A mulher de César
Tudo começou numa Junta de Freguesia de um concelho às portas de Lisboa.
Aproveitando uma abertura na Lei, um relapso membro da Assembleia de Freguesia, pede escusa do seu emprego para exercer funções de fisioterapeuta num clube da margem do Sado.
Pela mão do seu irmão, dirigente de um clube da segunda circular em Lisboa, é convidado para chefe do departamento clínico, cargo que segundo os especialistas exerce com competência.
Após uma desgraçada e triste investida de alguns energúmenos a mando sabe-se lá de quem, ao centro de treinos, o clube entrou em parafuso e sem saber ler nem escrever, o relapso nessa altura ex-membro da AF, acabou em presidente desse clube, sendo eleito de forma sui generis, com menos eleitores, mas mais votos que o seu adversário mais directo. Um sistema eleitoral também ele sui generis e que urge alterar, mas não é disso que hoje aqui se quer falar.
E começaram as ligações perigosas.
Manda a Lei e o bom senso, que neste particular deveria ter ainda mais força que a própria Lei, que a mulher de César não seja apenas séria mas que, mais importante, também pareça séria.
Assim, o irmão do nóvel presidente entretanto reeleito para um segundo mandato com uma vantagem abissal sobre o candidato "da oposição", o irmão dizia eu, ao que consta é advogado e consultor na empresa que avaliza e avança dinheiro sobre o contrato da NOS para os direitos de transmissão. É ilegal? Não! É sério? Será, eventualmente, não faço ideia. Era necessário? Definitivamente não, há um evidente conflito de interesses.
Entretanto o ex-"autarca" tornou-se proprietário de clínicas do ramo da fisiologia e fisioterapia e coisas assim, ligadas à recuperação física, sendo acusado de fornecer serviços ao clube e SAD, nessa mesma área. O próprio garante, através do seu órgão oficial, o jornal Record, que não há qualquer ligação entre as suas clínicas e o clube. No entanto é sabido que profissionais das suas clínicas prestam serviço ao clube a que preside. É ilegal? Não! É sério? Será, eventualmente, mas definitivamente não era necessário. Do ponto de vista do conflito de interesses há matéria para um Mundo de especulação, desde logo um que ressalta à vista e que é este: Será que o facto de estes técnicos estarem ao mesmo tempo no clube funciona como complemento salarial ao que auferem nas clínicas de Varandas? Será que o facto de serem funcionários das clínicas lhes dá vantagem no acesso aos cargos que exercem no clube/SAD?
E o que dizer dos terrenos onde estava o antigo estádio? Alguém explica porque é que tendo o clube direito de preferência na reversão da venda, deixou escapar um negócio de milhões? Terá sido porque também aqui havia conflito de interesses, i.e. administradores das empresas em causa sendo em simultâneo dirigentes do clube?
Há uma nuvem muito escura que escusadamente paira sobre a zona e que poderia ser afastada com a maior das facilidades, bastava que a mulher de César parecesse ser séria, admitindo sem qualquer rebuço que o é e afastar a suspeita clara de conflito de interesses. Seria de bom tom.