O pesadelo
Dez notas sobre o Varzim-Sporting (1-0)
O Sporting disse ontem adeus à Taça de Portugal no próprio jogo em que se estreava nesta competição. Caiu com justiça perante o Varzim - que actuava supostamente "em casa", mas em estádio emprestado, na cidade de Barcelos. Adversário da Liga 3, uma competição dois escalões abaixo da nossa.
Foi o "momento Silas" de Rúben Amorim neste início de época que se transformou num doloroso pesadelo. Vamos em quinto no campeonato à nona jornada, disputamos o quarto posto com o Casa Pia, acabámos de ser humilhados pelo Marselha na Liga dos Campeões, sofremos seis derrotas em 14 desafios já disputados em três competições.
Agora, somos despejados da Taça. Num jogo em que nada fizemos sequer para empatar, quanto mais para vencer.
Equipa apática, desinteressada, sem chama nem alma. Treinador assistindo fora das quatro linhas, com atitude de insólita resignação. Como se uns e outros já desconfiassem desde o início que o pior poderia acontecer.
E aconteceu mesmo.
Algumas notas que este jogo me suscitou:
1. Os nossos futebolistas passaram o tempo a atirar bolas para a bancada. Pareciam disputar um concurso a ver quem seria o primeiro a pontapear uma para fora do estádio. Neste lamentável "campeonato" distinguiu-se Trincão (8', 12', 32', 60', 65'). Uma inutilidade.
2. Beneficiámos de 19 pontapés de canto. Nenhum foi aproveitado - nem andou perto disso. Desperdício quase chocante. Enquanto junto à baliza leonina os escassos lances de bola parada favoráveis ao Varzim faziam o nosso "bloco defensivo" tremer. O golo da equipa da casa, aos 70', surgiu na sequência de um livre em zona lateral.
3. Houve desempenhos individuais catastróficos. Mas a falha principal deste Sporting 2022/2023 é a nível colectivo. Como se o lema "para onde vai um, vão todos" funcionasse agora ao contrário. No pior sentido do termo.
4. O conjunto leonino parece entrar em campo à beira da exaustão física, actuando em câmara lenta, quase a passo. Vários jogadores continuam lesionados, outros vieram de lesões mal curadas, alguns andam presos por arames. Para cúmulo, surgiu agora um surto de "virose" que deixou outros fora de combate. Mas a principal quebra é no plano anímico. Amorim nada ajudou com a polémica declaração sobre jogadores "preferidos". Algo capaz de fracturar um balneário.
5. Paulinho, um dos jogadores preferidos do treinador, continua sem marcar. Na nossa baliza. Mas foi dele a "assistência", de cabeça, para o golo poveiro. Momento infeliz? Sem dúvida. Mais um, a somar a outros.
6. Amorim inovou do ponto de vista táctico quando chegou a Alvalade. Mas o que era novo tornou-se velho: qualquer equipa, do Marselha ao Varzim, conhece de cor e salteado os automatismos do onze leonino e as suas notórias fragilidades, neutralizando o Sporting. Nomeadamente no capítulo defensivo, onde se sucedem arrepiantes falhas de marcação porque os três centrais estão sempre mais preocupados em definir linhas de fora-de-jogo. E acabam, várias vezes, a defender com os olhos.
7. Faz pouco ou nenhum sentido manter o modelo táctico seja qual for o adversário, seja qual for o estádio, seja qual for a competição, seja qual for o objectivo em vista. Amorim gaba-se de ser teimoso. Quando a teimosia se torna casmurrice passa a ser defeito.
8. O treinador voltou a errar ao mexer na equipa. Já em desespero, aos 85', mandou sair Nuno Santos, único dos nossos que teimava em remar contra a maré, acutilante do princípio ao fim. Quando mais precisávamos de a meter lá dentro.
9. Tombámos ao cumprirem-se os 90 minutos regulares. Mas pairou a sensação de que se tivéssemos ido a prolongamento e aos penáltis para efeito de desempate, ficaríamos também pelo caminho - de tal modo esta equipa está arrasada no plano anímico e motivacional.
10. Se há frase que detesto é «temos de levantar a cabeça». Uma espécie de lema dos derrotados. O nosso treinador pronunciou-a no final do jogo. Péssimo sinal. Como se a "síndrome Silas" voltasse a pairar no horizonte.
Leitura complementar:
Abalo sísmico (28 de Agosto)
A hecatombe (13 de Outubro)