A fina flor do entulho
Em 1987 Paulo Futre ficou no 2º lugar na votação para a Bola de Ouro, o prémio do France Football para melhor jogador. Gullit ganhou (106 votos), Futre teve 91. Depois? Butragueno [o "dono da quinta", hoje director no Real] (61), Michel (agora falado como hipótese para treinador do Real) (31), Lineker (o monstruoso goleador, ainda hoje sempre ouvido no futebol inglês) (13), John Barnes (10), Marco Van Basten (ex-seleccionador holandês) (10), Vialli (9), Bryan Robson (7), e por aí adiante ... Gullit estava no Milan e muito isso terá contribuído para vitória, a qual não apouco, o homem era um jogador extraordinário. Mas também o era Paulo Futre, que acabara de ganhar a Taça dos Campeões Europeus. Mas, naqueles tempos, de outra exposição mediática internacional dos portugueses, ainda por cima ele transferira-se para um então secundário Atlético de Madrid. Pouco importa agora se mereceu ganhar ou não. Era uma estrela internacional. E se a sua carreira não foi ainda mais brilhante deveu-se decerto aos rumos que teve: demasiados anos no seu Atlético de Madrid, em tempos cinzentos do clube; lesões quando já maduro partiu para o campeonato italiano, então o maior palco. Depois, já retirado, foi director desportivo do Atlético de Madrid.
Sim, saiu do Sporting em conflito, mas a história está tantas vezes contada que não vale a pena regressar a ela. Foi um erro histórico de gestão. Não me parece que isso menorize, tantas décadas passadas, a importância que Futre teve no futebol português, de longe o melhor e mais célebre jogador da sua geração. E a sua representatividade no Sporting. Penso que a sua foto como "bola de prata", ainda para mais nessas condições, deveria ser afixada em Alvalade, ao lado daquelas de Figo e Cristiano Ronaldo que servem como paisagem nas fotos oficiais, como símbolos do reconhecimento internacional que a formação sportinguista tem tido nas últimas 4 décadas.
Estou a defendê-lo como candidato a presidente do Sporting ou como director desportivo do clube? Não. Não me compete. Estou a lembrar Paulo Futre, como património do futebol e do próprio clube.
Há 30 anos Sousa Cintra ascendeu a presidente do Sporting, assim se concluindo a difícil transição após a partida de João Rocha, um grande presidente, porventura o maior que o clube teve. Tal como Rocha, Cintra é um self made man, coisa que ofende alguns que julgam que um "senhor" é o que lhes lembra o que leram (quando liam) nos livros da Condessa de Ségur, e que se pelam por brasões e consoantes excêntricas nos nomes (se forem consoantes duplas então é-lhes orgástico). Sem perceberem que isso são nomes e símbolos que nada mais representam do que ser descendente de contrabandistas de origem transpirenaica ou de negreiros luso-brasileiros, (re)instalados em Lisboa e no Porto durante XIX. Ou seja, que são símbolos e nomes que mostram que se descende de self made men. Enfim, Cintra foi um bom presidente, um pouco patusco na sua forma descomplexada de se exprimir, mas segurou o clube numa altura bem difícil. Como homem de negócios é muito resmungado (eu quase desmaiei quando soube que ia esburacar ao largo da costa em busca de petróleo, mas não sei se tinha justificação para tal). Mas, e deixemo-nos de coisas, nos 25 anos que se seguiram à sua presidência nunca ouvi que tivesse agido com dolo, em prejuízo do clube.
Estou a defendê-lo como futuro presidente? Como actual presidente da SAD? Não. Estou apenas a lembrar-me do que vi na TV no sábado passado. A doutora Elsa Judas, associada que havia sido cooptada para um órgão dirigente oficioso pelo ex-presidente Bruno de Carvalho, dizer nas cercanias do pavilhão onde decorria a assembleia-geral que depois da votação todos teriam que aceitar os resultados, e a partir do dia seguinte continuar o Sporting em unidade, esquecendo as diferentes opiniões.
Agora, resultados conhecidos, dia seguinte passado, a associada Elsa Judas escreve isto sobre estes dois vultos: "a fina flor do entulho". Este é o espírito truculento, insultuoso, infértil, e (visivelmente) errático, que vigorou sob Bruno de Carvalho. E seus apaniguados. A doutora Elsa Judas terá os seus méritos como jurista (ao que li como colega do doutor Fernando Seara, comentador futebolístico, autarca e jurista). E será uma aguerrida e apaixonada sportinguista. Mas compara-se, no historial do clube, a Futre ou Cintra, para se atrever a este tipo de "bocas"? E com que fundamento? Que críticas substantivas haverá a fazer a estes dois indivíduos? Que fizeram eles recentemente que prejudicasse o clube (quanto muito, alguns mais radicais acusá-los-ão de ... terem apoiado Bruno de Carvalho).
Judas demonstra bem, neste seu evidente atrevimento, o pouco que restou do carvalhismo. Este estertor, carregado de fel. Está na altura da imprensa, e de nós, nas redes sociais e nos blogs, deixarmos de ecoar esta gente, dar-lhes o silêncio devido. E assim deixarmos definhar esta fina flor do entulho.