Quem vê caras...
Raras vezes me lembro de uma noite mais insólita em termos de cobertura futebolística como a noite televisiva de ontem. Cada jornalista em estúdio, cada repórter no terreno, cada comentador com lugar cativo no respectivo painel analisava não a prestação das equipas no terreno mas a expressão facial de quem se sentava no banco do Sporting ou permanecesse nas imediações. Não faltaram catedráticos de Fisionomia Aplicada divagando sobre o sorriso de Bruno de Carvalho ou a sisudez de Marco Silva. Alguém, com ar de quem acabava de descobrir a pólvora, observou: «Marco não ficou um só minuto sentado no banco.» Como se o treinador do Guimarães, Rui Vitória, não tivesse estado também sempre de pé durante o jogo.
Mas a frase mais original foi proferida por Manuel Queiroz, que comentava com voz lúgubre a transmissão do jogo em directo feita pela TVI. Quando faltavam dois minutos para o apito final, saiu-se com isto: «Houve pouca interacção entre o treinador e o presidente do Sporting no banco leonino, mas aparentemente o Sporting vai ganhar.» Aquela adversativa retirava qualquer indício de lógica ao isentíssimo comentador nortenho, que parecia tolhido pelo frio.
Percebia-se: era um momento de tristeza para alguém como ele, incapaz de esconder a sua decepção pela vitória leonina. Azar: mal acabara de proferir aquela arguta observação, Dramé enfiava o segundo golo do Sporting na baliza do Guimarães.
A voz de Queiroz embargou-se de vez. Pena não lhe ter visto a cara, para saber o grau de "interacção" que manteve com os restantes elementos da equipa de reportagem da TVI.