O "caso Rúben Amorim" e os motivos de "força maior"
Na sequência do que escrevi ontem aqui, continuo com a suspeita - e não passa disso mesmo, de uma suspeita - de que a direção do Sporting Clube de Portugal invocou um incidente de Force Majeure ("força maior", em português) para não saldar a primeira prestação (cinco milhões de euros) da transferência de Rúben Amorim do Braga para o nosso Clube. A confirmar-se esta decisão, muito arrojada para o que conhecemos até aqui da equipa de Frederico Varandas, o SCP está a seguir os passos de muitas empresas e instituições por essa Europa fora e também nos EUA.
As cláusulas de "força maior" - que o contrato de Rúben Amorim deve obrigatoriamente incluir, caso contrário aplica-se a Lei geral no País onde se celebrou - prevêem justamente este tipo de situações extraordinárias, como a pandemia que estamos todos a viver, e na prática alteram as obrigações e as liabilities quando se dá esse evento ou circunstância que muda tudo.
Esta informação só poderia ser confirmada na carta que o SCP dirigiu ao Braga, que julgo ainda não ser pública, já que nos dados fornecidos à CMVM não consta nada sobre isto. No entanto, quer ontem as fontes da direção leonina, em off, quer hoje a análise das capas d' A Bola e do Record indiciam isso mesmo. O jornal mais próximo do SCP diz "Leão falha Amorim", em antetítulo diz que "o Sporting alega que não pagou porque não quis" e em subtítulo: "SAD assume que se trata de medida de gestão". Já o jornal mais lampião escreve em manchete "Rúben Amorim está por pagar" e diz no antetítulo, com gravidade, "Sporting falha 1.ª prestação e fica a dever de imediato €12,3 milhões" [em vez dos dez milhões, cláusula de indemnização do treinador por rescindir com o Braga].
O assunto é sério e deveria ter merecido uma estratégia de contenção de danos por parte da direção, tentando que estas falhas de comunicação não se fizessem sentir. Uma medida de boa gestão é cumprir com as obrigações e os contratos assinados e, caso assim não seja, por qualquer motivo, mesmo que de "força maior", o SCP deve informar a opinião pública para não acontecer o que vimos ontem em todas as televisões e serviços noticiosos. Passou a imagem de que o SCP não é cumpridor, falhou com o Braga e terá consequências inacreditáveis aos olhos de todos nós, como o aumento do seu passivo, a expulsão das competições da UEFA e outras sanções do tipo. A pior, no entanto, é a machadada na sua credibilidade e os efeitos reputacionais disso mesmo perante os diversos stakeholders: à cabeça de tudo os sócios, mas também os parceiros e patrocinadores, outros clubes, os seus profissionais, as associações do setor nacionais e estrangeiras e as entidades financeiras.
Se o Sporting está a tomar medidas excepcionais de gestão prudencial e resolveu, extraordinariamente, não honrar os seus compromissos com terceiros porque outras partes também não estão a cumprir com o Clube - duvido que o Manchester United, por exemplo, com a liquidez que tem, não esteja a pagar rigorosamente tudo o que é suposto pagar pela saída de Bruno Fernandes -, então isso deve ser muito bem explicado, com argumentos jurídicos e financeiros inatacáveis. Essa explicação urge ser dada aos sócios e ao País.
Estamos a falar do Sporting Clube de Portugal e não de uma qualquer instituição de segunda ou terceira categoria. O que levou quase 114 anos a construir não pode ruir de repente por causa de uma pandemia, como também não ruiu com a passagem de outros "vírus" pelo nosso Clube.