Feliz Ano Novo
Bifanas em Agosto são como rosas em janeiro, incongruentes e extemporâneas. Mas as roulottes adivinham as enchentes melhor do que as gaivotas a preverem tempestades e lá estavam elas todas, debaixo do viaduto do metro, no dia em que a A2 para o Algarve dizem que entupiu de trânsito estival. Até a predilecta “Raínha das bifanas”, a última, já na borda da estrada, tão difícil que foi atingi-la pelo meio da massa de mastigadores, como noutro dia qualquer de campeonato.
O ano começa quando uma pessoa quiser. No fundo, celebra-se o convencional S. Valentim só para não estorvar a alegria dos outros. O Ano Novo inicia-se verdadeira e secretamente depois das férias grandes, depois das tardes de sesta e ócio serem entretidas com grandes resoluções que juramos acatar, mesmo se ao cabo do primeiro dia de trabalho voltarmos a ter um cigarro na boca.
Isto é assim para os profanos, claro, porque nós, pagãos, éramos quase 40.000 em Alvalade, a desdenhar o ritual das férias e as delícias do verão, por troca com este fervor, que queima sempre, mesmo quando não arde.
O jogo de apresentação é o mais leve e esperançoso do ano. Por uma vez, não subimos ao estádio para sofrer o resultado, mas para apreciar as promessas reservadas pelos jogadores que trazem um número novo nas costas da camisola – quem é aquele espigado com o nº 20 do Quaresma? É o Bryan Ruiz; e aquele de rabo-de-cavalo cheio de peitaça? Ruben Semedo. E o João Pereira, um Telémaco de regresso dois anos depois e ainda com contas por acertar com quem quer que lhe apareça pela frente. Na segunda parte surpreendeu Carlos Mané. Será do novo corte da camisola que lhe dá ombros mais largos, de pai de família, mas também se viu nele um pisar diferente, menos juvenil e experimental; duas ou três coisas que fez tiveram ares de premeditação, de jogador mordaz em vez de traquinas – que ilusões nos guardará?
Agora de verde, Jesus costura toda a linha lateral esbracejando às diagonais dos médios como Karajan no primeiro movimento da 5ª; nos anos passados parecia, obviamente, histriónico. Já declinava a tarde, já tínhamos tanto que admirar, desde as triangulações instintivas, como se Euclides fosse treinador-adjunto, até ao gregarismo espartano da equipa em campo, cada bola uma refrega, e eis que Octávio Machado emerge do banco, de aspecto benevolente, com uma barriga agrícola a despontar debaixo do fato novo de director.
O Sporting 2015-2016, definitivamente, não é para meninos. Feliz Ano Novo.