A ver o Europeu (4)
Um jogo atípico. A pior primeira parte e a melhor segunda parte de Portugal neste Europeu - excepto os dez minutos finais, que foram para esquecer. Com um balanço nada adequado aos nossos pergaminhos: três jogos, três empates frente a selecções que nunca conseguiram derrotar-nos. Terminamos a fase de grupos com apenas três pontos. Com vitórias em vez de empates, poderíamos ter nove.
O nó que hoje ficou por desatar deveu-se sobretudo ao descalabro do nosso quarteto defensivo, embora com diferentes responsabilidades na repartição de culpas. Os laterais fizeram o pleno pela negativa: nem souberam fechar o corredor a defender, nem conseguiram rasgá-lo a atacar.
Esta foi a faceta pior do Portugal-Hungria, disputado hoje em Lyon, no maior recente estádio francês, em tarde de calor e sol. O melhor foi Cristiano Ronaldo, que se mostrou enfim ao seu verdadeiro nível nesta partida: marcou dois dos nossos três golos, aos 50' e aos 62', e ainda foi dele a assistência para o inicial, muito bem apontado por Nani aos 42'. O primeiro dele, marcado com o calcanhar, foi uma obra de arte. Candidata-se desde já a melhor golo do Euro 2016.
Ao bisar desta forma, Ronaldo torna-se o maior goleador em fases finais de mundiais e europeus - e vão sete certames consecutivos a facturar. Torna-se também o segundo melhor marcador de campeonatos da Europa, já com oito golos - menos um que Michel Platini, ainda recordista com os nove que marcou pela França no Euro 84.
Dir-se-á que tudo está bem quando acaba bem: para já conseguimos alcançar o nosso primeiro objectivo - o acesso aos oitavos-de-final, em que defrontaremos a poderosa Croácia. O jogo será este sábado, às 20 horas. Sabendo-se desde já que os portugueses terão menos 24 horas de descanso que os croatas, ontem vitoriosos perante uma Espanha frágil e desarticulada.
Enfim, até agora não ganhámos nem perdemos - o que denota falta de ambição da selecção das quinas. Limitámo-nos a cumprir os mínimos. E com alguma sorte à mistura: a Hungria ainda nos enviou uma bola ao poste.
Transitamos para os oitavos mas sem termos conseguido melhor do que o terceiro lugar no nosso grupo, atrás de islandeses e húngaros. E até podíamos ter sido os primeiros se não fosse a insólita falta de ambição revelada por Fernando Santos, que mandou a equipa recuar a dez minutos do apito final quando dominávamos a Hungria - hoje desfalcada de quatro titulares - e o resultado estava 3-3. Bastaria mais um para sairmos vencedores. Do jogo e do grupo.
Estranhamente, o seleccionador trocou Nani por Danilo, reforçando o nosso meio-campo defensivo e dando sinal aos jogadores de que a ordem não era para avançar mas para recuar no terreno.
A partir daí todos se conformaram. E o jogo terminou de forma penosa, com uns e outros aparentando querer sair de campo mais cedo do que o relógio determinava. Notória falta de ambição. Uma lamentável falta de respeito pelos portugueses que continuam a apoiar esta selecção nos mais recônditos recantos do globo.
Portugal, 3 - Hungria, 3
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Os jogadores portugueses, um a um:
Rui Patrício - Ao contrário do que o resultado final indicia, não teve má prestação em campo. Simplesmente não podia ter feito melhor em nenhum dos golos. Esticou-se bem em qualquer dos casos, mas eram remates indefensáveis.
Vieirinha - Outra exibição muito apagada do nosso lateral direito, em défice ofensivo e defensivo. O pior são os centros, que continuam a sair-lhe de forma deficiente: ou remata contra os adversários ou cruza para terra de ninguém.
Pepe - Prestação oscilante. Saiu várias vezes de posição e revelou desentendimentos pontuais com Ricardo Carvalho. Alguns cortes deficientes, vários passes desperdiçados. Mas cavou o livre de que resultou o nosso primeiro golo.
Ricardo Carvalho - O menos mau do nosso quarteto defensivo, embora sem revelar o fulgor de partidas anteriores. Deu a sensação de que podia ter feito melhor no segundo golo que sofremos.
Eliseu - Rendeu Raphael Guerreiro devido a problemas físicos do lateral esquerdo titular. Tímido a atacar, inseguro a defender. Ao perder a bola proporciona o primeiro golo húngaro. No terceiro, não cobre o rematador como devia.
William Carvalho - Pouco influente na manobra ofensiva durante a primeira parte, melhorou de rendimento na etapa complementar, soltando-se, quando Fernando Santos percebeu enfim que Moutinho e André Gomes precisavam de sair.
Moutinho - Confirma-se: não está em forma. Por isso se estranha a insistência do seleccionador em fazê-lo alinhar enquanto deixa Adrien e Rafa no banco. Hoje só actuou no primeiro tempo. Esteve 45 minutos a mais em campo.
André Gomes - Em notória má forma física, errou muitos passes e andou escondido naquele confuso meio-campo português. Deu lugar a Quaresma aos 61' - e logo se percebeu a diferença. Custa entender porque foi hoje titular.
João Mário - De longe o melhor do nosso meio-campo. Mas isso só se tornou evidente na segunda parte, quando Moutinho e André Gomes já tinham saído. Aí carregou no acelerador e fez uma assistência primorosa para o primeiro golo de Ronaldo.
Nani - Ao contrário dos colegas, destacou-se mais na primeira parte - onde foi o melhor português em campo. Fez o golo do empate (1-1) aos 42'. E vão 20, em 99 desafios ao serviço da selecção. Esgotado, cedeu o lugar a Danilo aos 81'.
Cristiano Ronaldo - Uma partida quase perfeita do nosso capitão: dois golos marcados - um deles de calcanhar - e uma assistência para o de Nani. Foi ele que fez a diferença. Faltou-lhe apenas acertar nos livres: só um, defendido in extremis aos 29', levava selo de golo.
Renato Sanches - Voltou a ser suplente utilizado, rendendo Moutinho aos 46'. Superior ao colega, o que não era difícil, mas começou inseguro e demorou a encontrar posição em campo. Bom lance individual aos 57'. Um passe rasgado para Ronaldo aos 80'.
Quaresma - Está em excelente forma, o que voltou a confirmar-se frente à Hungria. Entrou aos 61', para substituir o apático André Gomes, e no minuto seguinte já estava a servir Ronaldo para o segundo golo - terceiro de Portugal.
Danilo - Substituição incompreensível. Saltou do banco aos 81', para reforçar o bloco defensivo, quando Portugal dominava e nos bastaria mais um golo para vencer e subir ao primeiro lugar no grupo. Não esteve mal. Mas entrou para quê?