Jogar sem adeptos tem libertado a equipa
Bom, é mesmo uma coisa que custa a ouvir, ainda por cima dum ex-capitão de equipa com uma carreira longa no clube, ainda mais para alguém como eu, com lugar cativo em Alvalade e muitas vezes fora dele. Com certeza não vou aos jogos por outro motivo que não seja para apoiar a equipa, ajudá-la a chegar à vitória e no final saudar os jogadores, ganhando ou perdendo.
Mas obviamente que Beto tem razão.
Tempos houve em que os adeptos no estádio, organizados ou não, puxavam incondicionalmente pela equipa, faziam de Alvalade um vulcão verde e ajudavam a conquistas que se julgavam impossíveis. São tantas as grandes tardes e grandes noites que nem sei destacar alguma em particular, mas por exemplo, a noite contra o Newcastle no tempo do Peseiro foi realmente épica. Mas há menos tempo, até fora de casa ou talvez por isso mesmo, a noite em Londres contra o Arsenal ou a tarde do Jamor contra o Porto também o foram. Se calhar também porque as claques foram reduzidas nesses dois jogos à expressão mínima nas bancadas.
Mas o que se passou nos últimos tempos, em particular pelas duas claques ressabiadas, foi não um apoio incondicional à equipa, mas uma atitude de intransigência e de combate aos profissionais, à espera do primeiro deslize para descarregarem tudo o que lhes vai na alma. Chulos, palhaços, joguem à bola, suem a camisola, etc, etc... Ainda agora, nos Açores, o nosso capitão Coates foi brindado com insultos, pelo deslize que teve, por meia dúzia de adeptos que levavam faixas da Juveleo.
As razões são conhecidas. Desde que o infeliz ex-presidente teve a ideia de investir pelo balneário de Chaves para berrar com os jogadores, o relacionamento dele com o plantel foi sempre a descer e cada vez mais extravasando para o domínio público. Depois houve o post sobre Madrid e os acontecimentos subsequentes que dividiram ainda mais os adeptos e as claques no que respeita aos profissionais do clube.
Com ele ficaram as duas principais claques que cada vez mais hostilizaram os jogadores. Depois sucederam-se as voltas olímpicas dos jogadores que chocaram alguns, o bombardeio das tochas, as esperas nas garagens, o confronto aos jogadores no aeroporto, o assalto a Alcochete, os insultos nas escadarias do Jamor, a destituição e expulsão do presidente, a condenação dos assaltantes, os insultos em Alverca, a hostilização do "rato" Fernandes e dos dois argentinos de pelo na venta, etc.
Depois veio a questão do protocolo e a guerra aberta com o presidente. E a principal arma que tinham e têm para o destruir é o mau desempenho da equipa de futebol. Assim, quer queiramos quer não, os futebolistas sabem que há ali gente que aproveitará todas as oportunidades para os insultarem e achincalharem.
Para esses adeptos, os do "zero ídolos", os únicos futebolistas "bons" são aqueles que não jogam ou que já foram dispensados ou vendidos. Ou o Peyroteo, que já morreu há muito.
Também no que respeita à chamada "bancada central", que integra os "lugares de leão" e globalmente corresponde aos sócios mais antigos em Alvalade, o clima se foi gradualmente degradando de acordo com o desempenho da equipa. Aquele período com Jorge Silas e os três tristes emprestados foi mau demais. A paciência chegou ao ponto mínimo exactamente no jogo de estreia de Amorim contra o Aves, onde também esteve bem longe de dar à equipa o apoio que merecia.
Desde esse dia, e com a excepção desta meia-dúzia de adeptos nos Açores, nunca mais a equipa teve adeptos no estádio. Isso realmente tem libertado a equipa, permitindo que os mais novos melhor se concentrem no que têm de fazer, fazendo-os ultrapassar mais facilmente eventuais erros e deslizes e melhor relativizar os sucessos. Tranquilidade, estabilidade, concentração são os ingredientes para o sucesso, já dizia o Paulo Bento.
Mas esta não é uma solução definitiva para o problema. Temos de ser nós todos, quando pudermos voltar às bancadas, organizados ou não em grupos, a demonstrar aos jogadores que podem contar connosco nas bancadas de Alvalade e fora dele, como nós contamos com eles para ganharem no campo. Porque só assim o Sporting pode ter sucesso.
SL