Viver na lua ou ter os pés na terra?
As contas do primeiro semestre, das SAD's dos três grandes são claras: Sporting negativo em cerca de 19 milhões, Porto negativo em cerca de 9, Benfica positivo em cerca de 8. Num semestre em que o Porto vendeu o Falcão por 40 milhões e o Benfica o Coentrão por 30 - operações de uma envergadura a que o Sporting não chegou. Mesmo assim, o passivo da SAD encarnada aumentou em 6,3 por cento. Quer dizer, a situação está preta, para os três grandes (e preta está para os restantes, quase todos). Os financiamentos bancários, para investir em jogadores que reforcem os plantéis e/ou para resolver problemas de tesouraria (o dinheiro de que se necessita para fazer face ao dia a dia), são torneira que fechou. Esse oxigénio foi substituído, em parte, pelo recurso tópico aos fundos de jogadores e não há outra volta a dar-lhe, para manter salários em dia (ou quase em dia). A outra fonte de oxigénio, a dos patrocinadores, vai ser reduzida a curto prazo, dada a situação geral de contenção de custos por parte das empresas. É que, para além dos custos correntes (salários, operação, fisco, segurança social, etc.), os clubes têm de ir pagando à banca os enormes empréstimos que foram conseguindo, em tempo de vacas mais ou menos gordas. E daqui não há como fugir.
No caso do Sporting, o investimento na equipa de futebol foi elevado, como reclamavam os adeptos, para fazer crescer a competitividade a médio prazo (comprar jogadores não é o mesmo que comprar uma equipa) e descobrir talentos que gerem um bom retorno, também a médio prazo. Algo que outros clubes fizeram, antes de nós. No nosso caso, tentando diversificar as fontes de um retorno futuro: talentos descobertos em mercados estrangeiros e talentos oriundos da nossa formação. Sendo elevado esse investimento e sem termos nenhuma venda significativa que contrabalance, é normal que, numa primeira fase, o saldo negativo aumente - e aumentará sempre se não houver receitas extraordinárias das competições europeias e uma melhoria das receitas de patrocínios e de quotas e gameboxes e se não houver maneira de reduzir a dívida. Na verdade, os clubes grandes têm custos de duas equipas ( não é apenas o Sporting que está neste baile): a que joga e a dos juros.
Sporting e Benfica poderiam estar melhor, se tivessem ambos aceitado a disponibilidade da Câmara de Lisboa em construir um estádio municipal, palco de exibição das duas equipas (como sucede, por exemplo, com Milan e Inter). O presidente Dias da Cunha lutou bravamente por isso - ele sabia a carga que para o Sporting seria a construção e a manutenção de um estádio - e teve uma primeira reação positiva de Luis Filipe Vieira. Mas este, afirmando não ter condições internas para fazer passar a solução, desistiu depois. Quer-se exemplo mais claro de quanto a pressão dos sócios e dos adeptos força os dirigentes a solucões meramente de clubite aguda, irracionais do ponto de vista de gestão, depois se divorciando das suas consequencias e resumindo tudo a uma frase oca: 'onde gastaram eles o dinheiro'?
Significa isto, dito assim de forma tão singela, que resolver o problema de capitalização da SAD do Sporting é algo de vital para o futuro do futebol do Sporting. E é algo de vital para AGORA. Algo que não foi descoberto pela auditoria, esta apenas confirmou o que vinha de um passado recente.
Ou seja: não é possível continuarmos, por muito mais tempo, a querer a lua (equipa competitiva, menos passivo, modalidades amadores sustentadas pelo futebol, etc.). É bem mais sensato, e indispensável a meu ver, firmarmo-nos na terra: o Sporting precisa de capital, para conter o seu passivo em níveis controláveis e... para crescer de forma sustentada.