Jean-Paul Sartre, filósofo francês do século XX, existencialista por militância e convicção, disse uma vez que “o inferno são os outros”. Na lógica do seu raciocínio estava presente a ideia de que todas as pessoas são únicas e, como tal, têm projectos diferentes e isso faz com que surjam conflitos sempre que os projectos se sobrepõem.
Por outro lado, como diferentes que somos temos a capacidade de opção e, aqui também, nem sempre as nossas escolhas são as mesmas de quem está à nossa volta. É por isso também que Sartre refere que “o inferno são os outros”. São eles que estão no nosso caminho, no nosso projecto, na nossa escolha e tantas vezes nos condicionam e nos impedem de avançar.
No Sporting, não sei se o inferno são os outros ou se os demónios se instalaram em Alvalade e teimam em não sair. Na semana passada e pela primeira vez desde que me lembro, fomos afastados da Liga Europa ainda na fase de Grupos. Do campeonato é bom nem falarmos.
Não ganhamos um título nacional há uma década. Nos últimos anos, se formos a ver bem, mudámos de treinador. Várias vezes. Mudámos de Presidente. De estratégia. De jogadores. Investimos muito. Vendemos activos. E, mesmo assim, as vitórias tendem em não aparecer.
E antigamente havia ainda o síndrome do Natal, recordam-se? O Sporting aguentava nos lugares cimeiros da tabela mais ou menos até Dezembro e, a partir de Janeiro, era um sobe e desce constante de posição que nos inviabilizava a conquista do campeonato.
O Príncipe de Falconeri, da magistral obra Il Gattopardo, de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, a uma dada altura sugere que “tudo deve mudar para que tudo fique como está”. Defendo a estabilidade, o não pensar-se em soluções que nos podem sair caras. O não ir atrás de velhos do Restelo que, às vezes parece, estão empenhados em vender-nos ou impor-nos uma suposta mudança para que tudo fique na mesma.
Gostava de ser mágico e ter aqui a solução ideal. Não tenho. Não faço a menor ideia como o Sporting irá sair do atoleiro em que se encontra. Apenas sei, ao contrário do que defendia Sartre, que o inferno nem sempre são os outros. Nós próprios somos, por vezes, o nosso pior pesadelo.
Durante quase duas semanas as expectativas dos bloggers que escrevem no És a Nossa Fé estavam em alta. No final de contas, não é todos os dias que se consegue chegar à fala com um dos nossos ídolos de infância/juventude futebolística e, ainda para mais, quando o próprio acede em jantar connosco, em encontros que, diga-se, são sempre de uma animada tertúlia sportinguista.
Falei com o Manuel Fernandes – se preciso de explicar quem é, então o leitor devia estar a ler o jornal do outro clube da 2ª circular – e convidei-o para o nosso jantar. Prontamente acedeu. Ainda tentei que levasse consigo o Jordão, com quem Manuel Fernandes partilhou jogos memoráveis que estão gravados em todos os sportinguistas. O Jordão é sempre mais difícil, sabíamos isso, – Jordão: se por acaso estiver a ler estas linhas, saiba, desde já, que é sempre convidado – mas o Manuel acedeu de imediato.
Avisados os membros do blog, marcou-se o jantar. Um imprevisto de última hora impediu o Manuel Fernandes de estar connosco, mas prontamente se disponibilizou para o próximo que ocorra. Tivemos um jantar agradável, falámos de futebol e do Sporting. Expliquei os motivos da ausência do Manuel Fernandes aos meus companheiros de escrita e pude ver a tristeza espelhada nos seus rostos. Tal como eu, muitos dos nossos escribas cresceram a admirar o Manuel...
Queria aproveitar este espaço para lhe dizer, Manuel: houve pessoas que trouxeram cachecóis, outros camisolas para o Manuel Fernandes assinar. As máquinas fotográficas estavam prontas para registar o momento. Sei que haverá certamente uma nova oportunidade para falarmos do passado e ouvirmos, em discurso directo e na primeira pessoa, os tempos épicos do Sporting nos anos 80. Mas queria apenas dizer-lhe, num registo mais pessoal, que nos fez falta! Para a próxima, contamos consigo?
No domingo, com a vitória sobre o Sporting de Braga, voltou o optimismo ou, pelo menos, o caminho para o optimismo. Claro está que esta vitória teria que ser manchada com acusações de reuniões, árbitros, favores e favorecimentos. Como sportinguistas estamos à vontade. Não temos por hábito oferecer fruta. Ou legumes, for the sake of argument. E todos nós bem sabemos as roubalheiras ostensivas a que estamos sujeitos em campo.
Claro está que a coisa este ano não está a correr bem. Esta semana, com a vitória sobre o Braga subimos quatro lugares – do 13º para o 9º - e estamos felizes como se tivéssemos ganho o campeonato. Ou, pelo menos, ao slb. Mas, no meio desta suposta euforia, há algo que não nos podemos mesmo esquecer e que esta Direcção muito subrepticiamente fez questão de lembrar ao Braga e ao seu Presidente. Discutiu-se muito ao longo da semana se o Sporting ainda mereceria o epíteto de “grande”, e que o jogo de Domingo seria o tira-teimas, porque afinal estávamos a disputar uma vitória com o Braga que, diga-se, tem feito um caminho consistente.
Ingenuamente (ou talvez não), o Presidente do Sporting de Braga aceitou o convite de Luís Godinho Lopes e foi visitar o nosso Museu. E aí terá certamente percebido a grandeza deste grande Clube, passe aqui a redundância. Troféus, História, Raça.
Não nos vamos enganar. Estamos aqui desde 1906. Já ganhámos. Muito. Já perdemos. Já vivemos crises e euforias, já fomos felizes e já fomos tristes. Mas somos grandes. Seremos sempre. Porque pertencemos ao melhor Clube do mundo. O que passámos esta época pode ter terminado no passado domingo. Ou não. Mas, qualquer que seja o seu desfecho, acredito que será um apontamento na História do Sporting.
Discutir se somos ou não grandes, se pertencemos à elite do futebol não tem qualquer fundamento. Faz lembrar a história da formiga que quer bater no elefante... Os nossos opositores e adversários têm mesmo de começar a ter a noção do ridículo.
Estas são, seguramente, as linhas mais difíceis que escrevo desde que iniciei a colaboração no nosso jornal. Sou, tendencialmente, optimista, e acredito, sempre, que depois da tempestade vem o bom tempo. Tenho escrito aqui, fundamentalmente, sobre o nosso passado, as minhas memórias de infância, o porquê de ser do Sporting e a razão que me leva, sempre que a vida me permite, a acompanhar a Equipa. E a sofrer pelos nossos rapazes.
Venderam-nos a ideia que a Equipa é bestial, que apenas precisa de tempo. Que os sucessivos treinadores foram apostas que não resultaram. E o próximo que se seguia ia fazer o milagre que todos ansiávamos. E vamos ser honestos: parte de nós, ainda quer acreditar que Vercauteren vai dar a volta à coisa e conseguir retirar o Sporting das capas dos jornais pelos piores motivos. E que a Equipa maravilha que temos há-de conseguir trabalhar em campo como um todo e não como vedetas individuais que querem brilhar.
Pelo meio, esta direcção tem sido acossada, interna e externamente, como não há memória. Se fazem é porque fazem, se não fazem é porque deviam ter feito. E se pensam em fazer então são incompetentes. O síndrome do treinador de bancada que nos assola a todos nós subiu aos supostos notáveis e, agora, parece que todos sabem ser Presidentes do Sporting. Ou, pelo menos, parece que todos querem ser...
Alvalade não é, neste momento, um espaço de alegria e de são convívio entre adeptos. É uma arena romana, onde os gladiadores verde e brancos são chachinados pelos adversários e, mais grave que isso, sacrificados perante uma turba ululante de supostos adeptos que acenam lenços brancos, urram e insultam. E, onde, claro está, os velhos do Restelo, supostos sábios de toda a técnica e táctica sportinguista, guardiães do passado do presente e do futuro do Clube, se arvoram em doutos sábios e adeptos da estratégia de terra queimada: quanto pior melhor.
Sinto-me triste e desanimado e não vejo a luz ao fundo do túnel. O meu amigo Pedro Correia, no blog És a Nossa Fé, onde também escrevo, põe, em termos muito crus o dedo na ferida: “O pior arranque de sempre da temporada. Com a equipa fora da Taça de Portugal, no último lugar do seu grupo da Liga Europa e a dez pontos da liderança no campeonato. Sete pontos abaixo do Sporting de Braga. Seis jogos seguidos sem ganhar. Doze golos sofridos. Derrotas consecutivas com o Videoton, o FC Porto, o Moreirense e o Genk. Empate em casa com a Académica”. Sei que isto não é o Sporting. Não sei o que vai ser e quanto tempo vai durar esta tempestade. Mas começo a acreditar que, por este andar, teremos mesmo de ir à bruxa para quebrar o enguiço. Ou começar a oferecer fruta...
Nota prévia: Com as devidas desculpas pelo atraso, aqui fica a minha última crónica publicada no Jornal do Sporting. Como facilmente poderão observar, fui enganado que nem um pintainho pela senhora génia...Bah!
Eu tive um sonho. E nesse sonho não almejava paz e abundância para a Humanidade inteira, mas apenas para o Sporting Club de Portugal. Suponho que sonhei assim, de forma discutivelmente altruísta e nada modesta, não apenas porque faz parte da minha natureza mas também porque, convenhamos, há que começar por algum lado e homem que é homem deve optar sempre, quando lança mãos à obra, pela tarefa mais difícil.
Nesse sonho passeava pela praia quando encontrei, embalada com suavidade pelas ondas, uma garrafa de vidro tendo lá dentro não a carta de um náufrago, mas sim aquilo que visivelmente era um bilhete para o jogo com a Académica. Não achei nada bizarro o sucedido. Aliás, tenho-me portado bem e entendi a coisa como um prémio dado à minha paciência quase infinita, demonstrada nos últimos tempos.
Quando fiz saltar a respectiva rolha (era uma garrafa das antigas) eis que – surpresa, surpresa - saltou também lá de dentro uma rapariga muito pouco vestida e visivelmente prendada. Por alguma razão, no meu universo onírico as senhoras nunca usam muita roupa mesmo quando não é Verão mas isso não vem agora ao caso.
A moçoila, explicou-me, era uma génia que eu libertara do cativeiro. No entanto, por muito agradecida que estivesse, não poderia conceder-me os habituais três desejos da praxe e sim apenas um, tendo em conta que ainda vigora o memorando de entendimento.
O que se seguiu não foi fácil. Pedi uns minutos para pensar e ela, habituada a ter todo o tempo do mundo, afastou-se um pouco para apanhar conchinhas. Quando regressou, eu já estava convicto de ter escolhido com sabedoria e justiça. E disse-lhe: “Quero que o meu clube ganhe todos os jogos a começar pela Académica e, para que saiba, até lhe conto que nasci em Coimbra e tenho bons amigos adeptos da Briosa. Mas, nestas alturas, amigos, amigos, vitórias à parte”.
“Tens a certeza? Então e ouro, mais ouro do que o António Sala alguma vez sonhou?”. “Não”, disse eu. “Quero mesmo é que o Sporting ganhe. Se fizer favor. E vou usar este bilhete que vinha na garrafa para ir a Alvalade e comprovar in loco que a senhora é uma génia de confiança e cumpre o prometido. Ou o meu desejo está acima das suas capacidades?! Hem?!”.
Nessa altura, infelizmente, devo ter elevado a voz e a minha mulher acordou-me dizendo que me sentiu agitado e perguntando o que se passava. Eufórico, bradei-lhe: “Acabei de garantir a vitória no campeonato”. Ela olhou para mim com indisfarçável compaixão e colocou a mão na minha testa para confirmar a temperatura. Não me importei. O sonho já ninguém mo tirava.
Na semana passada, o Sporting renovou com Adrien. Ao fechar o dossier das renovações, com clásulas milionárias e contratos com prazos alargados, a Direcção do Sporting consegue fazer um três-em-um: segura grandes jogadores no actual plantel leonino, dá estabilidade à equipa e, se a questão algum dia se colocar, o Sporting tem amplos encaixes financeiros sempre tão necessários para os vários desafios preementes de um Clube com a dimensão do nosso. Aliás, se dúvidas houver neste campo, basta lembrar que a transferência de Hulk e de Witsel mostrou que não há jogadores impossíveis de comprar.
Depois de garantir Rui Patrício, Cédric e André Martins, do leque dos agora incontornáveis para as opções de Sá Pinto fica a faltar apenas Wolfswinkel que, diz quem sabe, estará também firme no nosso Sporting.
Este processo agora encerrado – ou em vias disso – irá permitir ao Sporting lutar em campo entre iguais. O Clube precisa de estabilidade nas suas mais diferentes vertentes – na Direcção, no treinador, nos jogadores e nos adeptos – e tenho a certeza que o caminho trilhado e a estratégia da Direcção e do treinador. vai dar-nos amplas razões para sorrir no futuro.
Temos assim uma equipa equilibrada, em que são várias as opções e apostas que podem ser feitas para os jogos. Temos a Equipa B com valores em crescimento e a formação que, como sabemos, é uma verdadeira escola de craques. Não há por isso desculpa. Sá Pinto e os jogadores do plantel têm todas as condições para fazer um bom trabalho. Eu acredito que o farão.
O título desta crónica roubei-o aos britânicos. Corria o ano de 1939, a Alemanha de Hitler tinha acabado de invadir a Polónia e desencadear a II Guerra Mundial e o governo de Londres emitiu alguns posters de propaganda para sossegar os britânicos para os tempos duros que se avizinhavam e para os preparar psicologicamente para uma eventual invasão das tropas do III Reich e para a guerra que se adivinhava longa.
Na altura em que escrevo este texto, o Sporting acabou de perder com o Rio Ave em casa – a primeira derrota em Alvalade de Sá Pinto – e prepara o jogo decisivo face ao Horsens para a Liga Europa. O que tive oportunidade de ler nos jornais e na blogosfera sobre o arranque de época deixou-me, como Sportinguista, triste.
Insurgem-se alguns sportinguistas contra as opções da direcção, contra a estratégia do treinador, contra a suposta desorientação dos jogadores em campo. Contra, contra, contra... Pelos vistos, no Sporting somos assim. Cruxificamos jogadores e equipa técnica à mesma velocidade que, no passado, os glorificámos, gastamos a pele das mãos de tanto dizer “este ano é que é”, ou “para o ano é que é”. E, às vezes penso, desculpem-me o desabafo, que nós próprios somos os piores inimigos do nosso grande Clube. Como se costuma dizer, parece que os adversários estão fora de Alvalade e os inimigos cá dentro.
Dito isto, não estou satisfeito com a prestação do Sporting. Enquanto adepto quero vitórias, quero que os leões ganhem sempre e, se não conseguirem, ao menos, que tentem com a garra que nos é tão característica. Mas não embarco na crítica apressada dominante, com o dizer hoje uma coisa e amanhã o seu contrário.
Precisamos de tempo, precisamos de serenidade. E como adeptos, a nossa função é apoiar a nossa Equipa. Não sei se vamos ganhar este ano o Campeonato e/ou as Taças. Ainda é cedo para saber. O que sei é que, infelizmente, no nosso Clube, a História repete-se. Estamos supostamente desiludidos porque o Ricky não tem cumprido. Mas, evoco aqui os meus anos de clubite aguda para vos recordar aqui que Liedson esteve tantos jogos sem marcar e depois foi o que se viu. Ou Acosta. Ou, ou, ou...
Não alinho na bitola criticista. Sou do Sporting. Estou habituado a sofrer, muito, com as nossas derrotas. E a vibrar, efusivamente, com as vitórias. Estas chegarão. Eu acredito!
Foi treinador do Sporting e, só por isso, merecia aqui uma crónica. Mas Malcom Allison foi muito mais do que um mero treinador do nosso Clube. Foi o principal obreiro para que o Sporting, na longinqua época de 1981/82, ganhasse tudo o que havia para ganhar ao nível de troféus de Futebol: o Campeonato, a Taça e a Supertaça.
Allison foi um jogador de extremos e de excessos e, honra lhe seja feita, manteve esses extremos e esses excessos durante a sua vida como treinador. Apesar da fama de bon vivant, João Rocha, então Presidente do Sporting, vai buscá-lo a Inglaterra e “Big Mal” surpreende. Cativa jogadores e adeptos, incute um estilo de jogo mais agressivo que tornaram, nessa época, os Leões imparáveis, naquela que era a minha equipa maravilha e com a qual celebrei o meu primeiro campeonato: Eurico, Jordão,Manuel Fernandes, Zézinho, Inácio, Virgilio, Oliveira, Ademar, Freire, Meszaros, Barão, Nogueira.
No Portugal pós-revolucionário, no início dos anos 80, Allison chocou tradições e costumes. Politicamente incorrecto, adepto confesso de álcool, charutos e mulheres, aliava estes gostos a uma manifesta falta de discrição para esconder estes deslizes, o treinador do Sporting criou anti-corpos que lhe foram fatais. João Rocha não lhe perdoou estes excessos - que destabilizaram a equipa – tendo sido despedido quando os Leões estavam em estágio de pré-época na Bulgária, apesar do Sporting ter conquistado os três troféus da Época.
Regressa a Inglaterra, passa pelo Kuweit e, em 1986, é chamado pelo Vitória de Setúbal com o desafio de levar os sadinos para a 1ª Divisão. Nesta equipa, “Big Mal” encontra alguns ex-jogadores que treinou no Sporting (Meszaros, por exemplo) e volta a surpreender tudo e todos com novos métodos de treino para os jogadores: pinturas de guerra, artes marciais e heavy metal.
A técnica surpreende e resulta e o Vitória sobe à 1ª Divisão. Allison treina ainda mais uma época os sadinos e, em 88/89 desce ao sul do País para ajudar o Farense. Foi a última equipa portuguesa que treinou, tendo regressado ao Reino Unido. Nos anos 90, termina, sem glória, a sua carreira como treinador nos Bristol Rovers (92/93). Morre a 15 de Outubro de 2010, de doença. Tinha 83 anos.
*Artigo publicado hoje no Jornal do Sporting
{ Blogue fundado em 2012. }
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