com facilidade. O melhor é pensarmos num reforço a sério para esta posição e não continuarmos a recorrer ao improviso.
Da classificação. Seguimos em quarto lugar, vendo o Braga com mais cinco pontos, o FC Porto com mais sete e o Benfica à distância estratosférica de 17 pontos. Há cada vez menos tempo e menos espaço de recuperação, quando só faltam oito jornadas. O melhor a que ainda podemos aspirar, realisticamente, é ao último posto do pódio.
Gostei
De não termos sofrido golos. Sexto jogo seguido com a nossa baliza invicta e dez jogos consecutivos sem derrotas - um recorde na era Amorim. Sinal de que os lapsos defensivos, apontados como o nosso principal problema no início desta época, já terão sido superados.
De St. Juste. Em nítido contraste com a apatia que se apoderou de alguns dos seus colegas, o central holandês fez sempre a diferença pela positiva, empurrando a equipa para a frente e protagonizando ele próprio o início de prometedores lances de ataque. No último minuto, viu o cartão amarelo por estar inconformado com aquela pasmaceira, com o empate nulo e a perda de mais dois pontos. Melhor Leão em campo.
Do Gil Vicente. Boa réplica da equipa minhota, que há mês e meio venceu o FC Porto no Dragão. Merece elogio.
Do árbitro. Nuno Almeida dirigiu a partida com critério largo, à inglesa, sem interromper a todo o momento nem tentar roubar protagonismo aos jogadores. Nenhum erro relevante a apontar-lhe.
Do apoio incessante dos adeptos. Mesmo a jogarmos fora, e sem um futebol entusiasmante, nunca faltou aos nossos jogadores o incentivo das bancadas. Do princípio ao fim.