Os nossos ídolos (13): JESUS CORREIA, o Necas
1947, o ano mágico de Jesus Correia.
Meu pai nasceu dez anos antes, eu vinte e um anos depois, ainda hoje brincamos, esgrimindo sportinguismo; “sou do tempo dos cinco violinos” diz-me ele, “eu sou do tempo de Yazalde”, respondo e sorrimos, porque ele sabe todos os tempos do Sporting (meu avô Jacinto nasceu em 1902 e incutiu nos filhos um sportinguismo que tem netos, bisnetos e continua a ser transmitido).
Escolhi Jesus Correia, porque o Necas (era assim que os amigos o conheciam e assim o tratarei até ao final do “post”, sem o conhecer [sem o ter conhecido em vida] sinto que o conheço pelo seu imortal sportinguismo, desportivismo) é (foi) um de nós, mais que um atleta que nos representou, é um exemplo duma vida dedicada ao desporto, à família, à terra.
No dia 6 de Outubro de 1946, no Estádio das Salésias, o Mundo assistia ao nascimento da maior lenda colectiva do futebol português; Necas (22 anos), Vasques (20 anos), Travassos (20 anos), Albano (22 anos) e Peyroteo (28 anos), os cinco violinos jogavam juntos pela primeira vez. Aos 17 minutos de jogo, Necas voa entre as "torres de Belém" e, correspondendo a um maravilhoso cruzamento de Albano, põe Capela à procura da bola nas redes. Foi o primeiro de muitos golos dos famosos cinco.
Necas foi um grande atleta mas não foi nenhum Meszaros, um Peter, nem sequer um Carlos Gomes, apesar de ter sido guarda-redes num Sporting vs. Benfica em 17 de Novembro de 1946; o nosso guarda-redes Azevedo parte um braço e sai do campo, Necas, que marcara um golo fantástico, vai para a baliza, estava 1-0, decidia-se o campeonato de Lisboa, o Sporting com 10, o Benfica com 11 (na altura não existiam substituições) e o bom do Necas na baliza...
Conseguiu manter a baliza inviolável até ao intervalo mas já não regressaria (como guarda-redes) para a segunda parte; foi substituído no posto por Veríssimo e dez minutos depois (re)entraria, sob fortes aplausos, Azevedo, com o braço partido mas com uma dignidade, uma vontade de vencer, uma energia que não quebraria e não quebrou, o Sporting venceu por 3-1.
Azevedo passeado em ombros, num misto de dor e satisfação, e Necas eufórico com mais um título colectivo e um individual. Foi o melhor marcador desse campeonato regional de 1946.
No ano seguinte Necas conquistaria mais títulos, alguns pouco conhecidos, pela mão de Mário Moniz Pereira. Pois é, o nosso Necas foi campeão regional de Lisboa e campeão nacional (no Porto) na estafeta de 4x80 metros em atletismo corporativo, representando a equipa do Grémio dos Armazenistas de Mercearia. Necas, campeão de atletismo, campeão de futebol, campeão de hóquei em patins, um campeão... à Sporting.
O ano de 1947 foi mágico mas o de 1948 seria de ouro, Necas venceu todos os campeonatos de hóquei e de futebol, o Sporting conquistaria, definitivamente, a Taça de «O Século» mas Necas ainda tinha mais "ganas" e em 5 de Setembro desse ano o Sporting jogaria no Estádio Metropolitano com o Atlético de Madrid, seis para os leões, três para os colchoneros, com todos os golos do Sporting a serem marcados por... (adivinharam) Jesus Correia.
Mais que um ídolo, Necas é, para mim, um exemplo, um exemplo duma vida dedicada ao desporto (futebol no Sporting e hóquei em patins no Paço d'Arcos, internacional em ambos) um exemplo duma vida dedicada à família, um exemplo duma vida alicerçada numa terra (Paço d'Arcos), um exemplo não de dois amores (como ficou conhecido) mas dum grande amor – o Sporting – com toda a abrangência que esta poderosa palavra possui.