A grande área de Itália é habitada por 4 canibais que acampam juntos nela já há muitos anos. Qualquer equipa que se veja rebaixada ao estalingrado do último terço do terreno anda por ali ó mãe, ó mãe, com as cuecas na mão e o coração na boca, aos biqueiros para a bancada à espera da estocada fatal que há-de chegar - olha os Checos contra a Espanha...
A Itália não. Os canibais da defesa, todos de Torino e somando um século e um quarto de idade, apesar de se darem por juves, é como estão melhor é quando lhes cai em cima o peso do mundo. O truque é simples: primeiro fazem-se de cristãos e dizem: "deixai vir a mim as crianças!" Cheios de esperança pueril os avançados adversários correm para eles de bola dominada, ou centram-na à confiança; mas, de repente, têm pela frente um comunista, desses dos antigos, que come criancinhas ao pequeno-almoço.
E depois é passar o tempo nisto, os belgas a baterem e baterem na porta da frente e a vê-las entrar duas vezes pela porta das traseiras.
Querem ver que os florentinos dos italianos ainda vão ganhar isto?
Não fossem as coisas o que são, oferecer-se-iam poucas dúvidas a Fernando Santos. A selecção deveria jogar preferencialmente com:
Rui Patrício, Cédric, Ricardo Carvalho, José Fonte, Raphael Guerreiro, William Carvalho, Adrien Silva, João Mário e Cristiano Ronaldo como escolhas óbvias, entrando depois André Gomes (Moutinho não está em forma) ou Éder, dependendo do sistema táctico (com ou sem ponta-de-lança) e Nani ou Quaresma, dependendo da forma de cada um.
O problema deste 11 titular é ser uma óbvia homenagem à formação do Sporting (nove em onze jogadores, quatro dos quais da equipa actual). Como se trata da selecção de Portugal, Santos acha que tem de pôr a jogar o portista e o benfiquista de serviço. No caso do portista, a equipa não fica muito mal servida: Danilo é bom. A vantagem do meio-campo do Sporting, para além de ser bom, é a de os seus membros jogarem juntos há dois anos. Mas pronto, é preciso pôr lá o portista. Compreende-se. Sai o William. Só que, a partir daqui, está destruído o meio-campo do Sporting e todas as combinatórias são possíveis e razoavelmente indiferentes: o único que se tornou indiscutível foi o João Mário.
Quanto ao benfiquista de serviço é que é pior: Eliseu não, mas sabe-se lá o que fará Santos; sobra Renato Sanches (André Gomes já não satisfaz inteiramente o benfiquista, parece-me a mim): se for escolhido, desaparece a coerência do meio-campo e uma das maiores forças da equipa.
Depois, há o peso dos consagrados e do Real Madrid: Santos ainda é capaz de escolher Moutinho (apesar de não andar a jogar nada) e Pepe (apesar dos pontapés nos adversários, das cabeçadas no Muller e do teatro na final da Champions).
Será entre jogar com a melhor equipa e não jogar, em nome de decisões políticas que provavelmente qualquer seleccionador teria de fazer, que se decidirá a carreira da selecção neste Campeonato da Europa. Logo veremos o que dá.
Nunca devia ter-me metido nisto. Quando podia dar descanso ao coração e não sofrer (ou sofrer só pela seleção, vá) meti-me a ver futsal e acho que estou a ficar viciada.
Não tarda um fósforo e estou a saltar do sofá para ir ver jogos ao pavilhão. Aguentaaa!
As individualidades fazem a diferença no futebol, desporto colectivo? Claro que sim. Uma vez mais isto se confirmou esta tarde em Toulouse, no jogo Espanha-República Checa, a contar para o Grupo D do Campeonato da Europa. Os espanhóis venceram tangencialmente, num desafio em que foram os únicos a procurar a vitória. Mas de nada serviria à Roja a superioridade técnica e táctica se não dispusesse de um jogador de excepção, que persiste em exibir o seu talento depois de já ter conquistado tudo no mundo do futebol: Andrés Iniesta. Foi dele a soberba assistência, aos 87', para o solitário golo de Piqué que desfez enfim o nó atado pelos checos, com 11 jogadores atrás da linha de bola - numa vergonhosa réplica daquilo que dois terços das equipas portuguesas costumam fazer no nosso campeonato quando enfrentam os chamados clubes grandes.
Quem acompanhasse o jogo com atenção, como sucedeu comigo, percebia que o golo espanhol poderia tardar mas não falharia. No entanto seria necessário um laborioso trabalho de paciência para trocar a bola frente à grande área checa, enleando a equipa adversária entrincheirada no seu reduto, onde até o astro Rosicky exercia missão defensiva. Precisão, acutilância e nervos de aço - algo que apenas a maturidade confere, algo só ao nível de Iniesta, Bola de Ouro 2012, campeão mundial e bicampeão europeu.
Continua a ser um prazer vê-lo jogar. No lance decisivo, quando outros já pareciam descrentes, ele fez a diferença. Porque acreditou e trabalhou em função dessa crença, vital no desporto de alta competição. Soube temporizar, soube dominar a bola com notável requinte técnico, soube colocá-la com precisão milimétrica ao alcance de Piqué, seu colega de equipa.
Quem sabe não esquece. E nesta selecção espanhola, inferior à que nos deslumbrou em 2008, 2010 e 2012, são ainda os veteranos a marcar o ritmo e a cadência - como os dois jogadores do Barcelona já mencionados, David Silva e Sergio Ramos.
Em equipa que ganha não se mexe. No Euro 2016 esta promete manter-se inalterável.
Quem disse ao Simão Sabrosa que ele tem vocação para comentador de futebol devia estar a gozar com ele ou, na melhor das hipóteses, estava profundamente equivocado. Motivo? Sabrosa é uma negação absoluta neste domínio.
Escrevo estas linhas enquanto assisto ao jogo Espanha-República Checa na Sport TV. O locutor, cujo nome ignoro, e Sabrosa, suposto comentador, disputam entre si o título de vozes mais soporíferas da pantalha nacional. Falam com voz pausada, monocórdica, arrastada, molengona, como que tentando incutir sono a quem assiste. Quase nem falam: sussurram. Nem parece que estão a assistir a um bom jogo num dos maiores cartazes mundiais do futebol.
O prémio, para mim, vai para Sabrosa. Pouco se escuta a voz dele. E quando "comenta" é para proferir banalidades em frases sucintas, carregadas de reticências: "A Espanha... tem que... que ser rápida na transição defesa-ataque para poder... ter mais espaço... no meio-campo da República Checa."
Em tom baixinho, não vá algum telespectador despertar.
Se não tivesse ouvido, nem acreditava. Manuel José disparou anteontem esta bacorada na RTP: "Os dois únicos médios [da selecção nacional] que levam a bola à frente são Rafa e Ricardo [Renato?] Sanches."
Nem sei que adjectivo deva pôr a isto. Talvez algum de vocês me ajude.
O que escrevemos aqui, durante a temporada, sobre TEO GUTIÉRREZ:
- Eu: «Quatro jogos oficiais, três golos marcados. O caminho faz-se caminhando.» (28 de Agosto)
- José da Xã: «Teo Gutiérrez marcou um golo... E que golo, meus senhores. Aquela finta a tirar o defesa do caminho....» (11 de Dezembro)
- Pedro Boucherie Mendes: «Assobiar jogadores é tiro no pé e criar uma má relação entre a torcida e Teo não é a melhor das iniciativas. Podemos vir a precisar dele a sério, da sua ratice e finta curta, do seu sentido de oportunidade e da sua experiência.» (19 de Fevereiro)
- Luciano Amaral: «O Jesus faz aquele número do Teo só para nos chatear, não faz?» (6 de Março)
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