Domínio indiscutível do princípio ao fim
Sporting, 3 - Boavista, 0
Nuno Santos, herói do jogo: possível golo do ano para mais tarde recordar
Foto: Manuel de Almeida / Lusa
Quem pensava que o Sporting estava sem energia física ou anímica, após o embate em casa contra o Arsenal, três dias antes, enganou-se redondamente: esta foi uma das nossas melhores exibições no campeonato 2022/2023. Na recepção à equipa que costuma jogar de xadrez mas que anteontem envergou de amarelo, dominámos do primeiro ao último minuto.
E logo no primeiro minuto, precisamente, poderíamos ter marcado. Chermiti, bem servido por Morita, atirou a bola lá para o ninho da coruja, mas o matulão Bracalli, guarda-redes veterano da equipa tripeira, defendeu por instinto, desviando-a para a barra.
Estava dado o mote: era carregar até marcar. Podia ter sido novamente por Chermiti, que aos 13' rematou rasteiro, a rasar o poste. Ou por Esgaio, que teve a baliza à sua mercê, ao segundo poste, com trivela assinada por Nuno Santos em jeito de assistência - permitindo, também ele, a intervenção do guardião brasileiro do Boavista.
Aos 17', porém, não houve salvação possível para a turma forasteira. Nuno Santos, servido por Edwards em posição frontal, marcou um belíssimo golo de letra, fazendo-a anichar lá no fundo das redes. Um daqueles golos dignos de levantar qualquer estádio. O mais belo golo da carreira do campeão leonino. Um dos mais belos golos que já vi alguém marcar no nosso estádio. Já candidato, ainda em Março, a golo do ano.
A partir daí, talvez alguém esperasse uma reacção - mesmo tímida - do Boavista. Nada disso. Continuaram acantonados lá no reduto deles, sem ousarem uma só acção ofensiva. Fiéis à imagem de marca do treinador Petit, que apenas sabe jogar com ferrolho.
Nós cumpríamos o nosso papel: queríamos ampliar a vantagem. Insistimos, insistimos - e marcámos o segundo. Novamente com intervenção de Nuno Santos a centrar da esquerda para o meio. Pretendia fazê-la chegar a Pedro Gonçalves, que andava errante na linha dianteira, mas o boavisteiro Salvador Agra intrometeu-se e resolveu o assunto - a nosso favor, com um vistoso autogolo.
Assim se foi para o intervalo. Sem um remate da equipa adversária, já antevendo um resultado vitorioso neste embate, quatro dias antes da nossa difícil deslocação a Londres, onde defrontaremos o líder da Premier League. O Arsenal estará lá, à nossa espera, para tentar vingar o 2-2 da primeira mão, nos oitavos da Liga Europa.
Fomos retirando o pé do acelerador. Mas sem nunca afrouxar demasiado, nem consentir veleidades ofensivas aos forasteiros. Israel, estreia absoluta na nossa baliza no campeonato, nunca chegou a ser verdadeiramente incomodado. Ugarte e Morita, no meio-campo, iam limpando tudo. Edwards colocava em sentido os defesas contrários. E Nuno Santos tentou repetir a graça, aos 48', 63' e 68'. Não conseguiu, nem era necessário: já tinha garantido um dos mais espectaculares golos do ano na Europa.
Seguiram-se as substituições. Matheus Reis e Pedro Gonçalves deram lugar a Gonçalo Inácio e Trincão. Depois Edwards saiu para entrar Arthur enquanto Paulinho rendia o buliçoso Chermiti. Finalmente, mesmo à beira do fim, foi a vez de entrar Tanlongo para que Ugarte descansasse alguns minutos.
Nesta fase, o árbitro João Pinheiro voltou a mostrar toda a sua incompetência - reiterada em cada jogo que temos o azar de o encontrar de apito na boca. Desta vez, aos 59', fez vista grossa a um claro derrube em falta de Trincão, dentro da grande área boavisteira. Ficou por marcar um penálti a nosso favor e a exibição de um cartão vermelho ao infractor, Pedro Malheiro. Mais do mesmo: já ninguém se surpreende.
Antes de o jogo terminar, ainda houve tempo para marcarmos o terceiro. Fabuloso passe longo de Tanlongo, desenhando uma diagonal perfeita para Esgaio apanhar lá na ponta direita, com uma recepção que não está ao alcance de qualquer um, e centrar com precisão milimétrica para Paulinho encostar, Bracalli já batido.
Caía o pano com 3-0 a nosso favor. Quarto jogo a ganhar, terceiro sem sofrer golos, mais oito pontos nesta segunda volta do que nos embates com as mesmas equipas nossas antagonistas na metade inicial do campeonato.
Será um sinal de que as coisas andam a mudar para melhor? É evidente que sim.
Breve análise dos jogadores:
Israel - Estreia absoluta entre os postes leoninos num jogo do campeonato nacional de futebol, colmatando a ausência de Adán. Não pareceu nada intimidado com este súbito encargo.
Diomande - Ninguém diria que só tem 19 anos e é um recém-chegado à nossa equipa. Assumiu sem complexos a posição de central à direita, libertando Esgaio no corredor. Muito seguro.
Coates - Igual a si próprio, comandou o trio defensivo com a tranquilidade do costume. Sem exuberância, sem dar muito nas vistas, mas assegurando o essencial. Grande corte aos 78'.
Matheus Reis - Regresso ao onze para outra exibição em que confirmou ser extremamente útil. Nuno Santos só se atreveu tanto à frente porque tinha o brasileiro a vigiar muito bem a ala.
Esgaio - Uma das suas melhores exibições desde que voltou ao Sporting. Mandou um petardo à barra (52'), falhando o golo por centímetros. Assistiu no terceiro, de modo impecável.
Ugarte - Domínio perfeito do espaço, domínio perfeito do tempo de intervenção. Duas características do internacional uruguaio, que funcionou como tampão no nosso meio-campo.
Morita - Cada vez mais robusto do ponto de vista físico, aguentou sem mácula os 90', compondo uma parceria muito sólida com Ugarte. Fundamental na ligação ao ataque.
Nuno Santos - Golo de antologia: é quase imperdoável não ser convocado para a selecção nacional. Ainda foi ele a assistir no autogolo de Salvador Agra (43'). Pulmão inesgotável.
Edwards - Cada vez mais influente, cada vez com maior resistência física. Participou na construção do primeiro golo, servindo Nuno Santos. E ofereceu-lhe outro, desperdiçado, aos 63'.
Pedro Gonçalves - Voltou a actuar no trio da frente. Foi o nosso jogador com maior precisão de passe (91%), algo que só no estádio se viu bem. Acusou algum cansaço, acabou por sair cedo.
Chermiti - Deu sempre trabalho à defesa adversária, com as suas constantes movimentações na área. Quase marcava logo no minuto 1: Bracalli fez a defesa da noite, desviando para a barra.
Gonçalo Inácio - Substituiu Matheus Reis aos 57'. Quatro minutos depois, por aparente desconcentração, perdeu a bola em zona proibida, o que esteve quase a custar-nos um golo.
Trincão - Rendeu Pedro Gonçalves aos 57'. Entrou com maior consistência e dinamismo do que nos tem habituado. Aos 59', sofreu penálti nítido que o árbitro Pinheiro decidiu não sancionar.
Arthur - Entrou aos 57', substituindo Edwards. Alinhou, tal como ele, encostado à linha direita. Mas foi muito mais frágil e bastante menos eficaz. Agarrado demasiado à bola, inconsequente.
Paulinho - Substituiu Chermiti aos 72', quando o Sporting já se preocupava mais em fazer gestão do tempo com domínio de bola. Mas ainda foi capaz de marcar o terceiro, aos 90'+3.
Tanlongo - Em campo desde o minuto 84', quando substituiu Ugarte, destacou-se por um magistral passe longo de 40 metros que deu início ao nosso terceiro golo. Promete.