Hoje giro eu - Onze indomáveis e outros leões
Embora apenas 11 possam estar em campo em simultâneo, uma equipa de futebol para ser competitiva tem de ser muito mais do que a soma das onze individualidades que vão a jogo mais aqueles que ficam no banco e os que nem se equipam. Aqui entra a função do treinador: num balneário de 25 jogadores, todos têm a legítima ambição de serem titulares. Cabe ao líder do grupo manter todos motivados, alinhados, irmanados, focados num objectivo comum. Enfim, penso que isso será matéria interessante para um próximo "post", mas para este importa-me trazer ao conhecimento dos nossos leitores e comentadores as minhas ideias sobre quais os jogadores do actual plantel que me parecem estar à altura de, no caso concreto, ajudar o Sporting a ser campeão esta época, enaltecendo as suas qualidades e apontando alguns aspectos a melhorar. Aqui vai então, à laia de exercício teórico:
Rui Patrício: quem viu aquele miúdo espigadote estrear-se de leão, e algum tempo depois ouvir os primeiros assobios, estaria longe de imaginar que, um dia, o guardião se tornaria consensual. Mérito dele que muito trabalhou, potenciando as suas qualidades entre os postes e na "mancha" e melhorando os outrora pontos fracos na saída aos cruzamentos e no jogo com os pés. Sem contestação, Rui é hoje o melhor guarda-redes do campeonato português e um dos melhores da Europa. Um valor seguro que se deseja poder, um dia, terminar a sua carreira em Alvalade, sem nunca ter jogado noutro clube.
Piccini: o italiano enganou-nos bem. Com um início titubiante, várias vozes se levantaram contra a sua contratação, conhecida que foi a dispensa de Schelotto. A verdade é que Piccini a todos tem conquistado, ele que teve uma estreia de fogo contra adversários do calibre de um Barcelona, Juventus, Porto ou Benfica. Em todos esses jogos cumpriu, inclusivé em Barcelona mostrou que se adapta com facilidade a um esquema de 3 centrais. O italiano talvez seja mais um defesa do que propriamente um lateral, no sentido em que não dá uma grande profundidade à equipa, mas tem uma leitura de jogo típica da escola transalpina, com grande cultura táctica, defende muito bem e executa diagonais no terreno que permitem um outro leque de desdobramentos ofensivos à equipa. Um bom jogador, ainda jovem, e que ainda nos vai render bom dinheiro.
Ristovski: uma boa alternativa a Piccini. Perde para o italiano em técnica, nomeadamente a de recepção de bola, ganha-lhe na profundidade que é capaz de dar ao jogo atacante leonino. Esta característica, no entanto, seria mais decisiva se o Sporting jogásse num 4-4-2, sistema que pede mais profundidade aos laterais. No actual sistema de 4-3-3, talvez se exija uma melhor leitura dos espaços interiores. Não defende mal, mas perde para Piccini em altura e envergadura física. De qualquer forma, outra boa contratação e um substituto à altura, quer para dar outro tipo de soluções à equipa, quer para garantir a rotatividade e proporcionar descanso à primeira opção.
Coates: o nosso Ministro da Defesa. O uruguaio parece ter isolado o calvário de lesões que o assolaram antes da chegada a Alvalade e constitui-se hoje como um dos baluartes da espinha dorsal leonina. Azares à parte (2 autogolos), Coates é o patrão da defesa, compensando alguma falta de velocidade de base com um excelente posicionamento no terreno. Forte no jogo aéreo nas duas áreas e com um excelente lançamento (de pé direito) desde lá atrás, o Ministro já contribuiu em 7 golos do Sporting, esta época. Jogador fundamental, de grande alma, merece a aposta que nele foi feita pelo presidente aquando do accionamento da cláusula de rescisão que tinha com o Sunderland.
Mathieu: o outro patrão da defesa leonina. O gaulês, de 33 anos, enganou todos aqueles que não quiseram (ou não souberam) fazer o trabalho de casa. Talvez sugestionados pela sua idade, os jornais apontavam-lhe falta de velocidade, a ele que tinha sido segundo classificado nesse item nos testes do Barça. Com excelente leitura dos lances, o que lhe permite antecipar muitas vezes o que fazer, Mathieu tem características de líbero, basculando em acelerações fortes na dobra aos seus colegas de sector. Como se já não chegassem estas qualidades, o francês é dotado de um soberbo pé esquerdo e gosta de subir no terreno com a bola controlada. Importante nas bolas paradas, seja por via dos livres que ele próprio executa (já marcou um golo de livre directo), seja pelo seu bom jogo de cabeça na área adversária, características que fazem com que já tenha contribuido para cinco golos. Jogador muito importante, mas que exige uma boa gestão de esforço, pelo que a forma como JJ conseguir promover a rotação será importante. Diria que, depois de Bruno Fernandes, é o jogador com mais classe do plantel do Sporting.
André Pinto: é, provavelmente, o melhor terceiro central da Primeira Liga. Tem jogo aéreo, bom posicionamento e boa leitura dos lances. Não tem a saída de bola dos outros dois centrais, nem a velocidade de Mathieu, aspectos limitativos, mas é um jogador interessante e que sempre que foi chamado não comprometeu. Uma boa contratação, importante pela sua boa integração no grupo e que dá garantias face a qualquer lesão dos agora titulares.
Fábio Coentrão: a gestão de esforço implementada por JJ parece estar a dar resultados. Quando se temia fadiga muscular, decorrente da ausência de rotação no posto devido à lesão de Jonathan, eis que Fábio surge cada vez mais solto e afoito nos movimentos atacantes. Prova disso, os 7 golos que já tiveram contribuição sua. Para além disso, percebe-se claramente que conhece muito bem os terrenos defensivos que pisa, que sabe encostar-se ao ala adversário e retirar-lhe espaço como ninguém nos últimos anos em Alvalade. Um jogador fundamental até ao final da época e que também tem um toque de classe.
William: há bons jogadores com má imprensa e outros assim-assim com boa imprensa. Não me interpretem mal, William, nos seus dias é um jogador insuperável no plano nacional. O que se passa é que a intensidade do seu jogo não está lá, nomeadamente na transição defensiva, a cobertura perfeita da bola na rotação do seu corpo por vezes vacila, originando perdas de bola à saída da nossa área e o passe tem-lhe saído incerto e mais para os lados, ele que era fenomenal no encontrar de soluções entrelinhas, através do seu passe vertical. William parece acusar algum desgaste e a ausência de competição para o lugar. Temo que a insistência de JJ por a sua colocação a "6", com Battaglia a "8" esteja a estragar duas posições. Na Luz, simplesmente, este duo não funcionou e a equipa ressentiu-se disso. Posto isto, o nosso capitão é um jogador que a qualquer momento pode voltar a elevar o seu nível de jogo, tornando-se assim imprescindível. Dependerá muito dessa evolução, o futuro do Sporting no campeonato.
Palhinha: já se percebeu que JJ não o põe a jogar por "dá cá aquela palha". Creio que o ex-sacavenense merecia mais oportunidades, ele que não joga, salvo erro, desde a partida contra o Barcelona em Alvalade. Os ciclos de motivação dos jogadores têm de ser mais bem explorados e Palhinha, após os dois golos em Oleiros, teve muito pouca utilização. Médio defensivo forte na marcação, de características diferentes das de William e mais parecidas com as de Danilo e de Fejsa, a sua utilização - para além de permitir algum descanso a William - permitiria soltar mais Battaglia (que parece muito amarrado tacticamente) ou mesmo Bruno Fernandes (no 4-4-2 com Podence).
Battaglia: o argentino provou a sua utilidade nos jogos da Champions, mas parece estar demasiadamente amarrado atrás, eventualmente por via da forma menos exuberante de William. Nos jogos de início de época surgiu mais envolvido nos movimentos atacantes, ele que já marcou 2 golos e que contribuiu para um total de 5 (contra 2 de William). Atrás, como "6", cumpriu com distinção enquanto William esteve de fora, como foram os casos das visitas a Guimarães (5-0) ou Bucareste (5-1). Um jogador de equipa, de grande alma e que, entrando de início ou substituindo alguém, é sempre solidário e tem uma boa atitude. Aliás, fala tão bem ou melhor fora do campo do que dentro das quatro-linhas.
Bruno César: jogador muito sacrificado em prol da equipa e algo injustiçado pelos adeptos. Sem velocidade base, Bruno é pêra doce para os adversários quando lançado em profundidade na ala esquerda. Por isso, com ele em campo, a equipa não estica tanto o jogo pelo seu flanco, mastiga-o mais e espera pelos seus movimentos interiores. Ele não é um ala, nem um lateral, é um médio interior, com uma razoável leitura de jogo e um óptimo remate, como o demonstra os quatro golos em 2 edições da Champions contra equipas do nível de um Real Madrid, Borussia Dortmund, Juventus ou até Olympiacos. Parece ser um jogador comprometido com a equipa, que faz bom banco, inteligente e útil na exploração de espaços interiores.
Bruno Fernandes: aquele movimento contra o Marítimo, em que vê uma bola potencialmente perdida, acredita, sente que lhe vai chegar primeiro que o adversário e, antes de tocar na bola, já incorporou dar as costas ao oponente, rodar e servir Bryan Ruiz - que sentiu pelo canto do olho desmarcar-se - é elucidativo do tipo de jogador que é. Bruno é, simplesmente, o elemento com maior classe do plantel leonino. Pode dizer-se que já nasceu para o futebol, tal a forma natural como encara jogar num clube com a pressão que um eterno candidato ao título confere. Há quem diga que perde muitas bolas. É verdade, como também não é falso que tal decorra de uma assunção de riscos não ao alcance de qualquer outro jogador. O maiato vê coisas em campo que outros olham, mas não vêem, essa é a realidade. Imprescindível, é o jogador mais influente da equipa com 30 contribuições nos golos, uma média de uma contribuição por cada 71 minutos jogados.
Gelson: no futebol, por vezes simplificar é o mais difícil. O ala leonino parece que tem uma velocidade a mais do que qualquer outro jogador, mas nem sempre conjuga bem as suas acelerações com o tempo certo de execução do drible ou do centro. Tem vindo a melhorar o seu jogo interior, as compensações defensivas e o remate. Já tem 9 golos marcados esta época, o que para um ala são números muito interessantes (Acuña tem apenas 5). Ainda vai melhorar mais como jogador e continuar a beneficiar muito do facto de jogar com melhores e mais experientes futebolistas, dada a crescente qualidade do plantel leonino. Fundamental para continuar a alimentar o sonho do título.
Acuña: o ala argentino chegou a Alvalade em sobrecarga de esforço. Ainda assim tem dado nas vistas pela sua robustez, força, protecção de bola, movimentos interiores e solidariedade defensiva. Não é um habilidoso, um virtuoso da finta, mas tem óptima técnica, nomeadamente de recepção, remate e cruzamento. Embora pense que o plantel teria a ganhar com a inclusão de um ala que assegurasse maior profundidade - Acuña tem dificuldade em chegar à linha pois não é rápido -, o argentino é sempre um elemento a contar no futuro, até pela leitura táctica que evidencia, nomeadamente necessária quando jogamos em 4-4-2 com Bruno Fernandes a "8" e ele, com os seus movimentos interiores, garante sempre um terceiro homem no centro.
Podence: tem na finta e na capacidade de cruzamento as suas melhores qualidades. Nos antípodas, a capacidade concretizadora e a velocidade (numa primeira leitura parece ser mais rápido do que efectivamente é). JJ vê nele um jogador de vir do centro para a ala (e não o contrário) e talvez não esteja errado nisso. A verdade é que provou contra o Portimonense que pode fazer a função e com brilhantismo. Devia treinar mais o remate à baliza, a fim de os seus números de eficácia atacante poderem subir. Ainda assim, sem golos, contribuiu até agora para 9 dos golos leoninos. Jogador a manter e a desenvolver, pois pode dar mais.
Bryan Ruiz: está a ter uma "second life" com Jesus, um remake da "Vida de Bryan", do grande ecrã para os relvados portugueses, onde também se joga em Belém. Parecia um caso perdido, mas deixou alguma esperança nos adeptos, essencialmente pela inteligente desmarcação e golo contra o Marítimo. Ainda a suscitar dúvida, um caso a rever.
Doumbia: não é o segundo avançado que pensei pudesse vir a ser. Antes, é um animal de área, cujos movimentos se circunscrevem a esse espaço. Fora de casa, pode ser uma arma lançado em contra-ataque. Perde para Dost no jogo aéreo - não só na área, mas também como farol das bolas despejadas pela defesa ou guardião - e na compreensão do jogo colectivo da equipa. Ainda assim tem-se revelado útil, marcando 2 golos na Champions e outros cinco nas Taças internas.
Bas Dost: o carteiro, o "flying dutchman", o bombardeiro, o goleador. Para além da sua capacidade concretizadora, Dost é um jogador de equipa, um gentleman, quase sempre o primeiro a chegar para abraçar um colega. Viu-se a efusividade com que se aprestou a festejar com Bryan Ruiz, consciente do que aquele momento poderia significar para o costa-riquenho - em termos de "turaround" de uma época - e, concomitantemente, também para a equipa. Não há volta a dar, marcar um golo tem um sinónimo: dostar. À atenção da Porto Editora, sempre sensível a este tipo de neologismos.
Fico-me por aqui. Os outros jogadores do plantel ainda não me convenceram tendo em conta o objectivo e, dos novos, vi e gostei de Wendel e Ruben Ribeiro, mas foi pela televisão. Aguardo com expectativa poder observá-los (também a Misic) ao vivo.