Dilemas de uma sportinguista
Uma Mami esteve a ver o jogo do Sporting, sozinha como se quer nestas coisas que aceleram o coração e transformam, durante noventa minutos, uma pessoa sensata e tranquila num Gru (do fabuloso Despicable me). De vez em quando (leia-se quando jogam os leões) é preciso abandonar a razão e entregar-se à emoção.
As teenagers que me habitam a casa (e me conhecem os humores) dividiram-se entre uma conversa (de horas) ao telefone com o namorado e uma ocupação mais ou menos selvagem da minha cama.
Muitas Mamis têm a ambição mais ou menos disfarçada que os filhos sigam uma profissão que lhes agrade – política não, política não, please – mas nem sempre a verbalizam. Porém, quando se trata de futebol o desejo não é nada secreto: o que eu queria mesmo era que as teenagers – que vestem a minha roupa, calçam os meus sapatos e usam meu perfume – vestissem a camisola do Sporting. Tento explicar-lhe que o Sporting transporta a sina de ser um verbo conjugado no futuro. Há algo mais sedutor do que a possibilidade?
Apesar do meu vasto repertório de doutrinação nada feito, as duas (note to self: será que isto é motivo suficiente para as deserdar ?) apoiam equipas alemãs, por isso cartão vermelho e expulsão da sala quando joga a minha paixão.
Se a vitória tem pouca graça na literatura e no cinema, sendo a derrota mais fértil, fotogénica e rica em interpretações, já no futebol valem outros cânones. Após o jogo subi para o quarto feliz como alguém que acaba de receber o iPhone 6 (para os que não gostam da Apple leia-se feliz como alguém a quem colocaram sobre a mesa um petit gateau com framboesas, ou feliz com alguém que teve bom sexo), afasto o lençol para me deitar e noto que a cama encolheu. Literalmente. Além da teen mais nova, que dorme a sono solto, encontro uma tartaruga, um coelho, um mignon e um urso. Na mesa de cabeceira uma nota: “não vais expulsar os meus bonecos da cama, pois não, Mami querida? Eles são do Sporting”.
Razão tinha o Nelson Rodrigues quando dizia que mesmo “a mais sórdida pelada é de uma complexidade shakesperiana”.
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