A noite em que o rapaz se fez homem
Os números, nomeadamente as estatísticas, só têm valor se os soubermos interpretar e se soubermos interpretá-los depois e não antes de bem afinados, de modo a darem uma visão o mais próxima possível da realidade e não a visão que se gostaria ter dela.
É provável que os números da actuação de ontem de Nuno Mendes mostrem um resultado abaixo da média, se não mesmo sofrível, sobretudo nas acções ofensivas. Maus passes - aquele a meio da segunda parte oferecendo a bola a um meio-campista adversário isolado... - decisões infrutíferas e erradas, como aquela cavalgada inconsequente e obstinada até à linha final, muito poderá haver que possa apoucar o que Nuno Mendes fez em campo.
E, no entanto, arrisco dizer que ele foi o herói do jogo. Um chavalo que há um ano jogava à bola de fraldas nos juniores, apanhou ontem de frente com Corona, que dizem ser o craque do fêcêpê e é um malandro de primeira a cavar faltas e a pontapear tornozelos, com Manafá, elogiado pela velocidade e drible, com Francisco Conceição, um notável mergulhador e gabado como a coisa mais extraordinária que apareceu no mundo sublunar depois de Messi. E ainda viu Uribe, o manhoso, descair para o lado dele e ainda teve tempo para ajudar Feddal a lidar com Marega. Tudo isto depois de ser intimidado com um cartão amarelo logo de início.
Fleumático, tudo Nuno Mendes conteve e superou sem um queixume ou um desfalecimento até à exaustão. Ele é a imagem da resiliência, da disciplina, da concentração, do tino e da maturidade precoce deste Sporting de Rúben Amorim. No futuro, quando ele jogar ao mais alto nível a que está prometido, se for preciso definir um momento em que Nuno Mendes se crismou como futebolista de craveira, bem se poderia apontar para o desafio de ontem.