Os nossos ídolos (1): PEDRO BARBOSA, um pouco mais de sol...
Conforme o Pedro anunciou aqui, coube-me a sorte alfabética (um karma que me persegue desde a escola) de inaugurar esta série dedicada aos “Ídolos” que marcaram os escribas deste blogue.
Acresce a este karma o outro karma, o de nunca ter sido dada a idolatrias. Nem sequer nas idades em que somos mais tendentes a esses fervores. Sempre fui demasiado eclética, sempre gostei demais de demasiadas coisas, demasiados autores, demasiadas ideias. A humanidade sempre me pareceu tão rica, tão contraditoriamente rica que regularmente recusei a ideia de me fixar num personagem, numa ideia, numa corrente.
Claro que a idade tinha que ter alguma vantagem e essa vantagem é a de podermos – e devermos – dar-nos ao luxo de começar a seleccionar o que realmente nos preenche e nos deve acompanhar no resto, que subitamente se anuncia, das nossas vidas. Começamos a recusar conhecer novos escritores, porque dificilmente leremos e releremos aqueles que amamos, começamos a recusar novas experiências musicais porque a nossa alma já está preenchida com replays e reinterpretações de sons que definitivamente já atribuímos a deus.
Neste reduzido universo em que me movimento, o do futebol é ainda mais reduzido. A minha experiência futebolística sempre foi condicionada pelo conflito insanável de ter mãe sportinguista e pai benfiquista. Gostando comme il faut dos dois igual, a minha relação confessa com o clube ficou essencialmente reduzida ao ciclismo e ao hóquei em patins, modalidades em que se consegue sempre ser politicamente correcta.
Posto este fastidioso preâmbulo, a minha escolha para esta série recai no jogador que é simultaneamente o meu putativo ídolo e a essência da alma lusitana, que só Mário de Sá-Carneiro conseguiu pôr a rimar. Um pouco mais de sol - eu era brasa/Um pouco mais de azul - eu era além/Para atingir, faltou-me um golpe de asa/Se ao menos eu permanecesse aquém...
Isso, estou a falar de Pedro Barbosa, titular do Sporting durante dez anos, quase tantos outros capitão da equipa. O mais inteligente dos jogadores que passou por este clube. O mais amado e o mais mal-amado. Um ser capaz do mediano e do melhor superlativo. Um jogador que teve uma grande carreira e que passou ao lado de uma grandessíssima carreira. Uma leitura de jogo sempre perfeita, golpes de asa, necessariamente irregulares, má imprensa em geral, vítima dos mitos suburbanos a que nenhum jogador está imune.
Pedro Barbosa incorpora a genialidade lusa e o seu eterno estigma. A capacidade de ser grande e único e a irresistível tentação de não o confirmar consistentemente. O arauto do direito à genialidade e à preguiça. A eterna luta entre o direito à poesia e à afirmação da invencibilidade.
Pedro Barbosa, um dos nossos. Sempre.
PS: E, disse ele recentemente, só marcou dez ou onze penalties na sua longa carreira. E nunca falhou nenhum.