Os jarretas (antologia 2015/16)
Vejo que ainda não te passou a azia devido à contratação do Jesus.
- Nem vai passar. Detesto ver lampiões a treinar a minha equipa.
- Mas Jesus é sportinguista, com cartão de sócio e tudo! Nunca foi lampião.
- Queres comparar com o Marco Silva?
- Sim, quero. O Jesus é muito melhor. E a propósito: o Marco Silva é que é lampião.
- Isso agora não interessa nada. O que interessa é que o Marco era um cavalheiro, não um lambrego como este. Já o viste a mascar chiclete de boca aberta? Aquilo até parece a gruta do Ali Babá...
- Quero lá saber da chiclete! Quero é que ele oriente bem a equipa, como tem acontecido.
- E eu quero lá saber da forma como ele orienta a equipa! Quero é que ele feche a boca enquanto masca.
(...)
- Apesar de a concorrência ser forte lá vamos somando pontos.
- Dizes bem. Grão a grão, enche a galinha o papo...
- Isto deve-se, em boa parte, aos jogadores.
- Longe de mim discordar disso.
- Mas deve-se sobretudo à qualidade do treinador, que é inegável.
- Cada vez concordo mais contigo. Sobretudo na importância do treinador, que é o aspecto mais decisivo para revelarmos tão boa forma.
- Sim, senhor. Hoje nem parecemos nós. Estamos de acordo em tudo!
- Algum dia haveria de ser. Mas eu estou mais admirado que tu.
- Porque é que te admiras que eu esteja a fazer estes merecidos elogios à nossa equipa?
- Porque dantes criticavas o nosso treinador.
- Criticava o treinador? Quando é que me ouviste criticar o Jorge Jesus?
- Jesus? Quero lá saber do Jesus! Eu estava a falar do nosso treinador, o Marco Silva. Já reparaste bem no excelente trabalho que ele tem vindo a fazer no Olympiacos?
(...)
- Nunca se tinha visto coisa assim.
- Falas de quê?
- Da nossa vitória frente ao Benfica, claro. Por números que jamais tinham acontecido. Houve festa rija lá em casa. E na tua?
- Na minha não houve festa.
- Não me digas que não celebraste a vitória da nossa equipa...
- Festejei à minha maneira. Celebrei para dentro.
- E por fora?
- Mantive-me impassível. Aliás não queria incomodar os vizinhos.
- Eu estive-me nas tintas para isso. Até porque os meus vizinhos são todos do Sporting! E ao menos bebeste umas cervejolas?
- Não. Bebi meio copo de água com um comprimido de Alker Seltzer dissolvido. Estava sem sede e sentia alguma azia: devo ter abusado dos croquetes ao almoço.
(...)
- Tu agora, com essa idade, viraste tripeiro? Nunca te imaginei na mesma trincheira do Pinto da Costa... Mas ainda agora dizias que o clássico vai ser decisivo!
- Vai ser, claro. Decisivo para correr com o Bruno do Sporting. Esse deve ser o objectivo supremo de todos os verdadeiros sportinguistas, aqueles que a todo o instante sentem o clube a vibrar nas veias e no coração, como acontece comigo.
- Correr com o Bruno?!
- Sim. Para que ele seja corrido o Sporting tem de perder tudo, não percebes? O meu campeonato é este. Ainda não tinhas entendido, meu grande morcão? Anda daí: vamos comer uma francesinha.