O Robin dos Bosques
A história do alargamento das competições profissionais vai ser uma novela, como se depreende da própria decisão da AG da Liga, das posteriores ameaças do presidente do Gil Vicente e da entrevista matreira do presidente da Liga à Reuters.
No meu entendimento, a manobra foi a seguinte:
1. Tomada da Liga pelos pequenos clubes e com o seu voto maioritário, pelo populismo do alargamento sem despromoções (I e II ligas) - votos garantidos dos clubes em situação de dúvida, quanto à permanência, nomeadamente dos que estão em péssima situação financeira;
2. Tomado o poder, como financiar os clubes, então, em tempos de crise? Retirar aos ricos parte do que eles recebem de receitas televisivas, através de uma equidade aparente («os ricos que paguem a crise» ou Robin Mário Wood do nosso futebol) e de um eventual aumento do bolo das receitas televisivas, pela centralização da sua negociação na Liga - estando esta nas mãos do novo poder;
3. Como o presidente da Liga é jurista e sabe as limitações jurídicas, regulamentares e éticas da manobra, propor uma liguilha (talvez mais justa, como ideia, mas inviável desta forma, como ele sabia à partida) - lavando daí as mãos, i.e., fingindo que o acordo com os clubes, para a sua eleição, não era o que era (não haver despromoções), mas sim a 'possibilidade' de as haver através de uma liguilha;
4. Com boa tática de advogado, Mário Figueiredo poderia argumentar, depois, para manter as aparências (pilatianas), como o fez na entrevista à Reuters: eu propus uma coisa, os clubes é que quiseram outra (i.e.: o que de facto tinha sido combinado com eles, em sede de programa eleitoral); hipocrisia pura;
5. Remeter depois a argumentação da questão ética da verdade competitiva (uma questão e A questão em debate) para a outra de uma divisão mais equitativa do bolo televisivo, pela tal centralização na Liga da sua negociação - fechando o círculo da manobra e protegendo um passo duvidoso com outro aceitável.
É evidente que os argumentos, na questão do alargamento, não se ficam por aqui, para sermos justos. Para os pequenos, o acréscimo de jogos resultante do se passar de 16 para 18 clubes em cada competição (até mais, na II Liga, por via das equipas B) levaria a mais jogos (de 30 jornadas para 34, um mês mais a competir). Isto é, potencialmente mais receitas, menos meses no zero-receitas, um fardo para os clubes. O problema, neste caso, é saber se, na atual conjuntura, este é o momento para mudar e mudar deste jeito. Para além da ética da competição - que os próprios regulamentos da FIFA acautelaram em 2007 (creio) - há a ter em conta a especial situação economico-financeira do País. Os proveitos dos clubes vão diminuir dramaticamente nos proximos tempos e nem a centralização da negociação das receitas televisivas deverá ser suficiente para garantir a sustentabilidade de todos. E não é certo, sequer, que o reeditar Robin Wood seja suficiente. Mas, nadando em passivos, muitos clubes estão numa fuga para a frente. Vêm aí grandes guerras. Fiuza dixit.