Muita polémica vem causando os já habituais assobios de adeptos leoninos quando ecoa no estádio o hino oficial da Champions e as equipas se encontram perfiladas no centro do terreno antes do início de cada jogo.
Eu gostaria de dizer que entendo o protesto: o escandaloso penálti assinalado a favor do Schalke ou os jogos com o CSKA ainda se encontram frescos na memória de muita gente e acontecimentos como os ocorridos durante o Sporting-Barcelona desta edição da Liga dos Campeões - em que vários dos nossos jogadores foram admoestados com pouco critério e a UEFA ainda agravou a situação, multando-nos por excesso de "amarelos" - não ajudam a atenuar esse sentimento de revolta. Mesmo o argumento daqueles que, muito respeitávelmente, consideram ser incongruente aceitar participar na prova e ter tal comportamento a mim não colhe, porque os adeptos têm direito à indignação e, apesar de tudo, o assobio é uma forma não violenta, logo admissível, de o manifestar.
Com o que eu não posso estar de acordo é com a forma utilizada: a música, mais ainda, a imortal composição de Handel, é uma forma de arte (entre outras) que sublima aquilo que é o melhor do ser humano e da nossa civilização. Ninguém, por não ser católico ou não gostar do Papa vai à Capela Sistina, no Vaticano, assobiar a pintura de Michelangelo. Os ancestrais inimigos dos egípcios não apupam as Pirâmides de Gizé, os paquistaneses não vão a Agra vaiar o Taj Mahal. Repudiar o momento em que o profano quase toca o sagrado é, em vez de louvar a excelência e o brilhantismo que o Homem pode atingir, regredir para tempos pré-históricos de barbárie.
Por isso faço aqui um apelo aos nossos adeptos: escolham outro momento para manifestar a Vossa (justa) revolta. Pode ser o momento em que o árbitro apite para o início do jogo, o final da primeira-parte, o recomeço (segunda-parte), o minuto exacto em que foi (mal) assinalada a penalidade a Jonathan em Gelsenkirchen ou outro qualquer que as claques julguem por bom, mas por favor não confundam os erros (ou outra coisa qualquer) perpetrados por gente que a espuma do tempo devorará da nossa memória com a grandiosidade da obra de um génio, a vitória da nossa civilização.
6 comentários
JHC 03.11.2017
Uma boa sugestão, caro Carlos Silva. Num completo silêncio durante o primeiro minuto de jogo, com a bola a rolar, apenas com as referidas tarjas espalhadas por todo o Estádio! Não há como ignorar uma mensagem destas.
A razão porque discordei consigo há pouco tinha a haver com isto: ultimamente, cada vez que vou a Alvalade sou abordado por diversos estrangeiros que também vão ao jogo, que me fazem inúmeras perguntas sobre o clube. Contra a Juventus acabei por levar à porta um casal de americanos da Califórnia . O que pensarão eles de um coro de assobios à composição de Handel? Entenderão isso como protesto ou como um acto sem sentido? Há alguém que não sinta essa música? Agora imagine que a um certo minuto as claques começam a assobiar ou simplesmente se faz um silêncio sepulcral e se levantam umas tarjas? Isso vai levantar a curiosidade (e não o desprezo) sobre a motivação de tal atitude. Será muito mais eficaz e visará a mensagem, não o mensageiro, no caso o 'pobre '(mas genial) do Handel. Alguém imagina a seguidilla ou lá habanera ser assobiada no Scala ? A Carmen que me perdoe , mas neste caso não deve dizer-se quem quem (s)cala consente.
Relendo o que escrevi percebo que não fui claro. Sou contra as assobiadelas durante o hino e que nada trazem de positivo. Nem a imagem internacional do Sporting, nem ao protesto que é completamente ignorado por quem desconhece as razões. Na minha opinião, os sportinguistas assobiam o hino sem pensar em Handel, ou na feliz escolha desta composição para representar os valores do desporto e a espectacularidade do "combate" entre as melhores equipas da Europa para encontrar o Campeão dos Campeões. Assobiam simplesmente a UEFA e os árbitros que claramente nos prejudicaram. Não estou a defender, apenas a constatar. Esperemos que alguém ao ler este blogue também prefira o silêncio sepulcral com tarjas e convença as claques. E aproveitem para desfrutar a emocionante adaptação de "Zadok the Priest" com o mesmo prazer com que entoam "O Mundo Sabe Que".
O Hino da Liga dos Campeões, como sabemos, é uma adaptação da música de Handel; estou convencido que mais de 90% dos adeptos desconhece a autoria do Hino. Lembro-me de alguém, visita cá de casa, que ao ouvir Handel, disse : eh pá, isso faz-me doer a cabeça".... por acaso é benfiquista, mas mera coincidência.
Sem ofensa, claro, apenas uma piadola. Hoje em dia quase que se tem de fazer um "disclaimer" dada a tensão (e ódio?) mostrada aqui pelo suspeito do costume.