Nada disto tem a ver com desporto
Os 222 milhões de euros pagos pelo Paris Saint-Germain (nome de santo ironicamente patrocinado por um país islâmico) para desviar Neymar do Barcelona cavam ainda mais fundo o fosso que separa o futebol enquanto actividade económica da genuína competição desportiva: deixaram de ser mundos complementares para se tornarem realidades antagónicas.
Este inédito montante adultera os princípios de transparência do mercado desportivo cotado em bolsa e transforma os jogadores em mera mercadoria à mercê dos capitães da fortuna fácil. Desde logo, parece colidir com as normas da concorrência vigentes na União Europeia e as regras de fair play financeiro da UEFA: qualquer resquício de equidade evapora-se de vez quando os Estados começam a investir em força nos clubes - neste caso o do Catar, com base nos seus lucros petrolíferos. E provoca um sério choque inflacionário na indústria do futebol: os preços vão disparar, a espiral da dívida aumentará em flecha, avizinham-se as mais desvairadas loucuras financeiras no horizonte.
Convém entretanto seguir em pormenor a origem e o rasto desta verba astronómica, que faz subir para 700 milhões de euros o orçamento anual do PSG para o futebol. À atenção das autoridades jurisdicionais - do desporto e não só.
Finalmente, está por demonstrar que um único jogador - e desde logo Neymar, com desempenho em campo inferior a Cristiano Ronaldo ou Messi - justifique estas cifras galácticas. O dinheiro pago por ele para o transformar em emblema de um clube sem tradição na alta-roda do futebol duplica o seu justo valor, nada tendo a ver com genuínos "preços de mercado".
Ao dar este passo, o futebol de alta competição transforma-se num jogo de fortuna e azar - uma espécie de roleta russa para usufruto de caprichos milionários. O desporto, digam o que disserem, nada tem a ver com isto.
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