Já esquecidos de Alcácer-Quibir
Fotograma do filme Non ou a Vã Glória de Mandar, de Manoel de Oliveira (1990)
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Nas dez temporadas anteriores a esta, o Sporting perdeu nove vezes no estádio do Dragão para a Liga portuguesa de futebol. Com treinadores tão diversos como Paulo Bento, José Couceiro, Sá Pinto, Oceano Cruz, Leonardo Jardim, Marco Silva, Jorge Jesus e Marcel Keizer. A excepção ocorreu na época 2015/2016, a primeira das três em que Jesus liderou a equipa técnica.
Basta este registo estatístico para comprovar que a nossa crise de resultados no clássico já vem de longe.
Mesmo assim, a mais recente derrota do Sporting fora de casa, contra o novo campeão nacional, bastou para fazer emergir a pior faceta de alguns adeptos: em vez de se congregarem em torno das nossas cores, quando há ainda pelo menos um objectivo a cumprir nesta época (um lugar no pódio do campeonato) e falta defrontarmos o nosso mais velho rival, desatam a dizer mal de tudo agitando os fantasmas de sempre enquanto bradam pelo regresso de D. Sebastião. Já esquecidos de Alcácer-Quibir.
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Uns exigem "demissões já", frase que vêm gritando há dois anos com o sucesso que todos conhecemos.
Outros invocam com fingida saudade nomes de jogadores que deixaram de pertencer ao clube como exemplos de excelência - omitindo agora os insultos que lhes dirigiam quando eles vestiam de verde e branco - só para rebaixarem e desmoralizarem os miúdos que hoje despontam na equipa principal do Sporting.
Não falta também quem urre contra o "excesso de jovens" quando antes clamava pela indispensável "aposta na formação".
Há ainda aqueles que procuram sem cessar o brilho dos holofotes atrevendo-se a falar em nome do universo leonino quando afinal são incapazes de trocar a palavra "eu" pela palavra "nós". Este é o teste do algodão, que nunca engana.
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Tudo isto, repito, na sequência do 0-2 registado quarta-feira no Dragão - a nossa primeira derrota desde Fevereiro, e quando falta cumprir dois jogos para a conclusão desta atribulada Liga 2019/2020.
Para azar de tal gente, nestas alturas todos percebemos quem é genuinamente adepto e quem apenas se serve do Sporting como pretexto para insuflar o ego à boleia de um desaire.
É nos momentos adversos que se avalia com maior rigor o verdadeiro calibre leonino de quem proclama amor incondicional ao Clube. Quando se ganha, qualquer um trauteia o hino e agita o cachecol.
Mas é bom que uns e outros se convençam disto: a grande maioria da massa adepta, farta até aos cabelos de profetas da desgraça e já imunizada contra ególatras de todo o género, não se deixa iludir.